CURSO – DEUS E A CRIAÇÃO
DEUS E A CRIAÇÃO
"No princípio, criou Deus os céus e a terra. A terra, porém, estava sem
forma e vazia; havia trevas sobre a face do abismo, e o Espírito de Deus
pairava por sobre as águas" - (Gênesis, cap. 1 - 1 e 2).
1.0 - A OBRA DE DEUS
Desde os tempos em que a humanidade vivia em cavernas o homem admira-se
perante a grandiosidade do Universo.
Ernest Renan, um historiador e filólogo francês do século XIX, em sua
magnífica obra A Vida de Jesus, afirma: "Desde que o homem se diferenciou do
animal, tornou-se religioso, ou seja, ele percebeu que na natureza havia
algo além da realidade e, em si mesmo, algo que estava além da morte". Por
isso, o ser humano sempre buscou respostas sobre a origem das coisas e quis
saber a respeito de quem teria sido o supremo arquitecto dos céus, dos
montes, dos mares, da natureza etc. A Doutrina Espírita, como veremos, nos
oferece seguras respostas a esses questionamentos.
a) Que é Deus
Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas. Criou tudo
o que há. É o único princípio não criado. Sempre existiu.
As leis da Física demonstram que um determinado efeito nunca é anterior à
causa. No caso da Criação, pode-se concluir que ela é consequência da acção
de um princípio lógico, que se encadeia de forma inteligente. Todo efeito
inteligente tem uma causa inteligente.
O homem, observando o mundo que o cerca, pode deduzir através da razão, que
aquilo que o criou deve ser inteligente e superior a tudo o que existe. A
essa causa primária denominou-se "Deus". Podemos reconhecer Deus observando
e estudando suas obras.
"Lançando o olhar em torno de si, sobre as obras da Natureza, observando a
previdência, a sabedoria, a harmonia que preside a todas as coisas,
reconhecemos que nenhuma há que não ultrapasse o mais alto alcance da
inteligência humana. Ora, desde que o homem não as pode produzir, é que elas
são o produto de uma inteligência superior à humanidade, a não ser que
admitamos haver efeito sem causa" - (Allan Kardec - A Gênese, cap. II, item
5).
b) Atributos da Divindade
Não é dado ao homem, dentro da impotência em que se encontra, atingir toda a
magnitude da natureza íntima de Deus. Por muito tempo, o homem julgou Deus à
sua imagem e semelhança, dando a ele a aparência humana, bem como suas
imperfeições, moldando um Deus colérico, vingativo e ciumento. Entretanto a
Divindade possui atributos próprios de sua natureza suprema. Deus não se
mostra, mas afirma-se mediante suas obras, diz Kardec. Diante disso, pode-se
afirmar que:
Deus é eterno: Ou seja, não teve começo e não terá fim. Se Ele tivesse tido
um começo, teria saído do nada. O nada, sabemos, não existe. Deus é o ser
absoluto, eterno, a própria eternidade.
Deus é imutável: Se Ele fosse sujeito a mudanças, as leis que regem o
Universo não teriam estabilidade. Sua imutabilidade é o alicerce das leis
físicas e morais.
Deus é imaterial: A natureza de Deus difere de tudo o que chamamos matéria,
pois de outra forma Ele não seria imutável e suas leis estariam sujeitas às
transformações da matéria.
Deus é único: Se existissem muitos deuses, não haveria unidade de vistas,
nem de poder na organização do Universo. Se existisse um outro Deus, teria
que ser igualmente infinito em todas as coisas, caso contrário nem um nem
outro teria a soberana autoridade. Os povos antigos, por ignorância,
acreditavam na existência de muitas divindades e associavam-nas às forças da
natureza, às montanhas, aos mares, às matas, aos astros etc.
Deus é todo poderoso: Se não tivesse o poder soberano, haveria alguma coisa
mais poderosa ou tão poderosa quanto Ele, que assim não teria a supremacia
sobre a Criação, deixando de ser Deus. Aquelas obras que Ele não tivesse
feito, seriam obrigatoriamente feitas por outro deus. Portanto Deus é todo
poderoso porque é único.
Deus é soberanamente justo e bom: A sabedoria providencial das leis divinas
se revela nas menores como nas maiores coisas que cercam o ser humano, e
esta sabedoria não permite que se duvide de Sua justiça nem da Sua bondade.
Deus é infinitamente perfeito: Conceber Deus sem essa perfeição infinita é
ter que admitir que exista algo ainda mais perfeito. Se retirássemos a menor
parcela de um de seus atributos, já não teríamos Deus, pois poderia existir
um ser mais perfeito.
"Deus é, pois, a suprema e soberana inteligência; é único, eterno, imutável,
imaterial, omnipotente, soberanamente justo e bom, infinito em todas as suas
perfeições, e não pode deixar de ser assim. Tal é o eixo sobre o qual
repousa todo o edifício universal; é o farol do qual os raios se estendem
sobre o universo inteiro, o único que pode guiar o homem em sua pesquisa da
verdade; ao segui-lo, não se extraviará nunca; e se tem se desencaminhado
com tanta frequência, é por não ter seguido o caminho que lhe é indicado" -
(Allan Kardec - A Gênese, cap. II, item 19).
Se é possível crermos na existência de um Ser superior que criou o mundo
onde vivemos e o Universo que nos cerca, e que nos concedeu oportunidade de
vida e progresso, seria lógico e racional nos esforçarmos no sentido de
compreendê-lo. Esta é a meta do aprendizado espírita.
A Religião deveria se configurar numa instituição de grande importância para
a humanidade, porém, seu sentido acabou sendo desvirtuado pelos homens. Sua
função seria a de transmitir os ensinamentos divinos aos seres humanos,
libertando-os da escravidão das ideias materialistas, que o atrelam a um
mundo de ilusões transitórias, sem compreender o verdadeiro sentido da vida.
Não existe ainda na linguagem humana, palavras que possam definir a
verdadeira natureza de Deus. O Espiritismo nos faz analisar isso com muito
mais racionalidade, porém ainda não é o ideal. Quando o Espírito atinge o
estágio de Espírito Puro, ele compreende o Criador de modo mais amplo. Até
lá, sua ideia a respeito do Pai é apenas relativa ao seu grau de
adiantamento.
1.1 - O ESPÍRITO
O Espírito é o princípio inteligente da Criação. No plano material, ele está
presente em todo elemento vivo. Os Espíritos são criados simples e
ignorantes. Todos estão sujeitos à Lei da Evolução. Em fases primitivas, não
pensam, mas movem-se por sensações. Mais tarde, são dirigidos pelo instinto;
depois, pela inteligência; e, por fim, chegam à razão e à angelitude.
Os Espíritos são os seres inteligentes da Criação. Habitam o Universo em
variados estágios de desenvolvimento e diversas categorias de mundos. Foram
criados simples e ignorantes, isto é, sem sabedoria e sem a consciência do
bem e do mal. São dotados de aptidões para adquirir o conhecimento
intelectual e moral através de encarnações.
No princípio, o Espírito é como uma criança, sem vontade própria definida.
Depois, aos poucos, vai se tornando livre através das experiências
reencarnatórias. Não é divisível, nem tem sexo. Não é palpável, embora não
seja o nada, pois o nada não existe. É errado confundi-lo com a
inteligência. Os dois se interagem, mas, na verdade, a inteligência é um
atributo do Espírito.
Quando encarnado, o Espírito recebe a definição de Alma. Desencarnado e
habitando o plano espiritual à espera de uma nova encarnação, diz-se que
está "errante". Apenas os Espíritos puros não são errantes, pois não
necessitam mais da experiência reencarnatória.
É importante destacar que é na matéria que o Espírito é testado em suas
potencialidades, embora continue progredindo na dimensão espiritual. No
plano invisível, pode estudar em cursos ministrados nas colónias
transitórias e ter uma visão mais ampla dos conhecimentos, mas terá que
colocar em prática, na matéria, as lições aprendidas. A Terra é uma grande
escola onde todos os homens e seres vivos crescem para Deus.
"O Espírito progride igualmente na erraticidade. Nela adquire conhecimentos
especiais que não poderia adquirir na Terra. Suas ideias então se modificam.
O estado corpóreo e o estado espiritual são para ele as fontes de duas
formas de progresso que se desenvolvem solidárias. É por isso que ele passa
alternativamente por esses dois modos de existência" - (Allan Kardec - O Céu
e O Inferno, cap. III, item 10).
a) Natureza dos Espíritos
"Dizemos que os Espíritos são imateriais porque a sua essência difere de
tudo o conhecemos pelo nome de matéria" - (Allan Kardec - O Livro dos
Espíritos, item 82).
Os Espíritos são de natureza etérea. Pode-se afirmar que são uma chama, uma
centelha ou um clarão. A linguagem humana é muito limitada para exprimir sua
verdadeira essência. Não se deve defini-lo como imaterial, pois que é algo.
Quando nos referirmos ao Espírito, seria mais apropriado usarmos o termo
"incorpóreo’’.
Os Espíritos foram criados por Deus. São, pois, constituídos de alguma
coisa. Como e quando foram criados constituem-se em mistérios não revelados.
Existem algumas teorias que tentam explicar a origem dos Espíritos, mas não
o fazem com clareza, por falta de referenciais que possam exprimir certas
ideias abstractas.
Qual seria o destino final do Espírito, depois que atingem a condição de
Espíritos puros? Esta pergunta foi feita por Allan Kardec ao Espírito de
Verdade, que deu a seguinte resposta:
"Há muitas coisas que não compreendeis, porque a vossa inteligência é
limitada; mas não é isso razão para as repelirdes. O filho não compreende
tudo o que o pai compreende, nem o ignorante tudo o que o sábio compreende.
Nós te dizemos que a existência dos Espíritos não tem fim; é tudo quanto
podemos dizer, por enquanto" - (O Livro dos Espíritos, questão 83).
1.2 - A MATÉRIA
A matéria é uma das variações de um elemento básico primitivo chamado
"fluido universal", que estudaremos mais adiante. Ela existe em diversos
estados na natureza variando infinitamente da ponderabilidade à
imponderabilidade ou eterização. Não podemos defini-la apenas como aquilo
que tem extensão, impenetrabilidade e que impressiona os sentidos físicos,
como afirma a Ciência. A matéria também pode existir numa condição tão
etérea e subtil, a ponto de não ser percebida pelos sentidos convencionais.
A matéria é o meio através do qual os Espíritos desenvolvem suas
potencialidades e manifestam suas obras. Kardec diz que a matéria é o
agente, o intermediário, com a ajuda do qual e sobre o qual o Espírito atua.
a) O Universo
Com o progresso da Ciência, descobriu-se certas leis e princípios que vieram
explicar muitos mistérios existentes, quanto à origem do mundo e do
Universo. Ficou demonstrado, por exemplo, que a Criação não se resumia na
região circunvizinha à Terra, como a princípio se pensava. Havia no espaço
distante muito mais. Planetas, cometas, estrelas, nebulosas e galáxias
formam esse majestoso conjunto chamado Universo.
A humanidade progride constantemente no campo científico, facilitando a
evolução do homem e da própria sociedade. Aos poucos, os véus dos mistérios
vão sendo levantados e o homem vai se conscientizando do quanto é pequeno,
frente a grandiosa obra do Criador. Porém, algumas questões a respeito da
origem e destino das criaturas nunca tiveram explicações convincentes. Com o
advento do Espiritismo, os Espíritos superiores, através de revelações
mediúnicas, transmitiram ideias mais completas sobre o ser humano e tudo que
o cerca.
Os Espíritos disseram que o Universo abrange a infinidade de mundos que
vemos e que não vemos, o espaço que há por toda parte, todos os seres
animados e inanimados, os astros que se movem, assim como os fluidos e as
energias da natureza.
A Ciência explica que o Universo é formado por dois elementos básicos:
matéria e energia. A matéria seria uma forma condensada da energia, conforme
demonstram as experiências atómicas.
Os Espíritos revelaram que a Criação na verdade se assenta em três
princípios fundamentais: Deus, Espírito e Matéria. A matéria e a energia,
segundo eles, seriam uma forma condensada e activa do fluido universal
respectivamente.
b) Os mundos
Os mundos são formados pela condensação da matéria disseminada no espaço
universal. São as estrelas, os planetas, os cometas, as nebulosas etc. Jesus
Cristo, referindo-se à pluralidade dos mundos habitados, afirmou:
"Na casa de meu Pai há muitas moradas; se não fosse assim, eu vô-lo teria
dito; vou preparar-vos lugar" - (João, 14:2).
De uma maneira geral, os mundos habitados podem ser classificados em cinco
categorias distintas:
Mundos primitivos: Os mundos primitivos são planetas onde os Espíritos
realizam suas primeiras experiências encarnatórias. A Terra, no passado
distante, já esteve neste estágio primário.
Mundos de expiação e provas: Mundos de expiação e provas são planetas mais
adiantados que os mundos primitivos. Mas, por causa do pouco adiantamento
moral de seus habitantes, o mal e o sofrimento ainda predominam na
sociedade. É um lugar onde os Espíritos resgatam dívidas contraídas perante
a Lei Divina e passam por provas destinadas ao seu aperfeiçoamento moral e
intelectual. O mundo terreno actualmente está nesta categoria.
Mundos regeneradores: Os mundos regeneradores são orbes onde não há mais
expiações, mas existem provas pelas quais o Espírito encarnado ainda tem que
passar para adiantar-se. São os mundos de transição entre os de expiação e
provas e os felizes.
Mundos felizes: Os mundos felizes são os planetas onde predominam o bem e a
justiça na vida social. Nessas sociedades não há mais injustiças de nenhuma
natureza e os povos são fraternos uns com os outros, ajudando-se
reciprocamente.
Mundos divinos: São aqueles onde reina absolutamente o bem, sem qualquer
mistura com o mal. Constituem-se em moradas de Espíritos superiores e da
felicidade dos eleitos.
1.3 - OS SERES VIVOS
Os seres vivos são produto da união do Espírito com a matéria, através da
vontade de Deus. O corpo material dos elementos vivos é formado por
agrupamentos orgânicos chamados células que, por s fotossíntese, um processo
onde as plantas, aproveitando a energia solar, fazem a síntese da matéria
orgânica para sua sobrevivência na superfície do planeta.
b) Reino animal
O Reino animal agrupa os seres animados. São os insectos, os peixes, as
aves, os animais irracionais, o homem etc. Nessas criaturas, o processo de
alimentação e o sistema nervoso são mais aperfeiçoados, segundo a
necessidade de cada uma delas. O reino animal abriga Espíritos num estágio
superior ao reino dos vegetais. A espécie humana é a classe mais adiantada
das entidades espirituais que o compõem.
1.4 - A TRINDADE UNIVERSAL
Vimos que matéria e fluido são uma só grandeza, ou seja, o princípio
material. Além dela, existe o princípio inteligente, ou espiritual,
constituindo-se na segunda grandeza da Criação. Acima deles está a causa de
ambos: Deus.
Eles formam a Trindade Universal: Deus, Espírito e Matéria. Portanto, existe
a matéria como Princípio Material, fluido universal; o Espírito, como
Princípio Espiritual e inteligente; e acima de tudo Deus, o Criador e
mantenedor de todas as coisas. Esses três fundamentos são o princípio de
tudo o que existe.
AS RELIGIÕES
"Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder a cidade edificada sobre um
monte; nem se acende uma candeia para colocá-la debaixo do alqueire, mas no
velador, e alumia a todos os que se encontram na casa" - (Mateus, cap. 5 -
14 e 15).
2.0 - HISTÓRIA DAS RELIGIÕES
Desde os primórdios das civilizações, o homem, intuitivamente, traz consigo
a ideia de algo superior a ele. No início tinha admiração e respeito pelos
fenómenos da natureza e pelos elementos naturais como água, sol, lua, terra
e posteriormente pelo fogo. A partir do fim da pré-história, o homem começou
a agrupar-se em torno de uma ideia religiosa, tendo em comum a adoração por
vários deuses (politeísmo). No decorrer dos tempos, o homem foi incorporando
aos objectos de adoração inicial, divindades humanas centradas em figuras de
criaturas que ainda viviam entre eles e que exerciam alguma forma de poder,
ou figuras que já tinham vivido, como reis, rainhas etc. A imaginação
popular, pautada na grande ignorância da época, se encarregava de emprestar
a esses seres, qualidades que eles não possuíam, moldando neles a imagem de
um deus todo poderoso.
A história das civilizações nos informa que aos poucos os povos foram se
agrupando de forma mais organizada e incorporando em sua cultura esse
aspecto religioso que marcou quase todas as grandes civilizações deste
planeta.
As primeiras civilizações de que temos conhecimento até hoje são as
orientais (4 a 2 mil anos a.C.). Os sumérios, acadianos, babilónios,
assírios, egípcios, hebreus, persas, fenícios, cretenses, hititas, persas e
medos, chineses e hindus, todos eram politeístas, com variações em suas
divindades.
As civilizações ocidentais (3 mil a 476 a.C.) são mais novas e também
tiveram o politeísmo como factor determinante em suas religiões. As mais
importantes foram a civilização grega e a romana.
O termo "religião" provém do latim "religare" e implica na crença em forças
consideradas sobrenaturais, criadoras do Universo. Sua finalidade é a de
orientar moralmente o homem e religar a criatura ao Criador, através dos
ensinamentos da Espiritualidade.
A Religião é a crença na existência da alma, de uma vida além da morte
física e de princípios não materiais e leis morais que são fundamentos de
todas as coisas. Tais princípios emanam da Inteligência Suprema e foram
revelados em períodos distintos em várias regiões do planeta. Eles orientam
a vida humana na busca do equilíbrio e da paz pessoal, descortinando o
destino do homem como ser imortal.
Por este motivo, é necessário tornarem-se conhecidos de toda a humanidade.
a) Finalidade das religiões
"Todas as reuniões religiosas, seja qual for o culto a que pertençam, são
fundadas na comunhão de pensamentos; é aí, com efeito, que esta deve e pode
exercer toda a sua força, porque o objectivo deve ser o desprendimento do
pensamento das garras da matéria" - (Allan Kardec - Revista Espírita,
Dezembro, 1868).
A Ciência terrena promove o progresso material e intelectual da humanidade.
A Religião tem como tarefa promover o progresso moral dos seres humanos,
demonstrando a eles que os bens materiais são instrumentos que devem ser
usados para edificar moralmente as criaturas e que foram feitos para a
felicidade de toda a colectividade. Precisa mostrar aos homens, que eles não
devem tornar-se escravos de suas paixões. A religião deve divulgar as
palavras do Cristo explicando ao povo que o Reino de Deus está dentro das
pessoas, e que só o esforço do melhoramento pessoal conduz a alma no caminho
do tão sonhado equilíbrio. As religiões, portanto, tem como objectivo geral
modificar moralmente o homem, melhorando sua qualidade de vida espiritual.
Aquelas que não atingirem essa meta terão que explicar a que vieram.
b) Diversidade das religiões
No mundo actual, observa-se a existência de grande número de religiões e
seitas que se multiplicam a cada dia. Este fenómeno social acontece por duas
razões distintas: a cultura e costumes dos povos e a idade espiritual
heterogénea da humanidade. Muitos tipos de Espíritos, de diversos estágios
evolutivos, habitam a Terra. Cada um vê Deus a seu modo e interpreta Sua
palavra segundo o próprio entendimento. Todas as religiões que elevam
moralmente o homem são boas. Aconselha-se, no entanto, que as pessoas evitem
religiões onde haja deuses e rituais estranhos, sacrifícios e orientações
que afastem o homem da vida e de suas ocupações sociais.
Com o inegável avanço da Ciência e da tecnologia, torna-se cada dia mais
difícil as pessoas aceitarem dogmas religiosos contrários à razão.
Estudaremos um pouco das principais religiões existentes no planeta, para
nosso conhecimento geral. São elas: Judaísmo, Hinduísmo, Budismo,
Cristianismo, Islamismo.
1) Judaísmo
- Primeira religião monoteísta da humanidade. Surgiu entre os antigos
israelitas no Oriente Médio. Segundo a tradição judaica, Abraão fundou a
religião por volta de 1700 a.C., após receber uma revelação de Deus. Seu
neto Jacó, também chamado Israel, teve 12 filhos, origem das 12 tribos
israelitas. Durante certo tempo, muitos israelitas estabeleceram-se no
Egipto, onde acabaram tornando-se escravos. Por volta de 1300 a.C., o grande
legislador hebreu, Moisés, descendente de Abraão, tirou-os do Egipto e
levou-os a Canaã, actual Palestina, depois de 40 anos viajando no deserto.
Depois de Salomão, filho do rei Davi (que transformou Jerusalém em centro
religioso), as tribos dividem-se em dois reinos: o de Israel, na Samaria e o
de Judá, com capital em Jerusalém. O reino de Israel é devastado em 721 a.C.
pelos assírios e não mais reconstruído. Permanece o reino de Judá,
enfrentando toda sorte de adversidades, como escravidão, guerras, invasões
etc. Depois da destruição do Templo de Jerusalém, pelos romanos, em 70 d.C.
e da destruição da cidade em 135 d.C., os judeus se dispersam por todos os
continentes (segunda diáspora judaica), mas mantém a unidade cultural e
religiosa. Somente em 1948 termina a diáspora, com a criação do Estado de
Israel.
Os judeus têm como livro sagrado A Bíblia judaica, dividida em 3 (três)
livros: Torah, Os Profetas e os Escritos.
O Torah é a escritura sagrada dos judeus. Reúne os cinco livros primeiros da
Bíblia, atribuídos a Moisés: Gênese, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronómio.
Existem cerca de 14 milhões de judeus em todo o mundo; 4,5 milhões só no
Estado de Israel.
2) Hinduísmo
- Surgiu por volta de 1500 a.C. Naquela época, os arianos, um povo da Ásia
Central, invadiram e conquistaram a Índia. Gradualmente, a cultura ariana
misturou-se à cultura de um povo nativo conhecido como drávida. O hinduísmo
desenvolveu-se a partir da mesclagem destas duas culturas. A doutrina está
fundamentada nos quatro livros dos Vedas (conhecimento, em sânscrito), um
conjunto de textos sagrados compostos de hinos, louvores e ritos. As
características principais do hinduísmo são o politeísmo e a crença na
reencarnação. Com o passar dos tempos, os sacerdotes estabelecem o sistema
de castas, que se torna a principal instituição da sociedade indiana. Sem
abandonar as divindades registradas nos Vedas, estabelecem Brahma como o
deus principal e o princípio criador.
Estima-se que actualmente existam mais de 660 milhões de adeptos do
hinduísmo em todo o mundo.
3) Budismo
- Sistema ético, religioso e filosófico fundado pelo príncipe hindu
Sidarta Gautama (563 a.C.? - 483 a.C.?), o Buda, por volta do século VI a.C.
Consiste no ensinamento de como superar o sofrimento e atingir o nirvana
(estado total de paz e plenitude) por meio da disciplina mental e de uma
forma correcta de vida.
Em parte, o budismo pode ser considerado uma rebelião contra certas
características do hinduísmo. O budismo opunha-se ao culto hinduísta de
muitas divindades, à ênfase no sistema de castas e ao poder da classe
sacerdotal hinduísta. O budismo está praticamente extinto na Índia, desde a
invasão muçulmana no século XII. Hoje tem cerca de 300 milhões de budistas
em todo o mundo.
4) Cristianismo
- Iniciada por Jesus Cristo e seus discípulos, em meados do século I.
Actualmente é uma das religiões mais difundidas no mundo, com algo em torno
de 1,9 bilhão de fiéis. Divide-se em três ramos principais: Catolicismo,
Igreja Ortodoxa e Protestantismo.
A fé cristã professa que Deus, revelado a Abraão, Moisés e aos profetas,
envia à Terra seu filho como Messias (Cristo, em grego), o Salvador.
As religiões cristãs fundamentam-se na Bíblia ou Escrituras Sagradas, que
falam da génese do Universo, do mundo e do homem terreno. Contém um conjunto
de textos muito importantes para o entendimento da história da humanidade,
desde a sua criação até hoje.
Mais adiante nos deteremos no estudo desta religião, um dos pilares em que
se sustenta a Doutrina Espírita.
5) Islamismo
- Religião monoteísta baseada nos ensinamentos de Maomé (570 - 632),
chamado "O Profeta", contidos no livro sagrado islâmico "O Alcorão". A
palavra Islã significa "submeter-se" e exprime a submissão à lei e à vontade
de Alá (Allah, Deus em árabe). Seus seguidores são chamados muçulmanos, que
significa "aquele que se submete a Deus". Segundo eles, O Alcorão contém a
mensagem de Deus a Maomé, mediada pelo arcanjo Gabriel, recebidas de 610 a
632. Seus ensinamentos são considerados infalíveis.
Fundada onde é hoje a Arábia Saudita, estima-se que seja professada por mais
de 1.3 bilhão de pessoas, distribuídas principalmente no norte da África, no
Oriente Médio e na Ásia.
Os muçulmanos estão divididos em sunitas e xiitas. Os sunitas (80%) são os
seguidores da tradição do profeta, continuada por All-Abbas, seu tio. Os
xiitas são partidários de Ali, marido da filha de Maomé, e são extremamente
radicais.
2.1 - A BÍBLIA
Diz a tradição histórica que a Bíblia é o livro sagrado de um povo.
Estudiosos das Escrituras afirmam que se trata de uma história ligada
estritamente ao povo hebreu. Mas, existem diversos trechos dos textos
antigos, principalmente no Novo Testamento, nos quais o Espírito Divino
dirige-se à humanidade como um todo, procurando orientá-la moralmente e
dizendo-lhe que haverá um tempo em que a luz divina estará presente em todo
o planeta, trazendo uma época de prosperidade a todos os povos.
A Bíblia é um conjunto de livros considerados sacros, que se divide em Velho
e Novo Testamento. O Velho Testamento narra o período que antecede a época
em que viveu Jesus. O Novo Testamento fala de sua vida, sua mensagem e do
começo do movimento cristão.
Sendo a Doutrina Espírita o Cristianismo redivivo, no dizer dos Espíritos
superiores, nos parece lógico que nos esforcemos para estudar esse livro com
seriedade, tirando dele os ensinamentos que necessitamos, à luz do
Espiritismo. Infelizmente, por razões que não nos cabe considerar no
momento, esse não é um hábito entre os espíritas, o que deixa uma grande
lacuna em termos de entendimento da mensagem divina e mesmo da origem da
nossa doutrina.
a) Velho Testamento
O Velho Testamento inicia-se com cinco livros, de suposta autoria do profeta
Moisés, e são conhecidos como o Pentateuco Mosaico. A história do povo
hebreu, com o patriarca Abraão, data de 1700 a.C. e a época do aparecimento
dessas obras é assinalada em torno de 1500 a 1300 anos antes de Cristo.
Em alguns escritos de Moisés, encontram-se os ensinamentos que foram os
primeiros fundamentos das leis morais: os Dez Mandamentos. Estas orientações
de vida constituíram-se no aspecto Divino de sua revelação, feitas pelos
Espíritos superiores através da mediunidade do profeta, e estão válidas até
os dias atuais. São as seguintes:
• Não adorarás imagens.
• Não usarás o nome de Deus em vão.
• Santificarás um dia da semana.
• Honrarás pai e mãe.
• Não matarás.
• Não cometerás adultério.
• Não furtarás.
• Não mentirás.
• Não desejarás a mulher do próximo.
• Não terás inveja.
Os livros considerados como obras de Moisés são:
Gênesis:
A Gênesis trata da origem da Criação e do próprio mundo terreno. Nele, há
uma narrativa simbólica onde todas as fases do aparecimento do Universo e do
planeta Terra são descritas com relativa precisão. No estudo da Codificação
Espírita, voltaremos a nos ocupar desse assunto, examinando o livro
preparado por Allan Kardec, também denominado "A Gênese", que trata o tema
em profundidade.
Êxodo:
O livro Êxodo conta os principais episódios ligados à libertação do povo
hebreu, escravo no antigo Egipto durante cerca de quatrocentos anos. Esta
liberdade teria sido conseguida através do trabalho missionário de Moisés,
narrado em detalhes pela história bíblica.
Levítico:
O Levítico é o livro que contém as instruções que eram destinadas à
orientação dos cultos entre os seguidores do Legislador hebreu e a
Divindade. Orientava as obrigações e rituais religiosos da época.
Números:
O livro Números apresenta parte da história da movimentação dos hebreus no
deserto em direcção à Canaã, a terra prometida. Nele, existe ainda a
realização de um censo, feito com a finalidade de se saber quantas pessoas
empreenderam a histórica viagem, depois que Moisés as libertou do Egipto.
Deuteronómio:
O Deuteronómio apresenta um código de leis promulgadas por Moisés,
destinadas a reorganizar a vida social do seu povo. É neste livro que se
encontra a proibição dos contactos mediúnicos com os "mortos".
A lei mosaica proibia essas actividades, porque as evocações fúteis, comuns
entre os egípcios, também eram praticadas pelos hebreus de forma fanática e
irresponsável. A prática tinha se vulgarizado e se tornado em motivo de
graves problemas entre eles. A proibição foi uma medida disciplinar do
legislador.
Segundo historiadores, o missionário Moisés levou do Egipto para Israel,
chamado naquele tempo de Canaã, uma multidão de quatrocentas mil pessoas. A
viagem durou quarenta anos. Ainda no Velho Testamento, destacam-se os livros
dos demais profetas, que são em número de trinta e quatro. A maioria deles
contém profecias que falam da vinda futura de um Espírito iluminado, que
traria o Reino de Deus à humanidade. Essas previsões se concretizaram na
encarnação de Jesus, o Cristo.
b) Novo Testamento
O Novo Testamento é um conjunto de livros que narra a história do
aparecimento do Cristianismo. Fala do nascimento de Jesus, de sua vida
pública como pregador e de seu trabalho como médium. Apresenta ainda,
discursos e informações sobre seus discípulos directos e indirectos.
Encerra-se com o livro chamado Apocalipse, prevendo a fase da transição, com
o fim do mundo velho e o estabelecimento do período d
• Epístola de Tiago,
• Epístolas de Pedro,
• Epístolas de João Evangelista,
• Epístola de Judas Tadeu e
• Apocalipse, atribuído a João Evangelista.
Alguns dados importantes:
Adão e Eva: Segundo as religiões convencionais, Adão e Eva teriam vivido na
Terra há quatro mil anos antes de Cristo.
Idade científica da Terra: Cerca de quatro bilhões e meio de anos.
Primórdios da Civilização: 100 mil anos.
Aparecimento de tipos humanos modernos: 30 mil anos
Berço da Civilização: Mesopotâmia (Iraque) e Babilónia (Irão).
A Ciência comprovou, cientificamente, a impossibilidade da história relativa
à humanidade ter-se iniciado somente há quatro mil anos e demonstrou que o
homem surgiu em condições bastante primitivas em vários pontos da Terra, há
milhares de anos atrás. Seus vestígios foram encontrados por pesquisadores e
historiadores em cavernas e sítios arqueológicos.
2.2 - A IGREJA CATÓLICA
Logo depois da morte de Jesus, seus discípulos directos fundaram a Igreja
primitiva e alguns núcleos cristãos foram edificados por eles, dando início
à divulgação da Boa Nova. Os primeiros cristãos foram judeus que acreditavam
que Jesus era o Messias, o salvador esperado por sua raça. Os adeptos da
nova crença gradativamente foram se afastando do judaísmo, entretanto
adoptaram as Escrituras judaicas, o que foi fonte de discordâncias entre
alguns dos apóstolos, nos primeiros tempos.
Mais tarde, apareceu no cenário histórico a figura de Paulo de Tarso,
chamado "apóstolo dos gentios". Devido sua profunda dedicação ao ideal do
Cristo, as actividades cristãs se multiplicaram e várias comunidades foram
fundadas sob sua orientação. A história da vida desse apóstolo, pode ser
apreciada na Bíblia, através das cartas que escrevia às Igrejas e aos seus
discípulos. Nesses escritos, ele procurava passar as orientações devidas aos
núcleos, profundamente apaixonado que era pelo ideal de amor de Jesus. Foi
devido a sua coragem e perseverança que a doutrina do Rabi Galileu não
permaneceu circunscrita à comunidade judaica e ultrapassou as fronteiras de
raça, indo ser semeada para todos os povos.
Neste período, as práticas doutrinárias e mediúnicas nos templos eram puras
e simples, próximas das que hoje temos nos centros espíritas. Os adeptos se
reuniam para estudar os princípios da moral evangélica, deixada por Jesus.
Uns liam, outros interpretavam e eram comuns as manifestações de Espíritos,
o que para eles era muito natural.
Depois do desaparecimento de Paulo, por volta de 67 d.C. o número de igrejas
em terras pagãs continuou a crescer. Por volta de 140, o centro do
cristianismo tinha mudado para comunidades cristãs nas cidades de Antioquia,
na Síria; Alexandria, no Egipto; e principalmente Roma. Os cristãos
primitivos ainda foram perseguidos durante muitos anos pelo sistema político
dominante.
A história da Igreja atingiu um momento decisivo em 313, quando o imperador
romano Constantino, o Grande, deu aos cristãos a liberdade para a prática de
sua religião e o Estado devolveu aos seguidores de Jesus muitos bens
materiais que deles haviam sido confiscados no período da perseguição. Após
o Concílio de Nicéia, no ano 325 d.C., fixou-se definitivamente o símbolo da
fé e a partir daí instalou-se a edificação nos templos, de altares
consagrados ao Senhor. Era o nascimento do Catolicismo. Este foi o primeiro
dos sete concílios realizados entre 325 e 787. Datam deste período as mais
graves desfigurações da beleza e simplicidade do Evangelho, inclusive em
seus aspectos práticos.
Em 330, Constantino deixou Roma e se estabeleceu a capital do Império numa
nova cidade, baptizada com seu nome - Constantinopla (actualmente Istambul,
na Turquia). A cidade tornou-se o centro do cristianismo oriental. Bem mais
tarde (1054) deu origem ao cisma dentro da Igreja, de onde nasceu a Igreja
Ortodoxa.
a) Os dogmas
Os dogmas são pontos fundamentais e indiscutíveis de uma doutrina religiosa.
No Catolicismo, os dogmas foram responsáveis pelo aparecimento dos costumes
sacramentais, das confissões, do culto às imagens, da hóstia, da obediência
ao Papa, dos altares, dos paramentos, do baptismo, da crisma etc. Isso se
deu pela forte influência das doutrinas pagãs e judaicas existentes no meio
naquela época, o que levou seus seguidores a adaptarem seus costumes aos
ensinamentos de Jesus, desfigurando seu verdadeiro sentido.
b) A Reforma Protestante
Depois que a Igreja estabeleceu os dogmas, pouco a pouco ela foi se
distanciando do povo, deixando de atender suas necessidades espirituais de
conforto e assistência. Com o passar dos anos, desvirtuou-se de tal maneira
que já não se poderiam reconhecer nela nenhum vestígio dos iluminados
valores das primeiras eras. Pouco a pouco, deixou de ser o farol espiritual
de um povo para mergulhar nas profundas e negras águas das disputas do poder
temporal. Frente a isso, surgiram líderes dentro da própria Igreja que
começaram a lutar contra a política desenvolvida pelo clero, fomentando nos
adeptos da fé cristã, um espírito de renovação espiritual.
Foi o primeiro passo para um importante movimento de reestruturação da
Igreja, que culminou na Reforma Protestante. Desta revolução houve uma
divisão na Igreja e nasceu o Protestantismo. Dentre os homens que
trabalharam para restituir o verdadeiro sentido do Evangelho de Jesus,
destacaram-se líderes como:
John Wycliffe (1324 - 1385): Filósofo inglês, tornou-se famoso como
professor de filosofia na Universidade de Oxford, onde defendia ideias
nacionalistas e contra os poderes de papas e bispos. Segundo Wycliffe, os
governantes injustos não podiam exigir obediência do povo, porque a
obediência depende da vontade de Deus. Negava a doutrina da
transubstanciação (transformação da água e vinho em corpo e sangue de
Jesus). Com essas ideias despertou a ira do clero e passou a ser perseguido
pela Igreja. Em suas últimas obras, declarou que a Bíblia, não a Igreja, era
autoridade na doutrina cristã. As classes elitistas achavam que as ideias
desse revolucionário encorajavam os pobres a exigirem melhores condições de
vida.
Com a ajuda e incentivo de Wycliffe, seus seguidores traduziram a Bíblia
para o inglês. Foi considerado o primeiro grande reformador pelos ingleses.
João Huss (1369-1415): Reformador religioso da Boémia, cujos ensinos foram
os precursores da Reforma protestante, influenciado pelas obras de John
Wycliffe. Foi ordenado padre em 1401. Huss criticou asperamente o
comportamento de bispos, cardeais e papas e pedia uma reforma na Igreja.
Atacou com veemência a venda de indulgências e chamava o papado de "uma
instituição de Satanás".
Em 1409 foi eleito reitor da Universidade de Praga. Mas Huss já era
considerado um notório herege e foi excomungado em 1412. Em 1414, foi
chamado a depor perante o Concílio de Constança, onde foi condenado, embora
lhe tivessem prometido que estaria em segurança, caso concordasse em ir ao
concílio para se defender. Morreu queimado numa fogueira, acusado de
heresia.
Depois de sua morte, desencadeou-se um período negro de guerras civis, por
conflitos religiosos entre os hussitas (seguidores do reformador) e os
católicos tradicionais, leais ao papa. Os dois lados chegaram a um acordo em
1436. Mas apesar da repressão religiosa, alguns adeptos de Huss
organizaram-se em grupos e nasceu em 1457, na Morávia, região cultural da
Checoslováquia, a Unitas Fratrum (União de Irmãos). Este grupo cresceu e era
uma força religiosa importante no tempo de Martim Lutero.
Martim Lutero (1483-1546): Teólogo alemão e líder da Reforma, movimento
religioso que levou ao nascimento do protestantismo. Sua influência
ultrapassou as fronteiras protestantes e mesmo do cristianismo como um todo,
pois trouxe uma série de consequências políticas, económicas e sociais para
o mundo ocidental.
Em 1501, Lutero decide tornar-se advogado a pedido de seu pai e entra para a
Universidade de Erfurt, onde estuda Artes, Lógica, Retórica, Física e
Direito. Torna-se mestre em Filosofia e em 1505 entra para a Ordem dos
Agostinianos, depois de uma intensa experiência que viveu durante uma
tempestade. Ordena-se padre em 1507 e em 1512 doutora-se em Teologia, sendo
designado como professor de teologia em Winttenberg, cargo que manteve por
toda a vida.
Em seus estudos das Sagradas Escrituras, descobriu o verdadeiro sentido da
doutrina de Jesus Cristo e sua grande ausência na crença que professava.
Influenciado pelos ensinamentos de João Huss, padre excomungado e condenado
à fogueira pela Igreja Católica, Lutero começou a desenhar sua doutrina
reformista entre seus alunos. A questão fundamental inicial foi a venda de
indulgências, prática comum naquela época, utilizada pela Igreja para
angariar fundos e manter a vida de prazeres mundanos em que tinha mergulhado
o papado. A prática, considerada imoral por Lutero e outros que o precederam
nessa luta, foi duramente combatida por ele.
Em 1517 se fez ouvir sua voz contra os hábitos mundanos e abusivos que a
Igreja vinha cometendo, vendendo a salvação em troca de moedas de ouro:
afixou suas famosas "95 teses" na porta da igreja do castelo de Wittenberg.
As teses, além de combater a venda de indulgências, abordava outros pontos
igualmente importantes de sua doutrina como negação do culto aos santos e
autoridade papal, abole a confissão obrigatória e o celibato clerical e só
aceita os sacramentos do baptismo e da eucaristia. Iniciaram-se as
perseguições e calúnias de seus inimigos católicos, com as quais conviveu
até a morte.
Em 1519 manteve um famoso debate em Leipzig com um teólogo católico, Johann
Eck. Ele fez Lutero admitir que tinha algumas das opiniões de João Huss,
considerado herege pela Igreja. Durante o debate Lutero atacou o Concílio de
Constança pela condenação de Huss. Eck provocou a excomunhão do monge em
1520 e combateu o protestantismo pelo resto da vida.
Em 1521, Lutero já excomungado pelo papa Leão X, é convocado pelo imperador
do Sacro Império Romano, Carlos V, a retratar-se em Worms, Alemanha, em um
conselho de príncipes, nobres e religiosos.
O reformador compareceu e reafirmou suas convicções. Declarou: "A menos que
eu seja convencido pelo testemunho das Escrituras ou pela razão pura (pois
não confio apenas no papa ou nos concílios, uma vez que é público o fato
deles terem, com frequência, incorrido em erro ou entrado em contradição),
estou preso pelas Escrituras que citei e minha consciência é cativa da
palavra de Deus. Eu não posso e não irei renegar nada, já que não é seguro,
nem correcto, ir contra a consciência. Não posso agir de outro modo".
Excomungado, Lutero publica os documentos Manifesto à Nobreza Alemã, Do
Cativeiro Babilónico da Igreja e Da Liberdade do Cristão, os grandes
escritos reformistas. Em 1521 é banido pelo imperador Carlos V da Alemanha.
Apoiado por sectores da nobreza, traduz a Bíblia para o alemão vulgar, obra
prima-literária, que se constituiu em enorme contribuição para a criação da
língua alemã moderna.
Abandona a ordem agostiniana em 1524 e, no ano seguinte, casa-se com uma ex
freira.
Em 1530, o imperador Carlos V convoca uma dieta (encontro) dos grupos
antagonistas, em Augsburgo, cidade da Alemanha, para acabar com as disputas
religiosas em seu império, que havia atingido grandes proporções e
consequências assustadoras. Johann Eck faz circular rapidamente panfletos
denunciando Lutero e seus seguidores. Para responder ao ataque, é feito um
documento com o resumo dos ensinamentos de Lutero, que ficou famoso com o
nome de Confissão de Augsburgo. Escrito e defendido por Phillip Melanchthon,
principal colaborador e amigo do reformador, os escritos tentavam um
equilíbrio em relação a certos pontos controvertidos e mostravam que os
luteranos apoiavam a tradição histórica da igreja cristã. A Confissão foi
rejeitada por Carlos V, mas converteu-se na declaração básica de fé da
Igreja Luterana.
Na época de sua morte, em Eisleben, em 18 de fevereiro de 1546, aos 63 anos,
Lutero já era reconhecido como uma figura importante na história do
cristianismo e do mundo. Foi considerado o alemão mais influente de todos os
tempos, pois o movimento desencadeado por ele afectou o desenvolvimento
político e cultural da cada nação na Europa e na América.
João Calvino (1509 - 1564): Um dos principais teóricos da Reforma, Calvino
nasceu na França, e sua família, pertencente à burguesia, educou-o para a
carreira jurídica. Com a divulgação da revolta de Lutero pelo continente
europeu, suas ideias foram reformuladas por alguns de seus seguidores,
particularmente João Calvino, que dinamizou o movimento reformista através
de novos princípios, ampliando a doutrina luterana. Homem dotado de grande
inteligência, além de ter sido excelente orador e autor de muitos livros,
tinha também excepcional capacidade de organização e administração. Exerceu
influência especialmente na Suíça, Inglaterra, Escócia e América do Norte.
Influenciado pelo Humanismo e pelas teses luteranas converteu-se em ardente
defensor das novas ideias. Perseguido na França, Calvino refugiou-se na
Suíça, onde a Reforma já havia se estabelecido em algumas regiões, por conta
da acção de Ulrich Zwinglio (1484-1531). Escreveu a "Instituição da Religião
Cristã" (1536), que se tornou o catecismo dos calvinistas.
Em Genebra, transformada na "Roma do Protestantismo", Calvino ganhou
notoriedade e poder, conseguindo impor sua doutrina, interferir nos
costumes, nas crenças e na própria organização político administrativa da
cidade. Extremamente mais radical que Lutero, João Calvino divergia da
escola luterana em alguns pontos importantes: enquanto o primeiro
subordinava a Igreja ao Estado, Calvino defendeu a separação entre as duas
instituições (em Genebra, a Igreja era o próprio Estado); justificou
actividades económicas até então condenadas pela Igreja, dando impulso
considerável ao capitalismo nascente; rejeitou a missa, sacramentos e tudo o
que não estivesse rigorosamente de acordo com as Escrituras; destruiu
completamente o livre-arbítrio, pois pregava a predestinação absoluta dos
eleitos e dos condenados.
João Calvino desenvolveu a Igreja que actualmente é chamada de presbiteriana.
Apesar do exagerado radicalismo, nenhum outro reformador fez tanto para
obrigar as pessoas a pensar a ética social cristã.
ORIGEM DA DOUTRINA ESPÍRITA
"E eu rogarei ao Pai e ele vos dará outro Consolador, para que fique
convosco para sempre; o Espírito de verdade, que o mundo não pode receber,
porque não o vê nem o conhece; mas vós o conheceis, porque habita convosco e
estará em vós.
‘‘Mas, aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome,
esse vos ensinará todas as coisas, e vos fará lembrar de tudo quanto vos
tenho dito" - (João, cap. 15 - 15 a 26).
3.0 - A GÊNESE DA DOUTRINA ESPÍRITA
A Doutrina Espírita, ou Espiritismo, apareceu no cenário terreno no século
XIX, por volta do ano de 1850. Suas raízes encontram-se nos princípios do
Cristianismo, doutrina implantada por Jesus e seus seguidores, há quase dois
mil anos. A Doutrina Espírita é o cumprimento da promessa do Senhor, na qual
afirmou que enviaria ao mundo, no devido tempo, um Consolador, O Espírito de
Verdade, que relembraria seus ensinamentos e faria novas revelações a
respeito dos mistérios da vida.
Em um de seus muitos discursos, Jesus disse que não poderia dizer todas as
coisas, pois os homens ainda não tinham condições de entendimento para
compreendê-las. No tempo certo, enviou o Espiritismo, que retirou o véu dos
"mistérios" de Seus ensinamentos e ampliou sobremaneira o campo do
conhecimento humano, despertando o Ser para um novo mundo.
Nos séculos XVI e XVII, depois que a Reforma Protestante havia libertado a
humanidade dos domínios da Igreja, formou-se um clima muito propício à
fermentação de ideais renovadores. Foi neste período que iniciaram-se as
primeiras manifestações de Espíritos, chamando a atenção do homem de então e
preparando o terreno para o advento do Consolador. No século XIX, nascia o
Espiritismo, considerada a terceira revelação. Com ele vieram as novas
lições acerca do sentido da vida, da dor, da justiça e sobre o destino dos
homens depois da morte.
Allan Kardec afirmou que: "Partindo o Espiritismo das próprias palavras do
Cristo, assim como o Cristo partiu de Moisés, é um sequência directa de sua
doutrina" - (Revista Espírita, Setembro, 1867).
3.1 - ASPECTOS HISTÓRICOS
a) Emmanuel Swedenborg
Embora oficialmente os espíritas tomem o ano de 1848, com o fenómeno de
Hydesville, como o marco do aparecimento do Espiritismo no mundo, precisamos
saber que, antes disso, existiram algumas pessoas que, pela sua capacidade
de produzir fenómenos ligados às coisas espirituais, devem ser citadas como
de importância para o surgimento desta Doutrina entre os homens. A história
do extraordinário vidente sueco Emmanuel Swedenborg merece atenção e estudo
de nossa parte.
Swedenborg, educado entre a nobreza sueca, era católico e profundo estudioso
da Bíblia. Era grande autoridade em Física e Astronomia, autor de
importantes trabalhos sobre as marés e determinação das latitudes.
Zoologista, anatomista, financista e político, era ainda engenheiro de
minas, com grande conhecimento em metalurgia.
O desabrochar de seu potencial mediúnico deu-se em abril de 1744, em
Londres, onde desenvolveu seu trabalho por vinte e sete anos e esteve em
constante contacto com "o outro mundo". Deixou em suas obras, relatos
extraordinários de suas experiências com o mundo espiritual. Diz ele sobre
sua primeira visão: "Na mesma noite, o mundo dos Espíritos, do céu e do
inferno, abriu-se convincentemente para mim, e aí encontrei muitas pessoas
de meu conhecimento e de todas as condições. Desde então, diariamente o
Senhor abria os olhos de meu Espírito para ver, perfeitamente desperto, o
que se passava no outro mundo e para conversar, em plena consciência, com
anjos e Espíritos".
Afirmava Swedenborg que uma densa nuvem havia se formado em redor da Terra,
devido ao psiquismo grosseiro da humanidade, numa clara antecipação aos
ensinos sobre a atmosfera fluídica que a Doutrina Espírita nos trouxe. Dizia
também que, de tempos em tempos, haveria uma limpeza, assim como a trovoada
aclara a atmosfera material.
Deixou ensinos importantes nas seguintes obras: "O Céu e Inferno", "A Nova
Jerusalém" e "Arcana Celestia".
b) Andrew Jackson Davis
Nascido em 1826, em New York, era um jovem sem cultura, nascido em meio
pobre, mãe com tendências visionárias aliadas à superstição e o pai
trabalhava com couros. Nos últimos anos de infância, começaram a se
desenvolver os poderes psíquicos de Davis.
Com o auxílio de um magnetizador, Davis fazia verdadeiras "viagens" pelo
mundo dos Espíritos, trazendo informações as mais surpreendentes. Tinha
extraordinária clarividência que, a princípio, foi usado como divertimento e
mais tarde o seu magnetizador utilizou para diagnóstico de doenças.
Aos 19 anos de idade, Davis manifestou o desejo de escrever um livro e o
fazia através de transes mediúnicos, submetidos por um magnetizador. Um
secretário anotava fielmente as palavras que jorravam da boca do médium,
como se fora o mais douto em conhecimento e sabedoria, porém tratava-se de
um jovem ignorante e sem cultura. Esse foi o começo do trabalho mediúnico
desse jovem, que continuou por muitos livros, todos reunidos com o nome de
"Filosofia Harmónica". Nessa fase, ele dizia estar sob a influência directa
de uma entidade, que posteriormente identificou como sendo Swedenborg. O
desenvolvimento de sua faculdade continuou e aos vinte e um anos já não
necessitava mais de quem o induzisse ao transe.
Começou aí nova fase, onde passou a ter as mais impressionantes experiências
de clarividência. Descreveu com clareza o fenómeno da morte, visto por ele à
beira do leito de uma senhora agonizante. Teve muitas visões do mundo
espiritual, fez muitas previsões como o aparecimento do automóvel , da
máquina de escrever e do próprio Espiritismo.
Davis representou um importante papel no começo da revelação espírita,
preparando o terreno antes que se iniciasse o trabalho dos Espíritos
superiores. Quando explodiu o acontecimento de Hydesville, ele já o conhecia
desde o início, através de revelações mediúnicas. Morreu em 1910, aos
oitenta e quatro anos de idade.
c) Fenómeno de Hydesville
No ano de 1848, na América do Norte, surgiram alguns acontecimentos
inusitados que assombraram o mundo. Na casa de uma família americana chamada
Fox, que morava num vilarejo de nome Hydesville, no Estado de New York,
começaram a manifestar-se forças sobrenaturais que pareciam vir do
invisível. Aconteciam estranhos ruídos nas paredes, com indícios de serem
provenientes de uma inteligência oculta desejando se comunicar.
Tudo indicava que as irmãs Kate e Margaret Fox, duas meninas de 11 e 14
anos, eram o centro do fenómeno paranormal, que acabou transformando a casa
em ponto de atracção para curiosos.
As pessoas se divertiam vendo as jovens ordenarem a uma suposta inteligência
invisível, que fizesse barulhos e produzisse pancadas nas tábuas da parede.
Através dos ruídos na madeira, convencionou-se um código pelo qual algumas
pessoas comunicavam-se regularmente com o Além. Uma pancada significava
"sim"; duas, significavam "não", enquanto outros sinais simbolizavam letras
ou palavras.
A inteligência invisível, que produzia os fenómenos de Hydesville, dizia ser
um Espírito que tinha animado um personagem que vivera na Terra em outros
tempos. O Espírito foi apelidado pelas meninas de "sr. Perneta". Suas
comunicações revelaram que ele animara o corpo de um homem que havia sido
morto a facadas naquela casa, tempos atrás. Seus restos mortais foram
enterrados no porão da residência. Algumas pessoas escavaram o local e
encontraram cabelos e ossos humanos.
Pesquisas feitas mais tarde, revelaram que o sr. Perneta era um homem
chamado Charles Rosma, que fora morto na casa cinco anos antes.
O fenómeno atraiu a atenção do mundo e por muito tempo as irmãs Fox fizeram
demonstrações de sua capacidade de comunicar-se com os "mortos",
apresentando-se em salões, submetendo-se à cobiça de empresários e sendo
alvo de muitas polémicas. Por desconhecerem completamente os mecanismos do
maravilhoso dom da mediunidade, envolveram-se com influências perniciosas
que a levaram a ter um fim triste e obscuro.
d) Daniel Dunglas Home
Quase concomitante às irmãs Fox, um outro fenómeno mediúnico despertou a
atenção das massas. Tratava-se dos feitos do médium Daniel Dunglas Home, que
ficou conhecido mundialmente pelos fenómenos paranormais que provocava à sua
volta. Forças invisíveis se manifestavam, chegando em algumas ocasiões a
levantá-lo do chão. Home chamou a atenção de sábios e estudiosos em todo o
mundo.
Home nasceu em uma pequena aldeia na Escócia e viveu de 1833 a 1886. Desde
cedo demonstrou sua prodigiosa faculdade e jamais envolveu-se com dinheiro
em suas fantásticas demonstrações de vidência, efeitos físicos, levitação,
desdobramento etc. Embora contemporâneo do Codificador do Espiritismo, eles
nunca se conheceram. Entretanto Allan Kardec faz comentários sobre ele em
sua obra, analisando os fenómenos, que para ele, eram autênticas provas da
existência de imortalidade da alma.
Daniel Dunglas Home foi considerado o mais surpreendente médium de todos os
tempos. Embora não fosse espírita, atribuía a responsabilidade dos fenómenos
aos Espíritos, o que contribuiu para popularização do Espiritismo nos nobres
salões da América e da Europa.
e) As Mesas Girantes
Em 1850, na França, surgiu um tipo de brincadeira chamada "mesa falante" ou
"mesa girante", que tomou conta dos salões festivos da época. A mesa girante
era uma mesinha redonda, de três pés, em torno da qual se ajuntavam as
pessoas para provocar manifestações de forças sobrenaturais.
As mãos dos presentes eram colocadas sobre a superfície da mesa que, através
de um fenómeno de efeitos físicos, dava saltos sobre seus pés, girando e
dando pancadas.
Por meio de um código alfabético semelhante ao usado pelas irmãs Fox, na
cidade de Hydesville, era possível conversar com o "invisível". A sociedade
francesa divertia-se em perguntar amenidades à mesa. Houve uma espécie de
febre em torno dessa brincadeira.
Uma senhora, chamada Emília de Girardim, desenvolveu uma sofisticada mesa
que girava livre e facilmente em torno de um eixo à maneira de roleta. Na
superfície e em circunferência eram colocadas as letras do alfabeto, os
números e as palavras sim e não. No centro, um ponteiro metálico ou agulha
fixa. O médium punha os dedos na borda da mesa que girava e parava sob a
agulha, na letra desejada pelas forças invisíveis para fazerem seus ditados.
Com isso, tornou-se possível conseguir, regularmente, mensagens vindas do
Além. As mesas girantes eram a grande sensação dos salões da Europa e
América. Por meio delas as pessoas passaram a ter contacto com o mundo
invisível, realizando sessões de comunicação espiritual, onde reinava a
frivolidade e a brincadeira.
c) Tiptologia
Os fenómenos de ruídos provocados por Espíritos em paredes, mesas ou outros
objectos, e que serviram de meios de comunicação com o invisível, foram mais
tarde classificados pelo nome de Tiptologia. Foi desta forma que iniciaram
as primeiras comunicações, que depois foram aperfeiçoadas, passando por
várias fases.
3.2 - ALLAN KARDEC
Allan Kardec foi um professor francês que se interessou pelo estudo das
manifestações espirituais e foi atraído pela novidade das mesas girantes. Em
1854, ele ouviu falar pela primeira vez do fenómeno, através de um amigo seu
chamado Fortier. No ano seguinte, se interessou mais pelo assunto, pois
soube tratar-se de intervenção dos Espíritos, informação dada pelo sr.
Carlotti, seu amigo há 25 anos. Depois de algum tempo, em maio de 1855, ele
foi convidado para participar de uma dessas reuniões, pelo Sr. Pâtier, um
homem muito sério e instruído. O professor era um grande estudioso do
magnetismo e aceitou participar, pensando tratar-se de fenómenos ligados ao
assunto. Após algumas sessões, começou a questionar para descobrir uma
resposta lógica que pudesse explicar o fato de objectos inertes emitirem
mensagens inteligentes. Admirava-se com as manifestações, pois parecia-lhe
que por detrás delas havia uma causa inteligente responsável pelos
movimentos. Resolveu investigar, pois desconfiou que atrás daqueles
fenómenos estava como que a revelação de uma nova lei.
As "forças invisíveis" que se manifestavam nas sessões de mesas falantes
diziam que eram as almas de homens que já haviam vivido na Terra. O
Codificador intrigava-se mais e mais. Num desses trabalhos, uma mensagem foi
destinada especificamente a ele. Um Espírito chamado Verdade disse-lhe que
tinha uma importante missão a desenvolver. Daria vida a uma nova doutrina
filosófica, científica e religiosa.
Kardec afirmou que não se achava um homem digno de uma tarefa de tal
envergadura, mas que sendo o escolhido, tudo faria para desempenhar com
sucesso as obrigações de que fora incumbido.
Com suas pesquisas, organizou e codificou a Doutrina Espírita. Seu
verdadeiro nome era Hippolyte Léon Denizard Rivail. Usava o pseudónimo de
Allan Kardec, para evitar que sua personalidade ficasse em evidência, pois
era um educador conhecido e tinha muitas obras publicadas nesse campo.
O Codificador nasceu no dia 3 de outubro de 1804, na cidade de Lyon, na
França, e desencarnou em 31 de março de 1869, aos 65 anos de idade. Era
casado com a professora Amélie Gabrielle Boudet. Falava quatro idiomas,
estudava astronomia e os fenómenos ligados ao magnetismo. Foi discípulo de
Pestalozzi, considerado o pai da pedagogia moderna.
3.3 - A CODIFICAÇÃO ESPÍRITA
a) O início
O desenvolvimento da Codificação Espírita basicamente teve início na
residência da família Baudin, no ano de 1855. Na casa havia duas moças que
eram médiuns. Tratava-se de Julie e Caroline Baudin, de 14 e 16 anos,
respectivamente. Através da "cesta-pião", um mecanismo parecido com as mesas
girantes, Kardec fazia perguntas aos Espíritos desencarnados, que as
respondiam por meio da escrita mediúnica. À medida que as perguntas do
professor iam sendo respondidas, ele percebia que ali se desenhava o corpo
de uma doutrina e se preparou para publicar o que mais tarde se transformou
na primeira obra da Codificação Espírita.
Todo o trabalho da revelação era revisado várias vezes, de modo a se evitar
erros ou interpretações dúbias. Na fase de revisão, o professor contou com a
preciosa ajuda de outra médium, que era sonâmbula, a srta. Japhet. Depois
dela, o Codificador ainda submeteu as questões a outros médiuns. Assim, o
trabalho contou com ajuda de pelo menos dez médiuns, nesta primeira fase.
A forma pela qual os Espíritos se comunicavam no princípio era através da
cesta-pião que tinha um lápis em seu centro. As mãos das médiuns eram
colocadas nas bordas, de forma que os movimentos involuntários, provocados
pelos Espíritos, produzissem a escrita. Com o tempo, a cesta foi substituída
pelas mãos dos médiuns, dando origem à conhecida psicografia. Das consultas
feitas aos Espíritos, nasceu "O Livro dos Espíritos", lançado em 18 de abril
de 1857, descortinando para o mundo todo um horizonte de possibilidades no
campo do conhecimento.
A partir daí, Allan Kardec dedicou-se intensivamente ao trabalho de expansão
e divulgação da Boa Nova. Viajou 693 léguas, visitou vinte cidades e
assistiu mais de 50 reuniões doutrinárias de Espiritismo.
Em Janeiro de 1858, o Codificador abraçou uma nova actividade. Inaugurou a
Revista Espírita, um mensário cujo objectivo era o de informar os adeptos do
Espiritismo sobre o crescimento do movimento e debater questões ligadas à
prática doutrinária. Assim, teve início a imprensa espírita. A Revista foi
editada por 12 anos.
Em abril de 1858, fundou a Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas,
entidade que se destinava a estudar, entender e explicar a fenomenologia
espírita. Foi a primeira sociedade espírita a constituir-se regular e
legalmente, tendo exercido grande influência moral entre os outros grupos,
por ter sido a sociedade iniciadora e central.
b) Obras da Codificação
Para a orientação dos seguidores do Espiritismo, Allan Kardec editou cinco
livros básicos, conhecidos como Pentateuco Kardequiano. São eles: O Livro
dos Espíritos, O Livro dos Médiuns, O Evangelho Segundo o Espiritismo, O Céu
e o Inferno e A Gênese. Neles, reuniu os ensinamentos da Espiritualidade
superior, analisando-os e codificando-os, de forma a ficarem claros e
interessantes.
O Livro dos Espíritos (1857): É uma obra de carácter filosófico, que procura
explicar de forma racional o porquê da vida. Divide-se em quatro tópicos:
"As causas primárias"; "Mundo espírita ou dos Espíritos"; "As leis morais";
e "Esperanças e consolações". É tido como a espinha dorsal do Espiritismo,
pois todas as outras obras partem de seus princípios.
O Livro dos Médiuns (1861): Orienta a conduta prática das pessoas que
exercem a função de intermediar o mundo espiritual com o material. Mostra
aos médiuns os inconvenientes da mediunidade, suas virtudes e os perigos
provindos de uma faculdade descontrolada. Ensina a forma de se obter
contactos proveitosos e edificantes junto à Espiritualidade. A obra
demonstra ainda as consequências morais e filosóficas decorrentes das
relações entre o invisível e o visível.
O Evangelho Segundo o Espiritismo (1864): Trata-se da parte moral e
religiosa da Doutrina Espírita. Ensina a teoria e a prática do Cristianismo,
através de comentários sobre as principais passagens da vida de Jesus,
feitos por Allan Kardec e pelos Espíritos superiores. Mostra que as
parábolas existentes no Evangelho, que aos olhos humanos parecem fantasias,
na verdade exprimem o mais profundo código de conduta moral de que se tem
notícia.
O Céu e o Inferno (1865): Neste livro, através da evocação dos Espíritos,
Allan Kardec apresenta a verdadeira face do desejado "céu", do temido
"inferno", como também do chamado "purgatório". Põe fim às penas eternas,
demonstrando que tudo no Universo evolui e que as teorias sobre o sofrimento
no fogo do inferno nada mais são do que uma ilusão. Comunicações de
Espíritos desencarnados, de cultura e hábitos diversos, são analisadas e
comentadas pelo Codificador, mostrando a situação de felicidade, de
arrependimento ou sofrimento dos que habitam o mundo espiritual.
A Gênese (1868): Este livro é um estudo a respeito de como foi criado o
mundo, como apareceram as criaturas e como é o Universo em suas faces
material e espiritual. É a parte científica da Doutrina Espírita. Explica a
Criação, colocando Ciência e Religião face a face.
A Gênesis bíblica é estudada e vista como uma realidade científica,
disfarçada por alegorias e lendas. Os sete dias narrados nas Escrituras
Sagradas são mostrados como o tempo que o Criador teria gasto com a formação
do Universo e da Terra; eras geológicas, que seguem a ordem cronológica
comprovada pela Ciência em suas pesquisas.
Os "milagres", realizados por Jesus, são explicados como sendo produto da
modificação dos elementos da natureza, sob a acção de sua poderosa
mediunidade.
3.4 - O TRÍPLICE ASPECTO
Desde as primeiras manifestações dos Espíritos superiores em torno da
Codificação da Doutrina, eles deixaram claro que o Espiritismo tinha em si
três linhas de acção: Ciência, Filosofia e Religião (moral).
É do espírito Emmanuel, psicografia de Francisco Cândido Xavier, a
afirmativa que esclarece perfeitamente o significado tríplice do Consolador:
"Em Espiritismo a Ciência indaga, a Filosofia conclui e o Evangelho
ilumina".
a) Princípios fundamentais da Doutrina Espírita
São considerados princípios básicos da Doutrina Espírita: a crença em Deus
como princípio criativo; a existência do Espírito e sua sobrevivência após a
morte; a reencarnação; a lei de causa e efeito; a influência do mundo
invisível sobre o visível; a comunicação entre esses dois mundos e a
evolução moral e intelectual progressivas.
O Espiritismo em suas práticas caracteriza-se pela realização do culto
interior. Nele, o homem procura conhecer-se e trabalhar para seu
adiantamento moral e intelectual. Nada há de exterior em seus costumes. Para
os Espíritos superiores tudo depende do pensamento, para o qual o fundo é
tudo e a forma nada significa.
"Pelo Espiritismo, o homem sabe de onde vem e para onde vai, porque sofre
temporariamente e vê por toda a parte a justiça de Deus. Sabe que a alma
progride sem cessar, através de uma série de existências sucessivas, até
atingir o grau de perfeição que pode aproximá-la de Deus" - (Allan Kardec -
A Gênese, cap. I, item 30)
Reencarnação
"E, descendo eles do monte, Jesus lhes ordenou, dizendo: A ninguém conteis a
visão, até que o Filho do homem seja ressuscitado dos mortos.
"E os seus discípulos o interrogaram, dizendo: Por que dizem os escribas que
é mister que Elias venha primeiro?
"E Jesus, respondendo, disse-lhes: Em verdade Elias virá primeiro, e
restaurará todas as coisas;
"Mas digo-vos que Elias já veio, e não o conheceram, mas fizeram-lhe tudo o
que quiseram. Assim farão eles também padecer o Filho do Homem.
"Então entenderam os discípulos que lhes falara de João Baptista" - (Mateus,
cap. 17 - 9 a 13).
4.0 - A REENCARNAÇÃO
A reencarnação era uma ideia comum nos tempos de Jesus. Nas Escrituras
Sagradas, o ponto onde o Mestre refere-se a ela de forma clara e inequívoca
é a passagem em que Ele, depois de descer do Monte Tabor, onde mantivera
contacto com seus amigos espirituais, afirma de modo inquestionável que João
Baptista teria sido a reencarnação do antigo profeta Elias.
Os Espíritos foram criados simples e ignorantes. No início, não possuem o
conhecimento do bem ou do mal. São dotados do germe da inteligência e, com o
tempo, adquirem consciência de si mesmos. Sua constituição, como já
dissemos, é abstracta e o modo como foram criados ainda não foi revelado
totalmente pelos Espíritos superiores.
Todo Espírito está destinado à perfeição, e como não poderia atingi-la numa
só vida, Deus concede-lhe outras existências, para que possa crescer em
inteligência e moralidade. O renascimento sucessivo do Espírito na dimensão
material é chamado reencarnação.
A evolução do Espírito se dá progressivamente, pois ela está intimamente
ligada à experiência. Através de lutas expiatórias e provas, o Espírito
caminha em busca da própria iluminação e aperfeiçoamento. Ao iniciar sua
jornada encarnatória nos primeiros estágios evolutivos, o Espírito sofre
todo tipo de influências, boas e ruins. Como é ignorante, suas tendências o
levam a vivenciar experiências no campo do erro. Nem todos os Espíritos
passam pelo caminho do mal, mas obrigatoriamente passam pelo da ignorância.
O Criador concede ao Espírito a liberdade de ceder ou resistir às más
influências. Trata-se do "livre arbítrio". Esta liberdade de agir como bem
entende, desenvolve-se à medida em que ele adquire consciência de si mesmo.
Isso faz com que tenha o mérito de suas próprias acções.
"Se o homem tivesse sido criado perfeito, seria levado fatalmente ao bem;
ora, em virtude de seu livre arbítrio, ele não é fatalmente levado nem ao
bem nem ao mal. Deus quis que ele fosse submetido à lei do progresso e que
esse progresso fosse o fruto de seu próprio trabalho, a fim de que tivesse o
mérito desse trabalho, do mesmo modo que carrega a responsabilidade do mal
que é feito por sua vontade" - (Allan Kardec - A Gênese, cap. III, item 9).
Uma encarnação pode ser livre, compulsória ou missionária, dependendo da
evolução e da necessidade do Espírito. Cada existência na matéria significa
um passo a mais na busca do aperfeiçoamento moral e intelectual. O Espírito
pode, por má vontade ou preguiça, manter-se estacionado, mas nunca regride a
estágios inferiores ao que se encontra. Tudo o que ele adquire em uma
encarnação faz parte de seu património espiritual e ele poderá usar em
outras experiências, para seu crescimento.
O número de encarnações necessárias ao esclarecimento definitivo do Espírito
varia entre eles. Os que estiverem imbuídos de boa vontade, tendem a atingir
a perfeição mais rápido. Os que se deixam iludir no caminho, perdem tempo e
demoram mais para atingir o grau de Espíritos puros. Tudo funciona mais ou
menos como numa escola, onde se aprende muito, pouco ou nada, de acordo com
o esforço de cada um. E como numa escola, aqueles que não adquirirem
condições não poderão ascender a classes mais adiantadas.
É durante suas reencarnações que o Espírito tem oportunidades para reparar
erros e sofrer experiências libertadoras. O mundo material é, portanto, uma
importante escola de aprendizado. No mundo espiritual se colhe os frutos
daquilo que se planta em vida. Todos os Espíritos sofrem as vicissitudes da
existência corpórea; uns para expiar seus erros; outros, mais evoluídos,
para provarem virtudes ou cumprirem missões.
A reencarnação é a chave que explica a Justiça e a Misericórdia de Deus.
Através dela, todas as aparentes injustiças podem ser compreendidas. Todos
os erros podem ser redimidos por meio de novas experiências e os Espíritos,
cedo ou tarde, encontram o caminho do Bem.
"Se a nossa esperança em Cristo se limita apenas a esta vida, somos os mais
infelizes de todos os homens" - (I Coríntios, 15.19).
4.1 - LEI DE CAUSA E EFEITO
O Criador concede a seus filhos o livre arbítrio, ou seja, a liberdade de
agirem como bem entenderem. Porém, todas essas acções estão sujeitas a uma
lei natural de justiça, chamada de "causa e efeito", "acção e reacção" ou
"plantio e colheita". É por meio desta lei que somos responsáveis por tudo
quanto fazemos ao próximo ou ao nosso próprio Espírito.
Livre é a semeadura das atitudes, porém, obrigatória é a colheita de suas
consequências. Uma má acção, que prejudique o próximo ou a nós mesmos,
resultará numa reacção contrária de igual intensidade. Esta é uma maneira
sábia da Lei ensinar a não repetirmos o erro. A Lei não castiga, mas
corrige.
O princípio de causa e efeito não foi criado pelo Espiritismo. Ele é uma das
leis da Física promulgada pelo sábio Isaac Newton, que tem o seguinte
enunciado:
"A toda acção realizada num determinado sentido, corresponderá uma reacção
de mesma intensidade e direcção oposta".
Muitos sofrimentos de pessoas ou povos que se observam na actualidade, são
perfeitamente explicados pelo mecanismo da acção e reacção da Lei de Deus.
Obras más, de encarnações passadas neste ou noutros mundos, provocam
colheitas desagradáveis na presente existência. Do mesmo modo, se o Bem for
objecto de preocupação das criaturas, o futuro guardará para elas uma
situação de paz, satisfação e felicidade.
A dor moral ou física deve ser encarada sem revoltas, pois geralmente são
resgates ou provas necessárias ao adiantamento do Espírito. A aceitação das
próprias dores produz alívio moral e ajuda na solução definitiva do
problema. Só o esclarecimento pode retirar o homem do estado de revolta
diante do sofrimento. A fé raciocinada é seguro escudo nas aflições pelas
quais necessitamos passar.
De posse deste conhecimento correctivo da Lei, nós, seres humanos, devemos
nos empenhar em acções de justiça e de benemerência para com o próximo,
estimulando assim a Lei Divina em favor de nós mesmos.
"Porém os males mais numerosos são aqueles que o homem criou para si, por
seus próprios vícios, aqueles que provêm de seu orgulho, de seu egoísmo, de
sua ambição, de sua cobiça, de seus excessos em todas as coisas; aí está a
causa das guerras e das calamidades que elas geram, das dissensões, das
injustiças, da opressão do fraco pelo mais forte, enfim, da maior parte das
moléstias" - (Allan Kardec - A Gênese, cap. III, item 6).
4.2 - CARMA
Carma é uma palavra sânscrita* que significa acção. Não é um termo
encontrado na Codificação Espírita, mas é usado hoje por muitos dos que se
interessam pelo Espiritismo. Achamos por bem comentar seu significado de
modo que se possa compreender seu real sentido.
Pode-se afirmar que o Carma é a história do Espírito, desde que teve sua
primeira encarnação no plano material. Quando começou sua acção evolutiva,
teve início seu Carma.
Ao contrário do que se pensa, Carma não é sinónimo de sofrimento. Carma é a
"gravação" psíquica, existente no Espírito, contendo suas acções. É uma
espécie de bagagem histórica, que lhe é própria. São suas virtudes,
defeitos, créditos, débitos e tendências que formam a personalidade. A cada
encarnação o Carma se modifica pela experiência na matéria. A educação e os
costumes do povo onde o Espírito encarna dão a ele novas características
morais e intelectuais.
A lei de causa e efeito, agindo nas encarnações, regula a evolução do Carma
modificando e renovando o património psicológico do Espírito.
* O sânscrito é uma das mais antigas línguas da Índia.
4.3 - A MORTE
Para sofrer suas experiências no mundo material, o Espírito se une a um
corpo carnal, através do perispírito que lhe serve de elo. O corpo funciona
como um instrumento de trabalho para a criatura. É movido por uma espécie de
força motriz, derivada do "fluido vital".
A morte é a desorganização do corpo carnal. À medida que envelhece, ele
desgasta-se materialmente. Quando ocorre a morte física há o consequente
desligamento entre o perispírito e o corpo orgânico. Esse desprendimento faz
com que a entidade retorne ao plano espiritual, que é a sua verdadeira
pátria. No Espiritismo, a morte é denominada "desencarnação".
Logo depois da morte do corpo carnal, o Espírito fica mais ou menos confuso
quanto ao seu novo estado. Esta situação chama-se "perturbação" e vai
cessando gradualmente, variando em termos de tempo de acordo com o nível
evolutivo do Espírito.
Aos poucos, o desencarnado vai tomando consciência de sua nova condição de
Espírito livre e sua mente vai se adaptando à dimensão espiritual. Com essa
melhoria, começa a compreender o estado de liberdade e anseia pelo
progresso. Alguns Espíritos desencarnados ficam em estado de perturbação por
muito tempo. A perturbação é um estado psíquico transitório que pode durar
de alguns minutos a anos.
4.4 - A VIDA DOS ESPÍRITOS
Após a morte física, as obras que se realizou no plano material determinam a
situação de vida que o Espírito vai ter no plano espiritual.
No intervalo de suas existências corpóreas o Espírito permanece por tempo
mais ou menos longo no mundo espiritual, onde é feliz ou infeliz segundo o
bem ou mal que tenha praticado. A vida espiritual é na verdade sua
verdadeira vida, seu estado definitivo. Nela ele progride igualmente e
adquire conhecimentos especiais que não poderia adquirir na Terra. É onde se
prepara para novas lutas no campo da matéria até que tenha se tornado puro e
sem necessidade de novas experiências carnais.
O Espírito, portanto, depois de desencarnado, vai habitar em regiões astrais
com as quais possui afinidade moral. Para facilitar o entendimento dos que
estão iniciando no estudo da ciência espírita, falaremos desses lugares
utilizando a forma como são concebidos pelo povo. Mas lhes daremos as
características difundidas, aceitas e explicadas pela Doutrina Espírita.
a) O inferno
O Inferno é uma expressão bíblica, usada pelas religiões convencionais para
designar as regiões espirituais onde habitam os maus Espíritos. A imagem que
foi feita dele na doutrina cristã foi originada do paganismo, perpetuada
pelos escritos dos poetas gregos. Não tendo o perfeito entendimento da vida
espiritual nem da justiça de Deus, imaginou-se que os homens maus só
poderiam merecer um castigo eterno.
A Doutrina Espírita veio nos esclarecer sobre esse importante dogma das
penas eternas, difundido pelas religiões oficiais da época. Ensina que o
Inferno é a morada temporária de entidades primitivas e malignas, inimigas
dos princípios do Bem e revoltadas contra a misericórdia de Deus. Nessas
regiões permanecem transitoriamente as almas dos que se comprazem no
assassínio, no furto, na mentira, na luxúria e nas paixões humanas.
Os Espíritos desencarnados que vão para essas regiões astrais não ficam
nelas definitivamente, como se pensava a princípio. Eles permanecem ali por
períodos variáveis, até que surjam novas oportunidades de reencarnação.
Todos os Espíritos inferiores, habitantes das dimensões trevosas, cedo ou
tarde encontrarão sua luz através do esclarecimento reencarnatório.
Ou seja, o inferno, ou trevas segundo a Doutrina Espírita, é um estado de
consciência compartilhado por aqueles cujos defeitos e sentimentos ruins
predominam em suas personalidades, que se inclinam ao mal e nele se
comprazem. São apenas irmãos imperfeitos e ignorantes, que têm o inferno
dentro de suas próprias consciências e que, através de novas oportunidades
dadas pelo Pai Celestial, através de sucessivas experiências encarnatórias
também alcançarão a perfeição.
b) O purgatório
Purgatório é um termo usado comumente no Catolicismo. Foi criado pela
"necessidade" de abrigar as almas dos que não eram muito maus para habitar o
inferno, nem tão bons para merecer o céu. Nas obras espíritas acessórias,
convencionou-se denominá-lo pela expressão "Umbral" e diz-se que é a região
espiritual purgatorial próxima da Terra. A maioria dos recém desencarnados
passa um período mais ou menos longo neste lugar, ou situação psíquica, a
fim de reflectir sobre suas obras. O Umbral é uma dimensão de muito
sofrimento. Abriga grande número de entidades em condições de dor e
angústia. Aí instalam-se as colónias socorristas, tais como "Nosso Lar" e
outras narradas na literatura mediúnica, para amparo dos Espíritos que são
recolhidos nessas situações. Allan Kardec diz que o purgatório dos Espíritos
também pode ser os mundos de expiação.
"O purgatório não é, portanto, uma ideia vaga e incerta: é uma realidade
material que vemos, tocamos e sofremos. Ele se encontra nos mundos de
expiação e a Terra é um deles. Os homens expiam nela o seu passado e o seu
presente em benefício do seu futuro" - (Allan Kardec - O Céu e o Inferno,
cap. V, item 4).
c) O paraíso
É a região astral onde moram os Espíritos puros e os bons Espíritos, que já
adquiriram saber e moralidade. Esses planos são denominados popularmente de
"paraísos" ou "colónias de luz". Alguns Espíritos que habitam essas regiões
estão livres de encarnações, outros não. Os Espíritos puros podem
reencarnar-se em mundos mais ou menos atrasados, para cumprirem missões.
Entretanto, não são mundos de contemplação como nos acostumamos a pensar. Ao
contrário, são lugares de trabalho e acção no campo do Bem e do Saber. É
onde o Espírito experimenta a verdadeira felicidade.
"A felicidade dos Espíritos bem-aventurados não está na ociosidade
contemplativa, que seria, como frequentemente se diz, uma eterna e
fastidiosa inutilidade.
"...A suprema felicidade consiste em desfrutar todos os esplendores da
Criação, que nenhuma linguagem humana poderia exprimir, que a mais fecunda
imaginação não poderia conceber. Consiste no conhecimento e compreensão de
todas as coisas, na ausência de qualquer sofrimento físico e moral, na
satisfação íntima, na serenidade do Espírito que nada altera, no amor que
une a todos os seres e portanto na ausência de todo o aborrecimento
proveniente da relação com os maus, e acima de tudo na visão de Deus e na
compreensão de seus mistérios revelados aos mais dignos" - (Allan Kardec - O
Céu e o Inferno, cap. III, item 12).
MEDIUNIDADE
"E nos últimos dias acontecerá, diz Deus, que do meu Espírito derramarei
sobre toda a carne; e os vossos filhos e as vossas filhas profetizarão, os
vossos mancebos terão visão, e os vossos velhos sonharão sonhos;
E também do meu Espírito derramarei sobre os meus servos e minhas servas
naqueles dias, e profetizarão;" - (Atos, cap. 2 - 17 e 18).
5.0 - O QUE É A MEDIUNIDADE
A mediunidade é uma sensibilidade existente nos seres vivos. É uma espécie
de "janela" pela qual se recebem as influências do plano espiritual. Toda
criatura viva possui mediunidade ou ao menos seus rudimentos. No homem, ela
se apresenta mais complexa e pode, em alguns casos, ser utilizada de "ponte"
entre os dois planos da vida.
Allan Kardec denominava "médiuns" somente as pessoas capazes de produzir
fenómenos ostensivos com suas faculdades.
"Quem quer que seja apto a receber ou transmitir as comunicações dos
Espíritos é, por isso mesmo, um médium, seja qual for o meio empregado e o
grau de desenvolvimento da faculdade - desde a mais simples influência
oculta até a produção dos mais insólitos fenómenos. Contudo, no uso
corrente, o vocábulo tem uma acepção mais restrita e se diz geralmente das
pessoas dotadas de um poder mediatriz muito grande, tanto para produzir
efeitos físicos, como para transmitir o pensamento dos Espíritos pela
escrita ou pela palavra" - (Allan Kardec, Revista Espírita, Fevereiro,
1859).
A mediunidade independe das condições morais do indivíduo. Às vezes,
criaturas de moral duvidosa possuem belíssimas faculdades, enquanto outras,
probas, cultas, dedicadas às coisas de Deus, não conseguem produzir nem
mesmo pequenos efeitos. A mediunidade, conforme a define Allan Kardec,
depende de uma organização física mais ou menos apropriada para
manifestar-se. É proveniente de uma disposição orgânica existente entre as
ligações do corpo carnal com o perispírito.
Existem dois obstáculos que dificultam a prática da mediunidade de modo
racional e produtivo. O primeiro deles é o uso que se pode dar à faculdade.
Há médiuns que a utilizam de forma incorrecta e prejudicial a quem deles se
serve. Tornam-se adivinhadores ou meros ledores de sorte. O outro problema é
a presença ostensiva de Espíritos inferiores junto dos médiuns, quando
começam o exercício da faculdade. Tal fato constitui-se em verdadeiro
estorvo ao progresso dos iniciantes, principalmente quando ainda estão
envolvidos naturalmente pela insegurança.
5.1 - A MEDIUNIDADE E SEUS FINS
A mediunidade tem várias finalidades para o ser humano. No serviço de
intercâmbio mediúnico, ela torna-se o elo entre os dois mundos, o físico e o
espiritual, demonstrando através dos fenómenos, a existência das coisas
invisíveis. Permite que os Espíritos desencarnados nos enviem mensagens
esclarecedoras falando da vida e do Universo criado por Deus. Ajuda-nos a
curar e aliviar as dores físicas e morais de enfermos e desajustados.
O canal mediúnico é a via de acesso que o Espírito encarnado mantém
permanentemente aberta para o mundo invisível. Por ele, a criatura recebe
influências positivas e negativas, que a excita ao progresso. Usando do seu
livre-arbítrio, o Espírito poderá segui-las ou ignorá-las, colhendo com
isso, os frutos da lei de plantio e colheita.
Através de milhares de encarnações, o Espírito segue o caminho do
crescimento espiritual, até adquirir sabedoria e domínio sobre suas más
inclinações. Os Espíritos encarnados exercem constante influência sobre os
desencarnados e vice-versa. Esta interinfluenciação se dá através dos
pensamentos e dos sentimentos individuais e colectivos.
Embora a faculdade propriamente dita seja orgânica, o uso bom ou mal que o
médium pode dar a ela depende de sua qualidade moral. Por isso, o médium que
não trabalha em sua própria edificação, torna-se presa fácil de maus
Espíritos, dando finalidade imprópria para um dom que lhe foi dado por Deus
para que servisse como instrumento de sua melhoria interior.
"Se o médium é de baixa moral, os Espíritos inferiores se agrupam em torno
dele e estão sempre prontos a tomar o lugar dos bons Espíritos a que ele
apelou. As qualidades que atraem de preferência os Espíritos bons são: a
bondade, a benevolência, a simplicidade de coração, o amor ao próximo, o
desprendimento das coisas materiais" - (Allan Kardec - O Livro dos Médiuns,
questão 227).
5.2 - TIPOS DE MÉDIUNS
"Mas a manifestação do Espírito é dada a cada um, para o que for útil.
Porque a um pelo Espírito é dada a palavra da sabedoria; a outro, pelo mesmo
Espírito, a palavra da ciência;
E a outro, pelo mesmo Espírito a fé; e a outro, pelo mesmo Espírito, os dons
de curar;
E a outro a operação de maravilhas; e a outro a profecia; e a outro o dom de
discernir os Espíritos; e a outro a variedade de línguas; e a outro a
interpretação das línguas" - (I Coríntios, cap. 12, 7-10).
Os médiuns podem ser divididos em duas grandes categorias: médiuns de
efeitos físicos e médiuns de efeitos intelectuais. Cada uma delas tem uma
finalidade específica frente à humanidade do nosso tempo.
a) Médiuns de Efeitos Físicos
São os médiuns dotados de faculdade capaz de produzir efeitos materiais
ostensivos. Seus trabalhos têm a finalidade de chamar a atenção da
incredulidade humana para a existência dos Espíritos e do mundo invisível.
Produzem fenómenos materiais, tais como: movimento de corpos inertes,
ruídos, voz directa, curas fenoménicas, transportes etc.
Os médiuns de efeitos físicos podem ser divididos em dois grupos: os
facultativos, que têm consciência dos fenómenos que produzem; e os
involuntários, ou naturais, que não possuem consciência de suas faculdades e
são usados pelos Espíritos para promoverem manifestações sem que o saibam.
Certas comunicações dadas por Espíritos desencarnados através de aparelhos
electrónicos (TCI), onde alguns autores disseram não haver necessidade da
presença da mediunidade, foram produzidas por acção de médiuns de efeitos
físicos involuntários.
Esse tipo de médium era muito comum no advento do Espiritismo e foi muito
útil na divulgação das ideias espíritas, chamando a atenção das pessoas para
a realidade do fenómeno.
b) Médiuns de Efeitos Intelectuais
São os médiuns dotados de faculdades que produzem comunicações inteligentes,
com as quais é possível aprender conceitos morais e filosóficos. Essas
manifestações nos ajudam a entender o mundo invisível e o estilo de vida que
levam os seus habitantes. Existe uma grande variedade de médiuns, que se
ligam mais ou menos directamente a uma ou a outra dessas duas categorias. Em
estudos futuros, que realizaremos em O Livro dos Médiuns, serão tratados os
pormenores sobre a classificação que Allan Kardec deu a cada tipo de médium
e às manifestações mediúnicas. A título de instrução básica, faremos alguns
comentários sobre os tipos de médiuns mais encontrados:
Médiuns Sensitivos ou Impressionáveis: São as pessoas que possuem
sensibilidade capaz de sentir com facilidade a presença dos Espíritos. Essa
mediunidade não é bem definida, pois os médiuns em geral são
impressionáveis. Seria mais uma qualidade geral do que especial, ou seja,
uma faculdade rudimentar, essencial ao desenvolvimento das outras.
Médiuns Audientes ou Auditivos: Os médiuns auditivos ou audientes são
aqueles capazes de ouvirem a voz dos Espíritos de forma clara e inequívoca.
Tais fenómenos ocorrem geralmente nas reuniões mediúnicas. Podem, assim,
conversar com os desencarnados, ouvindo e transmitindo suas instruções para
o plano material. Este tipo de mediunidade é agradável se o médium só ouve
Espíritos bons. Mas, quando cai presa de um Espírito mau, pode
caracterizar-se numa tenaz obsessão.
Médiuns Falantes ou de Psicofonia: São os médiuns que recebem comunicações
dos Espíritos através da fala. O médium psicofónico pode não ter consciência
do que diz, exprimindo ideias totalmente contrárias aos seus conhecimentos.
Uns guardam lembranças claras do que transmitem; outros não.
Há médiuns que recebem as ideias dos Espíritos por meio do canal intuitivo,
também denominado "mediunidade natural", expondo com suas próprias palavras
o que a entidade quer revelar.
Médiuns Videntes: Os médiuns videntes são aqueles com capacidade para captar
imagens do mundo espiritual. Uns possuem esta faculdade em estado normal,
perfeitamente acordados. Outros, têm-na em estado sonambúlico ou próximo do
sonambulismo.
Os médiuns videntes não vêem com os olhos carnais, mas sim com os da alma.
Por isso, independe de estarem de olhos abertos ou fechados para enxergarem
os Espíritos.
É preciso saber separar a vidência propriamente dita, das aparições
acidentais e espontâneas. A vidência, embora varie de intensidade, consiste
na possibilidade mais ou menos frequente de se ver os Espíritos. A
interpretação das visões espirituais varia de um médium para outro, segundo
sua condição evolutiva. Já as aparições podem acontecer para qualquer um,
mesmo para as pessoas que não sejam videntes.
As aparições acidentais de Espíritos, são frequentes na hora do desencarne
de entes queridos, que se encontram distantes. Nesses casos, os Espíritos
aparecem à parentela, como se quisessem dar testemunho de que estão vivos e
que partem para uma nova vida. Diz-se, popularmente, que vieram avisar de
sua morte.
As visões durante o sono do corpo físico também fazem parte da categoria das
aparições.
Médiuns Sonâmbulos ou Sonambúlicos: Os médiuns sonâmbulos ou sonambúlicos
são os que, durante o transe de desdobramento mediúnico, agem sob a
influência do seu próprio Espírito. São eles mesmo que, desprendendo-se de
seus corpos físicos, projectam-se no mundo espiritual e conversam com os
desencarnados, vendo, ouvindo e percebendo o que vai à sua volta. Vivem,
durante breves instantes, a liberdade dos Espíritos livres. Seus sentidos
não sofrem as limitações provocadas pela matéria.
Este tipo de médium pode nos transmitir tudo o que lhe acontece durante o
transe, inclusive falar dos conselhos que recebe dos bons Espíritos, quando
no plano espiritual. Também são conhecidos como "sonâmbulos", os médiuns que
perdem a consciência durante as comunicações.
Médiuns Curadores: São médiuns curadores aquelas pessoas que possuem o poder
magnético (ou dom) de curar as enfermidades orgânicas, ou aliviar dores pela
imposição das mãos ou pela prece. A fé, aliada ao magnetismo do médium e
auxílio dos bons Espíritos, realiza os fenómenos de curas. Jesus era um
médium curador em potencial.
Os médiuns curadores, por produzirem efeitos materiais, também podem ser
classificados como médiuns de "efeitos físicos". O dom de curar é um dos
mais belos que o médium pode adquirir, mas exige dele uma vida de exemplos e
de sadia moral.
Médiuns Psicógrafos ou Escreventes: São os que transmitem as comunicações
dos Espíritos através da escrita. Estes médiuns são muito comuns. Dividem-se
em: mecânicos, semimecánicos e intuitivos.
Os mecânicos não têm consciência do que escrevem. A influência do pensamento
do médium na comunicação é quase nula. A ideia do Espírito desencarnado se
expressa com maior clareza, pois há grande domínio da entidade sobre a
faculdade mediúnica.
Já nos semimecánicos, a comunicação sofre uma influência um pouco maior do
pensamento do médium. A dominação do Espírito sobre suas faculdades não é
tão profunda. São a maioria entre os médiuns psicógrafos.
Os médiuns intuitivos são os que recebem a ideia do comunicante e a
interpretam de acordo com seu conhecimento pessoal. Existem outras
variedades de médiuns que serão estudadas futuramente em O Livro dos
Médiuns, no capítulo que trata de sua classificação.
5.3 - CONSEQÜÊNCIAS MORAIS DA PRÁTICA MEDIÚNICA
A prática da mediunidade no Espiritismo não tem como meta somente a produção
de fenómenos físicos, destinados a despertar os incrédulos, ou curar
enfermidades carnais e espirituais. As actividades curativas, além de
demonstrarem a acção da Misericórdia Divina, servem ainda para alertar o ser
humano de que ele é algo mais do que matéria. Deve despertá-lo para o real
sentido da vida, provocando-lhe uma consequência de ordem moral.
Frente ao mundo terreno, repleto de interesses imediatistas, o homem busca
sua felicidade afogando-se nas ilusões provocadas pela matéria. Perde-se em
paixões transitórias, não atentando para o nobre ideal da vida, que é o
aprendizado e o progresso do Espírito como criatura imortal. A mediunidade é
um meio pelo qual os Espíritos superiores apresentam novos conceitos e
horizontes mais amplos às pessoas. Isso lhes renova o ânimo e as esperanças
em relação ao futuro.
O contacto com o mundo espiritual, através da mediunidade, nos mostra que,
pela acção da Lei de Causa e Efeito, colhemos tudo aquilo que plantamos. Que
uma vida egoísta e orgulhosa só conduz ao sofrimento, ao passo que uma
conduta pautada nas orientações do Evangelho encaminha-nos para um estado de
equilíbrio e à verdadeira felicidade.
É pela mediunidade que somos esclarecidos que, ao morrermos, vivemos; que
encarnaremos em outras ocasiões, ora numa condição social, ora noutra; que
os princípios morais ensinados por Jesus, o Cristo, fazem nascer na
intimidade dos homens o tão sonhado Reino de Deus.
Por fim, a pessoa que abraça tão nobre tarefa tem em mãos uma grande
ferramenta de crescimento espiritual, uma vez que depende de sua condição
moral o contacto com as forças espirituais do Bem. Agindo como instrumento
nesse intercâmbio, sabe que depende de seu esforço pessoal o bom ou mau uso
que fizer do dom que Deus lhe deu.
"Todas as nossas faculdades são favores que devemos agradecer a Deus, pois
há criaturas que não as possuem. Podias perguntar porque Deus concede boa
visão a malfeitores, destreza aos larápios, eloquência aos que só a utilizam
para o mal. Acontece o mesmo com a mediunidade. Criaturas indignas a possuem
porque dela necessitam mais do que as outras, para se melhorarem" - (Livro
dos Médiuns - Questão 226, item 2).
OS FLUIDOS
"... e quando semeias, não semeias o corpo que há de ser, mas o simples
grão, como de trigo ou de qualquer outra semente.
Mas Deus dá o corpo como lhe aprouve dar e a cada uma das sementes, o seu
corpo apropriado.
Nem toda carne é a mesma; porém uma é a carne dos homens, outra a dos
animais, outra a das aves, outra a dos peixes.
Também há corpos celestiais e corpos terrestres; e, sem dúvida, uma é a
glória dos celestiais e outra, a dos terrestres.
Uma é a glória do sol, outra a glória da lua, outra a das estrelas; porque
até entre as estrelas há diferenças de esplendor" - (I Coríntios, cap. 15 -
37 a 41).
6.0 - CONSIDERAÇÕES
Um dos grandes mistérios que a Ciência humana procura esclarecer é o da
existência de uma matéria básica universal, capaz de servir como ponto de
partida para a origem dos elementos físicos conhecidos. Embora pesquisadores
em todo o mundo tenham se empenhado no estudo da estrutura íntima dos
átomos, ainda não se conseguiu encontrar esse elemento básico primitivo.
Acredita-se que o Universo, em seu lado material, tenha uma idade calculada
aproximadamente entre 9 e 16 bilhões de anos. Estudos modernos afirmam que
no princípio todos os elementos materiais estavam reunidos num só "ponto’’,
sob uma pressão incalculável. Num dado momento, esse ponto teria explodido,
dispersando matéria pelo espaço, dando origem às nebulosas, aos sistemas
estelares, aos planetas e aos astros.
O Universo, de acordo com a física moderna, continua a se expandir e não se
sabe até quando continuará neste processo. A Ciência entende que,
encontrando o elemento material primitivo, estaria frente à solução de
muitos mistérios sobre a origem das coisas.
No século XIX, quando começaram as manifestações dos Espíritos, eles
revelaram uma teoria onde explicavam de forma racional a origem das coisas
materiais e espirituais. Diziam que havia por toda a Criação um elemento
primitivo etéreo, denominado "fluido universal", e que todos os elementos
materiais conhecidos seriam formas modificadas deste fluido.
Alguns cientistas no passado pesquisaram a matéria básica, também denominada
"éter", mas não conseguiram convencer os meios científicos de sua
existência. A Ciência não podia compreender a presença, no espaço, de uma
matéria tão subtil que não fosse detectada pelos instrumentos existentes. O
Espiritismo, através dos fenómenos de efeitos físicos, demonstrou a
existência do fluido universal, base de todos os elementos materiais.
6.1 - FLUIDO UNIVERSAL
O fluido universal é a matéria básica fundamental de todo o Universo
material e espiritual, a matéria elementar primitiva. É altamente
influenciável pelo pensamento (que é uma forma de energia), podendo se
modificar, assumir formas e propriedades particulares.
A acção do Pensamento Divino sobre o fluido universal deu origem às
nebulosas, aos sistemas estelares, aos planetas e astros. É nessa matéria
fluídica que o Criador executa o plano existencial.
O fluido universal preenche todo o espaço existente entre os mundos. Por
meio dele viajam as ondas do pensamento, do mesmo modo que as ondas sonoras
se projectam na camada atmosférica.
Em torno dos planetas, o fluido universal apresenta-se modificado. A
presença da vida no orbe impõe-lhe características especiais, pois que é
alterado pela actividade mental dos habitantes. Assim, nos mundos mais
primitivos, o fluido universal que os circunda apresenta-se escuro e pesado.
Nos mundos mais civilizados, a atmosfera espiritual é mais leve e luminosa.
Para melhor compreensão, pode-se dizer que esse princípio elementar tem dois
estados distintos: o da imponderabilidade ou de eterização (estado normal
primitivo), e o de ponderabilidade ou de materialização. Ao primeiro estado
pertencem os fenómenos do mundo invisível e ao segundo os do mundo visível.
Logicamente entre os dois pontos existem inúmeras formas intermediárias de
transformação do fluido em matéria tangível.
No estudo deste importante assunto poderemos entender a origem de muitas
afecções do ser humano e os fundamentos da fluidoterapia, largamente
empregada nos centros espíritas, na profilaxia e tratamento das enfermidades
físicas e espirituais.
"No estado de eterização, o fluido universal não é uniforme; sem cessar de
ser etéreo, passa por modificações tão variadas em seu género, e mais
numerosas talvez, do que no estado de matéria tangível. Tais modificações
constituem fluidos distintos que, se bem sejam procedentes do mesmo
princípio, são dotados de propriedades especiais, e dão lugar aos fenómenos
particulares do mundo invisível. Uma vez que tudo é relativo, esses fluidos
têm para os Espíritos, que em si mesmo são fluídicos, uma aparência material
quanto a dos objectos tangíveis para os encarnados, e são para eles o que
para nós são as substâncias do mundo terrestre; eles as elaboram, as
combinam para produzir efeitos determinados como o fazem os homens com seus
materiais, embora usando processos diferentes" - (Allan Kardec - A Gênese,
cap. XIV, item 3).
6.2 - FLUIDO VITAL
Os Espíritos afirmam que uma das modificações mais importantes do fluido
universal é o fluido vital. Ele é o responsável pela força motriz que
movimenta os corpos vivos. Sem ele, a matéria é inerte. Podemos dizer que
ele é responsável pela animalização da matéria, pois, segundo os Espíritos,
a vida é resultado da acção de um agente sobre a matéria. Esse agente é o
fluido vital. É ele que dá vida a todos os seres que o absorvem e assimilam.
A matéria sem ele não tem vida assim como ele sem a matéria não é vida.
Quando os seres orgânicos perdem a vitalidade, por ocasião da morte, a
matéria se decompõe formando novos corpos e o fluido vital volta à massa, ao
todo universal, para novas combinações e utilizações no Universo.
Cada ser tem uma quantidade de fluido vital, de acordo com suas
necessidades. As variações dependem de um série de factores. Allan Kardec
nos instrui sobre o assunto em O Livro dos Espíritos, pergunta 70:
"A quantidade de fluido vital não é a mesma em todos os seres orgânicos:
varia segundo as espécies e não é constante no mesmo indivíduo, nem nos
vários indivíduos de uma mesma espécie. Há os que estão, por assim dizer,
saturados de fluido vital, enquanto outros o possuem apenas em quantidade
suficiente. É por isso que uns são mais activos, mais enérgicos, e de certa
maneira, de vida superabundante.
A quantidade de fluido vital se esgota. Pode tornar-se incapaz de entreter a
vida, se não for renovada pela absorção e assimilação de substâncias que o
contêm.
O fluido vital se transmite de um indivíduo a outro. Aquele que o tem em
maior quantidade pode dá-lo ao que tem menos, e em certos casos fazer voltar
uma vida prestes a extinguir-se".
Estudando esses fundamentos à luz do Espiritismo, chegamos à compreensão de
muitas coisas simples que nos pareciam complicadas e irreais, como por
exemplo a citação de Moisés na Bíblia sobre a origem do homem. Diz ele: "
Deus formou o corpo do homem do limo da terra e lhe deu uma alma vivente à
sua semelhança". Ele estava certo, pois queria dizer que o corpo material
era formado dos mesmos elementos que tinham servido para formar o pó da
terra. A "alma vivente à sua semelhança" é o princípio inteligente ou
espiritual retirado da essência divina, fazendo grande distinção entre o
material e o espiritual.
O homem pode manter o equilíbrio de sua saúde vital através da alimentação,
da respiração de ar não poluído e, acima disso, mantendo uma conduta mental
sadia. O Princípio vital é a lei que rege a existência do fluido vital.
6.3 - ATMOSFERA FLUÍDICA
"Os maus pensamentos corrompem os fluidos espirituais, como os miasmas
deletérios corrompem o ar respirável" - (Allan Kardec - A Gênese, cap. XIV,
item 16).
Vimos que o pensamento exerce uma poderosa influência nos fluidos
espirituais, modificando suas características básicas.
Os pensamentos bons impõem-lhes luminosidade e vibrações elevadas que causam
conforto e sensação de bem estar às pessoas sob sua influência. Os
pensamentos maus provocam alterações vibratórias contrárias às citadas
acima. Os fluidos ficam escuros e sua acção provoca mal estar físico e
psíquico.
Pode-se concluir assim, que em torno de uma pessoa, de uma família, de uma
cidade, de uma nação ou planeta, existe uma atmosfera espiritual fluídica,
que varia vibratoriamente, segundo a natureza moral dos Espíritos
envolvidos.
À atmosfera fluídica associam-se seres desencarnados com tendências morais e
vibratórias semelhantes. Por esta razão, os Espíritos superiores recomendam
que nossa conduta, nas relações com a vida, seja a mais elevada possível.
Uma criatura que vive entregue ao pessimismo e aos maus pensamentos, tem em
volta de si uma atmosfera espiritual escura, da qual aproximam-se Espíritos
doentios. A angústia, a tristeza e a desesperança aparecem, formando um
quadro físico-psíquico deprimente, que pode ser modificado sob a orientação
dos ensinos morais de Jesus.
"A acção dos Espíritos sobre os fluidos espirituais tem consequências de
importância directa e capital para os encarnados. Desde o instante em que
tais fluidos são o veículo do pensamento; que o pensamento lhes pode
modificar as propriedades, é evidente que eles devem estar impregnados das
qualidades boas ou más, dos pensamentos que os colocam em vibração,
modificados pela pureza ou impureza dos sentimentos" - (Allan Kardec - A
Gênese, cap. XIV, item 16).
À medida que cresce através do conhecimento, o homem percebe que suas
mazelas, tanto físicas quanto espirituais, é directamente proporcional ao
seu grau evolutivo e que ele pode mudar esse estado de coisas,
modificando-se moralmente. Aliando-se a boas companhias espirituais através
de seus bons pensamentos, poderá estabelecer uma melhor atmosfera fluídica
em torno de si e, consequentemente, do ambiente em que vive. Resumindo,
todos somos responsáveis pelo estado de dificuldades morais que vive o
planeta actualmente.
"Melhorando-se, a humanidade verá depurar-se a atmosfera fluídica em cujo
meio vive, porque não lhe enviará senão bons fluidos, e estes oporão uma
barreira à invasão dos maus. Se um dia a Terra chegar a não ser povoada
senão por homens que, entre si, praticam as leis divinas do amor e da
caridade, ninguém duvida que não se encontrem em condições de higiene física
e moral completamente outras que as hoje existentes" - (Allan Kardec -
Revista Espírita, Maio, 1867).
6.4 - O PERISPÍRITO
"Semeia-se corpo natural, ressuscita corpo espiritual. Se há corpo natural,
há também corpo espiritual" - (Coríntios I, cap. 15, versículo 44).
Sabe-se que a alma é revestida por um envoltório ou corpo fluídico, chamado
perispírito, constituído das modificações do fluido universal. É, por assim
dizer, uma condensação do fluido cósmico em redor do foco de inteligência ou
alma, deduzindo-se daí que o corpo perispiritual e o corpo humano têm sua
fonte no mesmo fluido, posto que sob dois estados diferentes.
O perispírito, ou corpo astral, pode ser definido como um veículo
intermediário entre o Espírito e a matéria. É o agente das sensações
externas. Paulo de Tarso, na Bíblia, chamou-o corpo espiritual.
O Espírito, quando encarnado, não age directamente sobre os corpos
materiais. Sua natureza abstracta não o permite. O perispírito é o laço que
serve de elo entre ambos, pois, enquanto de um lado sofre a influência do
pensamento, do outro exerce contacto com a matéria. É o perispírito quem
transmite as ordens conscientes e inconscientes do Espírito para a actuação
do corpo físico. No sentido contrário, o corpo astral leva as sensações
captadas pelo corpo físico à apreciação da alma.
a) Constituição do perispírito
O corpo espiritual é de natureza semimaterial, constituído de uma
modificação do fluido universal do orbe onde o Espírito está encarnado. A
estrutura do perispírito varia de mundo para mundo. Quanto mais evoluído é o
planeta, mais subtil é o corpo fluídico dos que nele vivem. O perispírito
modifica-se de acordo com a evolução do Espírito. Isso se dá por causa da
influência do pensamento da entidade, na estrutura molecular do corpo
espiritual. Diz Allan Kardec, em O Livro dos Espíritos, pergunta 182: "À
medida que o Espírito se purifica o corpo que o reveste aproxima-se
igualmente da natureza espírita".
O perispírito não é uma massa homogénea. Possui órgãos como o corpo físico e
centros vitais, por onde são absorvidas as energias espirituais.
Segundo as provas que certos Espíritos devem passar em suas encarnações, o
corpo astral poderá exercer influência na formação do corpo carnal, dando
origem a enfermidades ou anomalias orgânicas.
perispírito é altamente plasmável. Quando o Espírito está em liberdade, pode
mudá-lo de forma pela acção da sua vontade. Esta propriedade explica as
frequentes referências às aparições de seres angelicais e demoníacos,
narradas na história da humanidade.
As aparições de Espíritos são chamadas "materializações". Nesses fenómenos,
o que se vê é o perispírito da criatura manifesta e não o Espírito, como
pensam alguns.
b) Funções do perispírito
Quando migra de um mundo para outro, o Espírito troca de perispírito como se
trocasse de roupa, pois seu corpo espiritual é formado de uma variação do
fluido universal, existente em torno do planeta onde encarna.
O corpo fluídico reflecte as experiências da entidade, mas não é a sede da
memória. O perispírito registra as experiências vividas pela criatura e as
envia ao "sensorium comune" do Espírito (que é o próprio Espírito), arquivo
definitivo de todas as passagens da entidade pelo processo evolutivo.
Sabe-se que os fluidos são o veículo do pensamento do Espírito e que este
pode imprimir naqueles as características que lhe aprouver, com a força de
sua vontade, exercendo sobre a matéria a acção resultante desta actuação. É
através do perispírito que se dá essa acção na matéria. Funciona, portanto,
como uma esponja que absorve do meio as emanações fluídicas boas ou más
existentes nele. Deduz-se daí a origem de certos processos de enfermidades,
como também compreende-se os mecanismos da cura através da fluidoterapia.
O perispírito tem importante papel nos fenómenos psicológicos, fisiológicos
e patológicos. Quando a Medicina humana der abertura aos conhecimentos da
Ciência Espírita, ela abrirá novos horizontes para uma abordagem e um
tratamento mais completos das moléstias orgânicas e psíquicas. O Espiritismo
contribuirá com as técnicas de manipulação das energias para revitalizar o
corpo astral e fornecerá elementos morais educativos, necessários ao
equilíbrio definitivo do ser.
"O perispírito dos encarnados é de natureza idêntica à dos fluidos
espirituais, e por isso os assimila com facilidade, como a esponja se embebe
de líquido. Esses fluidos têm sobre o perispírito uma acção tanto mais
directa, quanto, por sua expansão e por sua irradiação, se confunde com
eles" - (Allan Kardec - A Gênese, cap. XIV, item 18).
O PASSE
"E Deus, pelas mãos de Paulo, fazia milagres extraordinários, a ponto de
levarem aos enfermos lenços e aventais do seu uso pessoal, diante dos quais
as enfermidades fugiam das suas vítimas, e os Espíritos malignos se
retiravam" - (Atos, cap. 19 - 11 e 12).
7.0 - O QUE É O PASSE
Desde os tempos mais antigos, a imposição das mãos é uma das fórmulas usadas
pelas pessoas para auxiliar os enfermos ou afastar deles as más influências
espirituais. Em muitos trechos da Bíblia, vemos Jesus e seus discípulos
imporem as mãos sobre os necessitados, rogando a Deus que os curassem. Jesus
fez largo uso dessa prática e disse que, se quiséssemos, poderíamos fazer o
mesmo. E desde aquele tempo o homem utiliza-se desse recurso para aliviar,
consolar, melhorar e até curar doenças físicas e espirituais.
Antes do advento do Espiritismo, sabia-se pouco sobre a prática desse
costume. Os fenómenos de curas eram envoltos em mistérios e tidos como
acontecimentos sobrenaturais.
Ao menos publicamente, ninguém se aventurou a dar explicações para o
estranho poder que tinham as mãos para curar e aliviar os males físicos e
espirituais. Com a chegada da Doutrina Espírita, os Espíritos superiores
explicaram o porquê das coisas. Ensinaram que as mãos serviam como um
instrumento para a projecção de fluidos magnetizados, doados pelo operador,
e fluidos espirituais, trazidos pelos Espíritos. Segundo eles, os fluidos
curativos eram absorvidos pela pessoa necessitada por meio dos centros
vitais (chacras), acumuladores e distribuidores de energias, localizados no
perispírito e pelo próprio corpo astral que age como uma esponja. Estavam
assim explicadas, teoricamente, as curas promovidas por Jesus e pelos
curadores de todos os tempos.
Entre nós, seguidores de Allan Kardec, a imposição de mãos sobre uma
criatura com a intenção de aliviar sofrimentos, curá-la de algum mal, ou
simplesmente fortalecê-la, ficou conhecida como "passe".
O passe é um dos métodos utilizados nos centros espíritas para o alívio ou
cura dos sofrimentos das pessoas. Quando ministrado com fé, o passe é capaz
de produzir verdadeiros prodígios. Têm como objectivo o reequilibro do corpo
físico e espiritual.
7.1 - O PASSISTA
O passista é aquele que ministra o passe. Ser um passista espírita é uma
tarefa de grande responsabilidade, pois trata-se de ajudar e abençoar as
pessoas em nome de Deus. Pessoas carentes e sedentas de melhoria, procuram
no centro espírita o recurso do passe como forma de alívio das pressões
psicológicas e sustentação para suas forças morais e físicas.
O passista não precisa ser um santo, mas necessita esforçar-se na melhoria
íntima e no aprendizado intelectual. Armado do desejo sincero de servir,
quase todos os iniciantes podem trabalhar neste sagrado ministério. O
passista deve procurar viver uma vida sadia, tanto física quanto moralmente.
Aos poucos, os vícios terrenos têm que ceder lugar às virtudes. O uso do
cigarro e da bebida devem ser evitados. Como o passista doa de si uma parte
dos fluidos que vão fortalecer o lado material e espiritual do necessitado,
esses fluidos precisam estar limpos de vibrações deletérias oriundas de
vícios.
No aspecto mental, o passista deve cultivar bons pensamentos no seu
dia-a-dia. O orgulho, o egoísmo, a maledicência, a sensualidade exagerada e
a violência nas atitudes devem ser combatidos constantemente. A
Espiritualidade superior associa equipes de Benfeitores aos trabalhadores
que se esforçam, multiplicando-lhes a capacidade de serviço.
A fé racional e a certeza no amparo dos bons Espíritos são sentimentos que
devem estar presentes no coração de todos os passistas. É fundamental no
trabalho de passe, doar-se com sinceridade à tarefa sob sua
responsabilidade, vendo em todo sofredor uma alma carente de amparo e
orientação.
O passista não deve ter preferência por quem quer que seja. Seu auxílio deve
ser igualmente distribuído a todas as criaturas. As elevadas condições
morais do passista são fundamentais para que ele consiga obter um resultado
satisfatório no serviço do passe.
Portanto, todos podemos ministrar passes, porém é necessário um mínimo
preparo moral a fim de que a ajuda seja o mais eficaz possível. Como todas
as tarefas realizadas dentro do centro espírita, esta também carece de
cuidados e atenção por parte de quem se propõe a executá-la.
"Como a todos é dado apelar aos bons Espíritos, orar e querer o bem, muitas
vezes basta impor as mãos sobre a dor para a acalmar; é o que pode fazer
qualquer um, se trouxer a fé, o fervor, a vontade e a confiança em Deus" -
(Allan Kardec - Revista Espírita, Setembro, 1865).
O que é necessário para ser um bom passista?
Allan Kardec nos instrui a respeito: "A primeira condição para isto é
trabalhar em sua própria depuração (moral e ética), a fim de não alterar os
fluidos salutares que está encarregado de transmitir. Esta condição não
poderia ser executada sem o mais completo desinteresse material e moral. O
primeiro é o mais fácil, e o segundo é o mais raro, porque o orgulho e o
egoísmo são sentimentos difíceis de se extirpar, e porque várias causas
contribuem para os superexcitar nos médiuns" - (Allan Kardec - Revista
Espírita, Novembro, 1866).
Condições básicas para o exercício do passe espírita:
- Fé; Amor ao próximo; Disciplina; Vontade; Conhecimento; Equilíbrio
psíquico; Humildade; Devotamento; Abnegação.
"Se pretendes, pois guardar as vantagens do passe, que em substância, é ato
sublime de fraternidade cristã, purifica o sentimento e o raciocínio, o
coração e o cérebro" - (Espírito Emmanuel, no livro Segue-me).
Factores negativos físicos, que prejudicam os resultados do passe:
- Uso do fumo e do álcool ; Desequilíbrio nervoso; Alimentos inadequados.
Factores negativos espirituais/morais:
- Mágoas, más paixões, egoísmo, orgulho, vaidade, cupidez, vida desonesta,
adultério etc.
"O fluido humano está sempre mais ou menos impregnado de impurezas físicas e
morais do encarnado; o dos bons Espíritos é necessariamente mais puro e, por
isto mesmo, tem propriedades mais activas, que acarretam uma cura mais
pronta. Mas, passando através do encarnado pode alterar-se. Daí, para todo
médium curador, a necessidade de trabalhar para seu melhoramento moral" -
(Allan Kardec - Revista Espírita, Setembro, 1865).
7.2 - TIPOS DE PASSES
Os passes podem ser classificados em três categorias: Passe magnético, Passe
espiritual e Passe misto.
a) Passe magnético
É um tipo de passe em que a pessoa doa apenas seus fluidos, utilizando a
força magnética existente no próprio corpo perispiritual. Pelo menos em
tese, qualquer criatura pode ministrá-lo. Suas qualidades variam segundo a
condição moral do passista, sua capacidade de doar fluidos e seu desejo
sincero de amparar o próximo.
No passe magnético, geralmente se recebe assistência espiritual. Isso
acontece porque os Espíritos superiores sempre ajudam aqueles que, imbuídos
de boa vontade, atendem aos mais carentes. Lembramos aqui, que o socorro dos
Benfeitores é independente da crença que o passista ou magnetizador possa
ter em Deus ou na Espiritualidade. Os Espíritos disseram a Allan Kardec, em
"O Livro dos Médiuns", questão 176 :
"...muito embora uma pessoa desejosa de fazer o bem não acredite em Deus,
Deus acredita nela".
b) Passe espiritual
É uma espécie de magnetização feita pelos bons Espíritos, sem
intermediários, directamente no perispírito das pessoas enfermas ou
perturbadas. No passe espiritual o necessitado não recebe fluidos magnéticos
de médiuns, mas outros, mais finos e puros, trazidos dos planos superiores
da Vida, pelo Espírito que veio assisti-lo.
Pelo fato de não estar misturado ao fluido animalizado, o passe espiritual é
bem mais limitado que as outras modalidades de passes. Com isso, pode-se
compreender que os recursos oferecidos nas reuniões públicas de Espiritismo,
onde participam grande quantidade de encarnados e Espíritos desencarnados,
são bem maiores do que aqueles que podemos contar em nossas residências, só
com a ajuda do anjo guardião.
c) Passe misto
É uma modalidade de passe onde se misturam os fluidos do passista com os da
Espiritualidade. A combinação é muito maior do que no passe puramente
magnético e seus efeitos bem mais salutares. Este é o tipo de passe que é
aplicado nos centros espíritas, contando com a ajuda de equipes espirituais
que trabalham nessa área, para ajuda dos necessitados.
Os benfeitores espirituais comparecem no momento do passe, atendendo aos
encarnados e também ministrando eficiente socorro às entidades do plano
espiritual. Eles agem aumentando, dirigindo e qualificando nossos fluidos.
Mas para que se possa contar sempre com a ajuda dos bons Espíritos, é
necessário observar os cuidados já ditos anteriormente sobre a depuração
íntima de cada um dos que estão imbuídos do desejo de fazer o bem.
"...Para curar pela acção fluídica, os fluidos mais depurados são os mais
saudáveis; desde que esses fluidos benéficos são dos Espíritos superiores,
então é o concurso deles que é preciso obter. Por isto a prece e a evocação
são necessárias. Mas para orar e, sobretudo, orar com fervor, é preciso fé.
Para que a prece seja escutada é preciso que seja feita com humildade e
dilatada por um real sentimento de benevolência e de caridade. Ora, não há
verdadeira caridade sem devotamento, nem devotamento sem desinteresse" -
(Allan Kardec - Revista Espírita, Janeiro, 1864).
7.3 - O PASSE NO CENTRO ESPÍRITA
O passe destina-se ao tratamento e profilaxia de enfermidades físicas e
espirituais junto aos necessitados que procuram o centro espírita. A equipe
de passistas deve estar alinhada no mesmo pensamento de ajudar essas pessoas
carentes de amparo.
O serviço de aplicação do passe requer critério, discernimento,
responsabilidade e conhecimento doutrinário. É um complemento aos recursos
de auto melhoramento e de reeducação espiritual utilizados normalmente.
a) A Técnica do Passe Espírita
Há uma certa discussão no meio espírita sobre como deveria ser aplicado o
passe. Alguns defendem a tese de que os passes deveriam ser ministrados
movimentando-se as mãos ao redor do corpo do indivíduo, de modo que as
energias espirituais pudessem melhor atingir seus objectivos de cura.
Outros, acham que o ato de apenas impor as mãos sobre a cabeça de quem vai
receber o passe já é suficiente.
André Luiz nos informa em "Conduta Espírita" que o passe dispensa qualquer
recurso espectacular.
José Herculano Pires, no livro "Mediunidade", diz que o passe é tão simples
que não se pode fazer nada mais do que dá-lo.
Allan Kardec, referindo-se ao assunto na Revista Espírita, número de
Setembro de 1865, diz aos médiuns que: "Apenas sua ignorância lhes faz crer
na influência desta ou daquela forma. Às vezes, mesmo, a isto misturam
práticas evidentemente supersticiosas, às quais se deve emprestar o valor
que merecem".
Oficialmente, a Doutrina Espírita não prescreve uma metodologia para o
passe. Cada grupo é livre para se posicionar de um modo ou de outro, desde
que sem exageros.
A técnica deve ser o mais simples possível, evitando-se fórmulas, exageros e
gesticulação em torno do paciente. Cada grupo deve ter o bom senso de
trabalhar da forma que achar mais conveniente desde que dentro de uma
fundamentação doutrinária lógica.
O que é preciso levar em conta é que nenhuma das duas formas de aplicar o
passe surtirá efeito se o médium não tiver dentro de si a vontade de ajudar
e condições morais salutares para concretizá-lo. Mesmo que se aplique a
melhor metodologia, não se conseguirão bons resultados se o passista for
pessoa de má índole.
b) Quando o Passe deve ser aplicado?
A variação das condições fluídicas perispirituais de qualquer criatura viva
produz desequilíbrios orgânicos e psicológicos, que podem dar origem a
enfermidades. Alterações psicológicas ou traumas orgânicos podem provocar
mudanças fluídicas na camada exterior do perispírito, agravando doenças ou
iniciando estados mórbidos. Daí, a importância da terapia energética dos
passes como tratamento, mas principalmente como profilaxia das enfermidades.
Por isso o passe deve ser aplicado regularmente, desde que seja esclarecido
que o procedimento não é obrigatório, para desvinculá-lo de ritual ou dogma.
A OBSECCÃO
"E quando chegaram para junto da multidão, aproximou-se dele um homem, que
se ajoelhou e disse: Senhor, compadece-te de meu filho, porque é lunático e
sofre muito; pois muitas vezes cai no fogo e outras muitas na água.
Apresentei-o a teus discípulos, mas eles não puderam curá-lo.
Jesus exclamou: Ó geração incrédula e perversa! Até quando estarei convosco?
Até quando vos sofrerei? Trazei-me aqui o menino.
E Jesus repreendeu o demónio, e este saiu do menino; e desde aquela hora,
ficou o menino curado" - (Mateus, cap. 17 - 14 a 18).
8.0 - O QUE É A OBSESSÃO
A obsessão é uma espécie de enfermidade de ordem psíquica e emocional, que
consiste num constrangimento das actividades de um Espírito pela acção de um
outro.
A influência maléfica de um Espírito obsessor pode afectar a vida mental de
uma pessoa, alterando suas emoções e raciocínios, chegando até mesmo a
atingir seu corpo físico. A influência espiritual só é qualificada como
obsessão quando se observa uma perturbação constante. Se a influência
verificada é apenas esporádica, ela não se caracterizará como uma obsessão.
Somente os Espíritos maus e imperfeitos provocam obsessões, interferindo na
vontade do indivíduo, fazendo com que ele tenha acções contrárias ao seu
desejo natural.
A obsessão só se instala na mente do paciente quando o obsessor encontra
fraquezas morais que possam ser exploradas. São pontos fracos que,
naturalmente, todos nós temos, pela imperfeição que nos caracteriza. Deste
modo, conclui-se que todos estamos sujeitos à obsessão.
As doenças do corpo carnal só se manifestam quando existem fragilidades
estruturais ou carências no organismo físico. Na área psíquica acontece
coisa semelhante. Os indivíduos enfraquecidos moralmente, com falhas de
carácter, vícios etc, estarão mais sujeitos à obsessão.
O Espírito obsessor, conhecendo as fraquezas morais do enfermo, vai aos
poucos obtendo acesso à sua área mental, chegando em alguns casos a
dominá-lo. Se a obsessão se intensificar, e não for tratada espiritualmente
em tempo hábil, ocorrerá um aumento de afinidade fluídica entre obsessor e
obsedado, o que poderá acarretar no agravamento da enfermidade.
As obsessões no período de infância são raras. Geralmente, as influências
iniciam-se entre os sete e dez anos de idade, quando a personalidade da
criança começa a desabrochar. Depois desse período já é possível que ocorram
influências obsessivas mais preocupantes.
Alguns adeptos do Espiritismo costumam dizer que todas as pessoas são
obsediadas, mas isso não é verdade. Todos nós recebemos influências
espirituais boas e ruins que, de acordo com nosso livre arbítrio, podem nos
encaminhar para o Bem ou para o Mal.
A obsessão é caracterizada por uma enfermidade com sinais bastante
perceptíveis. Só é obsediado, no real significado da palavra, aquele que
está psicologicamente enfermo por causa de influências espirituais
negativas, ou se fez prisioneiro de pensamentos mórbidos existentes em sua
intimidade.
Abaixo, citaremos alguns ensinamentos de Allan Kardec sobre o assunto,
encontrados na Revista Espírita, ano de 1858, mês de Outubro:
- Os Espíritos não são iguais nem em poder, nem em conhecimento, nem em
sabedoria. Como não passam de almas humanas desembaraçadas de seu invólucro
corporal, ainda apresentam uma variedade maior que a que encontramos entre
os homens na Terra. Há, pois, Espíritos muito superiores, como os há muito
inferiores; muito bons e muito maus, muito sábios e muito ignorantes, há os
levianos, malévolos, mentirosos, astutos, hipócritas, espirituosos,
trocistas etc.
- Estamos incessantemente cercados por uma nuvem de Espíritos que, nem por
serem invisíveis aos nossos olhos materiais, deixam de estar no espaço, em
redor de nós, ao nosso lado, espiando os nossos actos, lendo os nossos
pensamentos, uns para nos fazer o bem, outros para nos fazer o mal, segundo
os Espíritos bons ou maus.
- Pela inferioridade física e moral de nosso globo, na hierarquia dos
mundos, os Espíritos inferiores aqui são mais numerosos que os superiores.
- Entre os que nos cercam, há os que se ligam a nós, que agem mais
particularmente sobre o nosso pensamento, aconselhando-nos, e cujo impulso
seguimos sem nos apercebermos; felizes se escutarmos a voz dos bons.
- Liga-se os Espíritos inferiores àqueles que os ouvem, junto aos quais têm
acesso e aos quais se agarram. Se conseguirem estabelecer domínio sobre
alguém, identificam-se com o seu próprio Espírito, fascinam-no, obsediam-no,
subjugam-no e o conduzem como se fosse uma criança.
- A obsessão jamais se dá senão por Espíritos inferiores. Os bons Espíritos
não produzem nenhum constrangimento; aconselham, combatem a influência dos
maus e se afastam, desde que não sejam ouvidos.
- O grau de constrangimento e a natureza dos efeitos que produz marcam a
diferença entre a obsessão, a subjugação e a fascinação.
- Por sua vontade pode sempre o homem sacudir o jugo dos Espíritos
imperfeitos, porque em virtude de seu livre arbítrio, há escolha entre o bem
e o mal. Se o constrangimento chegou a ponto de paralisar a vontade e se a
fascinação é tão grande que oblitera a razão, então a vontade de uma
terceira pessoa pode substituí-la.
8.1 - CAUSAS DA OBSESSÃO
"Reconcilia-te sem demora com teu adversário, enquanto estás com ele a
caminho, para que não suceda que ele te entregue ao juiz, e que o juiz te
entregue ao seu ministro, e sejas mandado para a cadeia. Em verdade te digo
que não sairás de lá, enquanto não pagares o último ceitil" - (Mateus, cap.
5, 25, 26).
Basicamente, a obsessão tem quatro causas: as morais, as relativas ao
passado, as contaminações e as anímicas.
a) As causas morais
As obsessões de causas morais são aquelas provocadas pela má conduta do
indivíduo na vida quotidiana. Ao andarmos de mal com a vida e com as
pessoas, estaremos sintonizando nossos pensamentos com os Espíritos
inferiores e atraindo-os para perto de nós. Desse intercâmbio de influências
poderá nascer uma obsessão.
Vícios mundanos, como o cigarro, a bebida em excesso, o cultivo do orgulho,
do egoísmo, da maledicência, da violência, da avareza, da sensualidade
doentia e da luxúria poderão ligar-nos a entidades espirituais infelizes
que, mesmo desencarnadas, não se desapegaram dos prazeres materiais. Esses
Espíritos ligam-se aos "vivos" para satisfazerem seus desejos primitivos,
tratando as pessoas como se fossem a extensão de seus interesses no plano
material.
b) As causas relativas ao passado
As obsessões relativas ao passado são aquelas provenientes do processo de
evolução a que todos os Espíritos estão sujeitos. Nas suas experiências
reencarnatórias, por ignorância ou livre arbítrio, uma entidade pode cometer
faltas graves em prejuízo do próximo. Se a desavença entre eles gerar ódio,
o desentendimento poderá perdurar por encarnações a fio, despontando nos
desafectos, brigas, desejos de vingança e perseguição. Casos assim podem dar
origem a processos obsessivos tenazes.
Desencarnados, malfeitor e vítima continuam a alimentar os sentimentos de
rancor de um para com o outro. Se um encarna, o outro pode persegui-lo,
atormentando-o e vice-versa.
c) As contaminações
As contaminações obsessivas geralmente acontecem quando uma pessoa frequenta
ou simplesmente passa por ambientes onde predomina a influência de Espíritos
inferiores. Seitas estranhas, onde o ritualismo e o misticismo se fazem
presentes; terreiros primitivos, onde se pratica a baixa magia; benzedeiras
e mesmo centros espíritas mal orientados são focos onde podem aparecer
contaminações obsessivas. Espíritos atrasados, ligados ao lugar onde a
pessoa frequentou ou visitou, envolvem-se na sua vida mental,
prejudicando-a. Ocorrem também situações em que as irradiações magnéticas
vindas desses ambientes, causam-lhe transtornos fluídicos. A gravidade dos
casos estará na razão directa da sintonia que os Espíritos inferiores
estabelecerem com os pacientes.
d) Causa anímica ou auto-obsessão
As obsessões anímicas são causadas por uma influência mórbida residente na
mente do próprio paciente. Por causa de vícios de comportamento, ele cultiva
de forma doentia pensamentos que causam desequilíbrio em sua área emocional.
Muitas tendências auto-obsessivas são provenientes de experiências infelizes
ligadas às vidas passadas do enfermo. Angústia, depressão, mania de
perseguição ou carências inexplicadas podem fazer parte de processos auto
obsessivos.
O auto obsediado costuma fechar-se em seus pensamentos negativos e não
encontra forças para sair dessa situação constrangedora. Esse posicionamento
mental atrai Espíritos doentios que, sintonizados na mesma faixa psíquica,
agravam sua doença espiritual.
A fluidoterapia, largamente usada nas casas espíritas, pode ser utilizada
como auxiliar no tratamento das auto obsessões. A melhor terapia, no
entanto, é a reeducação através da conscientização dos seus males e
consequente mudança de postura.
8.2 - CARACTERÍSTICAS DA OBSESSÃO
A Obsessão apresenta características que pode situá-la no grau de gravidade
que lhe é própria. Há três graus de gravidade: Obsessão Simples, Fascinação
e Subjugação.
a) Obsessão Simples
É um tipo de influência que, de forma subtil, constrange a pessoa a praticar
actos ou ter pensamentos diferentes do que geralmente possui. O obsedado, às
vezes, nem percebe o que lhe está ocorrendo. Em outras, têm consciência da
influência daninha, mas não consegue se livrar dela. Este tipo de obsessão é
muito comum e pode agravar-se, dependendo da natureza do Espírito atrasado
envolvido e das disposições morais do paciente.
b) Fascinação
Allan Kardec disse, em "O Evangelho Segundo o Espiritismo", que a fascinação
é o pior tipo de obsessão. Trata-se de uma ilusão provocada por um Espírito
hipócrita que domina a mente do paciente, distorcendo seu senso de
realidade. O Espírito obsessor planeja muito bem seu intento destrutivo e
busca envolver o indivíduo em artimanhas mentais bem preparadas.
As portas de entrada para a fascinação, como sempre, são as falhas morais. É
no orgulho de sua vítima que o Espírito hipócrita encontra o alimento para
fascinar-lhe a personalidade.
Para conseguir seu domínio, a entidade maldosa exalta a vaidade do obsedado,
fazendo-o sentir-se infalível e auto confiante. A ilusão é tamanha que o
fascinado adquire uma grandiosa cegueira, o que não lhe permite perceber o
ridículo de certas acções que pratica.
Doutrinas absurdas, ideias contraditórias, teorias impraticáveis podem ser
oriundas da acção de médiuns ostensivos ou não, que estão sob o império da
fascinação. A pessoa fascinada dificilmente aceita sua condição de enferma,
o que dificulta a cura do processo obsessivo. Geralmente se aborrece com as
críticas e com as pessoas que não participam de sua admiração e afasta-se de
quem quer que possa abrir-lhe os olhos.
Do simples e ignorante, ao intelectual e letrado, todos podem ser vítimas da
fascinação.
c) Subjugação
A subjugação pode ser moral ou corpórea. No caso moral, o Espírito obsessor
adquire forte domínio sobre o psiquismo do indivíduo, levando-o a tomar
decisões contrárias ao seu desejo. Na fascinação há uma ilusão. Na
subjugação, o paciente tem consciência do que lhe acontece.
Na subjugação corpórea, além de exercer o domínio psíquico, o obsessor
atinge a parte fluídica perispiritual do doente. Domina seu corpo físico e,
às vezes, numa crise semelhante à epilepsia, atira-o ao chão. Como o
obsedado fica quase sempre sem as energias necessárias para dominar ou
repelir o mau Espírito, carece da intervenção de uma terceira pessoa com
ascendência moral sobre ele, para auxiliá-lo a sair da difícil situação.
8.3 - SITUAÇÕES OBSESSIVAS
As obsessões, de um modo geral, não apresentam gravidade. São fáceis de
serem tratadas pela metodologia espírita. Só em um pequeno número de casos
há factores que facilitam a degeneração do processo, culminando na
fascinação ou subjugação. Em quase todos os processos obsessivos existem
duas partes envolvidas. Só na auto obsessão, o indivíduo atormenta-se a si
mesmo. Assim, podemos ter os seguintes casos de situação obsessiva:
a. De desencarnado para encarnado.
b. De encarnado para desencarnado.
c. De desencarnado para desencarnado.
d. De encarnado para encarnado.
e. Obsessão recíproca
f. Auto obsessão.
8.4 - O TRATAMENTO DA OBSESSÃO
"Quando o Espírito imundo tem saído do homem, anda por lugares secos,
buscando repouso; e, não o achando, diz: Tornarei para minha casa donde saí.
E, chegando, acha-a varrida e adornada.
Então vai, e leva consigo outros sete Espíritos piores do que ele, e,
entrando, habitam ali; e o último estado desse homem é pior do que o
primeiro" - (Lucas, cap. 11, 24 - 26).
A obsessão, como todas as enfermidades, pode ser curada através de
tratamentos especializados. Para se tratar essa enfermidade espiritual, são
necessários alguns procedimentos terapêuticos:
a) Conscientização
Deve-se conscientizar o paciente da situação de enfermo em que se encontra,
para que, com sua força de vontade, possa ajudar-se na cura. Nenhum
tratamento surtirá efeito se não contar com a vontade de quem precisa dele.
b) Reeducação
É preciso orientar o assistido sobre a necessidade de melhoria de sua
conduta na vida diária. Que se esforce para evitar os vícios mais grosseiros
e que procure controlar suas más tendências. Sem essa mudança de postura e
de visão, dificilmente ficará livre das más influências, que predispõem aos
processos obsessivos.
Importante lembrar que os bons exemplos vindos de quem ministra a instrução
é uma das grandes armas na luta contra a obsessão.
c) Evangelização
Enfatizar sempre ao enfermo a necessidade de observar os ensinos morais do
Evangelho de Jesus, roteiro seguro para libertação dos males do Espírito.
Orientar a necessidade da frequência regular à casa espírita, até que sua
enfermidade seja curada ou esteja sob controle. Estimular o hábito da prece,
o mais poderoso auxílio no tratamento de obsedados.
d) Intercâmbio espiritual
Orientar moralmente o Espírito obsessor nas reuniões mediúnicas, evocando-o
em médiuns preparados para esta tarefa, aconselhando-o a seguir outro
caminho que não o da vingança, da mentira ou dos prazeres inferiores. Este
trabalho de esclarecimento deve ser feito por pessoas com experiência e
conhecimento da ciência espírita, a fim de atingir os resultados esperados.
e) Reequilibro familiar
Sempre que possível, a equipe responsável pelo tratamento do enfermo deverá
orientar moralmente sua família que, em muitos casos, está envolvida directa
ou indirectamente na problemática obsessiva. Além disso, o apoio e a
compreensão dos familiares no processo de cura desta grave enfermidade
espiritual é fundamental.
f) Tratamento médico
Nos casos em que o processo obsessivo apresentar-se com grave
comprometimento psíquico, o paciente deverá receber assistência de um
profissional habilitado, que lhe despenderá os cuidados necessários.
É importante enfatizar que não podemos interferir nas prescrições médicas,
tampouco suspender medicamentos por conta própria.
g) Ascendência moral
Para se conseguir bons resultados nas tarefas de desobsessão, é preciso que
a equipe de atendimento tenha ascendência moral sobre o Espírito obsessor e
isso só é possível cultivando uma vida moral sadia. O falar sem
exemplificação transforma-se em letra morta. Jesus expulsava os maus
Espíritos apenas com o uso de sua autoridade moral. Disse que poderíamos
fazer o mesmo.
"Reconhece-se o verdadeiro espírita pela sua transformação moral e pelos
esforços que faz para dominar suas más inclinações" - (Allan Kardec -
Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. XVII, item 4).
CONCLUSÃO
Nestas páginas, você entrou em contacto com os princípios básicos da
Doutrina Espírita. Cada capítulo foi desenvolvido de forma a proporcionar um
fácil entendimento do que na verdade é esse tesouro que foi deixado ao mundo
pelas mãos do mestre Allan Kardec, como instrumento de iluminação do
Espírito.
De posse destes conhecimentos, você poderá adentrar mais facilmente ao
estudo aprofundado da ciência espírita, tendo sempre em mente que jamais
poderemos dizer que já estamos prontos e que tudo sabemos.
Estudar a Doutrina Espírita é aprender sempre. A inesgotável fonte de saber
que encontramos nos escritos de Allan Kardec, nos faz vislumbrar sempre
inúmeras possibilidades de x crescimento, através do esclarecimento, que nos
leva inexoravelmente a melhores situações evolutivas.
Os conceitos aqui absorvidos servirão de base para o início de um amplo e
sério estudo do Espiritismo, por parte daqueles que compreenderam e
assimilaram, neste curto convívio, o verdadeiro valor desta abençoada
Doutrina, lembrando sempre que o aprendizado é infinito.
Por fim, esperamos que este seja apenas o começo de uma bela caminhada em
direcção à Verdade.
Os autores.
Resumo da Doutrina dos Espíritos
"Os seres que se manifestam designam-se a si mesmos, pelo nome de Espíritos
ou Génios, e dizem, alguns pelo menos, que viveram como homens na Terra.
Constituem o mundo espiritual, como nós constituímos, durante a nossa vida,
o mundo corporal’’.
Resumiremos em poucas palavras os pontos principais da doutrina que nos
transmitiram, a fim de mais facilmente responder certas objecções:
"Deus é eterno, imutável, imaterial, único, todo poderoso, soberanamente
justo e bom.
Criou o Universo, que compreende todos os seres animados e inanimados,
materiais e imateriais.
Os seres materiais constituem o mundo visível ou corporal e os seres
imateriais o mundo invisível ou espírita, ou seja, dos Espíritos.
O mundo espírita é o mundo normal, primitivo, eterno, preexistente e
sobrevivente a tudo.
O mundo corporal é secundário; poderia deixar de existir ou nunca ter
existido, sem alterar a essência do mundo espírita.
Os Espíritos revestem temporariamente um invólucro material perecível e sua
destruição pela morte os devolve à liberdade.
Entre as diferentes espécies de seres corporais, Deus escolheu a espécie
humana para a encarnação dos Espíritos que chegaram a um certo grau de
desenvolvimento, o que lhe dá uma superioridade moral e intelectual ante as
demais. A alma é um Espírito encarnado, e o corpo apenas o seu invólucro.
Há no homem três coisas:
1 - O corpo ou ser material, semelhante ao dos animais e animado pelo mesmo
princípio vital;
2 - A alma ou ser imaterial, Espírito encarnado no corpo;
3 - O laço que une a alma ao corpo, princípio intermediário entre a matéria
e o Espírito.
O homem tem assim duas naturezas: o corpo participa da natureza dos animais,
dos quais possui os instintos; pela alma participa da natureza dos
Espíritos. O laço ou perispírito, que une corpo e Espírito, é uma espécie de
invólucro semimaterial. A morte é a destruição do invólucro mais grosseiro.
O Espírito conserva o segundo, que constitui para ele um corpo etéreo,
invisível para nós em seu estado normal, mas que ele pode tornar visível e
mesmo tangível, como se verifica nos fenómenos de aparição.
O Espírito não é, portanto, um ser abstracto, indefinido, que só o
pensamento pode conceber. É um ser real, definido, que em certos casos pode
ser apreendido pelos nossos sentidos da vista, audição e do tacto.
Os Espíritos pertencem a diferentes classes, não sendo iguais nem em poder
nem em inteligência, saber ou moralidade. Os da primeira ordem são os
Espíritos Superiores que se distinguem pela perfeição, pelos conhecimentos e
pela proximidade de Deus, pela pureza dos sentimentos e do amor ao bem: são
os anjos ou Espíritos puros. As demais classes se distanciam mais e mais
desta perfeição. Os das classes inferiores são inclinados às nossas paixões:
o ódio, a inveja, o ciúme, o orgulho, e se comprazem no mal. Nesse número há
os que não são nem muito bons, nem muito maus; antes, perturbadores e
intrigantes do que maus; a malícia e a inconsequência parecem ser suas
características: são os Espíritos estouvados ou levianos.
Os Espíritos não pertencem eternamente à mesma ordem. Todos melhoram,
passando pelos diferentes graus da hierarquia espírita. Esse melhoramento se
verifica pela encarnação, que a uns é imposta como expiação, a outros como
missão.
A vida material é uma prova a que devem submeter-se repetidas vezes até
atingirem a perfeição absoluta; é uma espécie de peneira ou depurador de que
eles saem mais ou menos purificados.
Deixando o corpo, a alma volta ao mundo dos Espíritos, de onde havia saído
para reiniciar uma nova existência material, após um lapso de tempo mais ou
menos longo, durante o qual permanecerá no estado de Espírito errante.
Devendo o Espírito passar por muitas encarnações, conclui-se que todos nós
tivemos muitas existências e que teremos outras, mais ou menos
aperfeiçoadas, seja na Terra ou em outros mundos.
A encarnação dos Espíritos ocorre sempre na espécie humana. Seria um erro
acreditar que a alma ou Espírito pudesse encarnar num corpo de animal.
As diferentes existências corporais do Espírito são sempre progressivas e
jamais retrógradas, mas a rapidez do progresso depende dos esforços que
fazemos para chegar à perfeição.
As qualidades da alma são as do Espírito encarnado. Assim, o homem de bem é
a encarnação de um bom Espírito e o homem perverso é a de um Espírito
impuro.
A alma tinha a sua individualidade antes da encarnação e a conserva após a
separação do corpo.
No seu regresso ao mundo dos Espíritos a alma reencontra todos os que
conheceu na Terra e todas as suas existências anteriores se delineiam na sua
memória, com a recordação de todo o bem e todo o mal que tenha feito.
O Espírito encarnado está sob a influência da matéria. O homem que supera
essa influência, pela elevação e purificação de sua alma, aproxima-se dos
bons Espíritos com os quais estará um dia. Aquele que se deixa dominar pelas
más paixões e põe todas as suas alegrias na satisfação dos apetites
grosseiros, aproxima-se dos Espíritos impuros, dando preponderância à
natureza animal.
Os Espíritos encarnados habitam os diferentes globos do Universo.
Os Espíritos desencarnados ou errantes não ocupam nenhuma região determinada
ou circunscrita; estão por toda parte, no espaço e ao nosso lado, vendo-nos
e acotovelando-nos sem cessar. É toda uma população invisível que se agita
ao nosso redor.
Os Espíritos exercem sobre o mundo moral e mesmo o mundo físico uma acção
incessante. Agem sobre a matéria e sobre o pensamento e constituem uma das
forças da Natureza, causa eficiente de uma multidão de fenómenos até agora
inexplicados ou mal explicados, que não encontram solução racional.
As relações dos Espíritos com os homens são constantes. Os bons Espíritos
nos convidam ao bem, nos sustentam nas provas da vida e nos ajudam a
suportá-las com coragem e resignação; os maus nos convidam ao mal: é para
eles um prazer ver-nos sucumbir e cair no seu estado.
As comunicações ocultas verificam-se pela influência boa ou má que elas
exercem sobre nós sem o sabermos, cabendo ao nosso julgamento discernir as
más e boas inspirações. As comunicações ostensivas realizam-se por meio da
escrita, da palavra ou de outras manifestações materiais, na maioria das
vezes através dos médiuns que lhes servem de instrumentos.
Os Espíritos se manifestam espontaneamente ou pela evocação. Podemos evocar
todos os Espíritos: os que animaram homens obscuros e os dos personagens
mais ilustres, qualquer que seja a época que tenham vivido; os de nossos
parentes, de nossos amigos ou inimigos e deles obter por comunicações
escritas ou verbais, conselhos, informações sobre a situação em que se acham
no espaço, seus pensamentos a nosso respeito, assim como as revelações que
lhes sejam permitidas fazer-nos.
Os Espíritos são atraídos, na razão de sua simpatia, pela natureza moral do
meio que os evoca. Os Espíritos superiores gostam das reuniões sérias, em
que predominem o amor do bem e o desejo sincero de instrução e de melhoria.
Sua presença afasta os Espíritos inferiores que encontram, ao contrário,
livre acesso e podem agir com inteira liberdade entre as pessoas frívolas ou
guiadas apenas pela curiosidade e por toda parte onde encontre maus
instintos. Longe de obtermos bons conselhos e informações úteis desses
Espíritos, nada mais devemos esperar do que futilidades, mentiras,
brincadeiras de mau gosto ou mistificações, pois frequentemente se servem de
nomes veneráveis para melhor nos induzir ao erro.
Distinguir os bons e os maus Espíritos é extremamente fácil. A linguagem dos
Espíritos superiores é constantemente digna, nobre, cheia da mais alta
moralidade, livre de qualquer paixão inferior, seus conselhos revelam a mais
pura sabedoria e têm sempre por alvo o nosso progresso e o bem da
humanidade. A dos Espíritos inferiores, ao contrário, é inconsequente, quase
banal e mesmo grosseira; se dizem às vezes coisas boas e verdadeiras, dizem
com mais frequência falsidades e absurdos, por malícia ou por ignorância;
zombam da credulidade e divertem-se à custa dos que os interrogam,
lisonjeando-lhes a vaidade e embalando-lhes os desejos de falsas esperanças.
Em resumo, as comunicações sérias, na perfeita acepção do termo, não se
verificam senão nos centros sérios, cujos membros estão unidos por uma
íntima comunhão de pensamentos dirigidos para o bem.
A moral dos Espíritos superiores se resume, como a do Cristo, nesta máxima
evangélica: "Fazer aos outros o que desejamos que os outros nos façam", ou
seja, fazer o bem e não o mal. O homem encontra nesse princípio a regra
universal de conduta, mesmo para as menores acções.
Eles nos ensinam que o egoísmo, o orgulho, a sensualidade são paixões que
nos aproximam da natureza animal, prendendo-nos à matéria: que o homem que,
desde este mundo, se liberta da matéria pelo desprezo das futilidades
mundanas e o cultivo do amor ao próximo, aproxima-se da natureza espiritual;
e cada um de nós deve tornar-se útil segundo as faculdades e os meios que
Deus nos colocou nas mãos para nos provar; que o forte e o poderoso devem
apoio ao fraco, porque aquele que abusa da sua força e do seu poder para
oprimir o seu semelhante viola a lei de Deus. Eles ensinam, enfim, que no
mundo dos Espíritos nada pode estar escondido: o hipócrita será desmascarado
e todas as suas torpezas reveladas; a presença inevitável e incessante
daqueles que prejudicamos é um dos castigos que nos estão reservados; ao
estado de inferioridade e de superioridade dos Espíritos correspondem penas
e alegrias que nos são desconhecidas na Terra.
Mas eles nos ensinam também que não há faltas irremissíveis, que não possam
ser apagadas pela expiação.
O homem encontra o meio necessário nas diferentes existências, que lhe
permite avançar, segundo o seu desejo e os seus esforços, na vida do
progresso, em direcção à perfeição que é o seu objectivo final" - (Allan
Kardec, em O Livro dos Espíritos, na Introdução ao Estudo da Doutrina
Espírita, item VI).
Nota sobre a vida e morte de Allan Kardec
"É sob o golpe da dor profunda causada pela partida prematura do venerável
fundador da Doutrina Espírita que iniciamos uma tarefa, simples e fácil para
as suas mãos sábias e experimentadas, mas cujo peso e gravidade nos
acabrunhariam, se não contássemos com o concurso eficaz dos bons Espíritos e
com a indulgência dos nossos leitores.
Quem, entre nós, poderia, sem ser tachado de presunçoso, gabar-se de possuir
o espírito de método e de organização com que se iluminam todos os trabalhos
do mestre? Só a sua poderosa inteligência poderia concentrar tantos
materiais diversos, triturá-los, transformá-los, para a seguir os espalhar
como um orvalho benfazejo sobre as almas desejosas de conhecer e de amar!
Incisivo, conciso, profundo, ele sabia agradar e fazer-se compreender, numa
linguagem ao mesmo tempo simples e elevada, tão afastada do estilo familiar
quanto das obscuridades da Metafísica.
Multiplicando-se incessantemente, até aqui ele havia atendido a tudo.
Entretanto, o diário crescimento de suas relações e o incessante
desenvolvimento do Espiritismo o fizeram sentir a necessidade de contar com
alguns auxiliares inteligentes, e ele preparava, simultaneamente, a
organização nova da Doutrina e de seus trabalhos, quando nos deixou para ir
a um mundo melhor, colher o prémio da missão cumprida e reunir os elementos
para uma nova obra de devotamento e de sacrifício.
Ele era só!... Nós nos chamaremos legião, e, por mais fracos e inexperientes
que sejamos, temos a íntima convicção de que nos manteremos à altura da
situação se, partindo dos princípios estabelecidos e de uma evidência
incontestável, nos dedicarmos a executar, tanto quanto nos seja possível e
conforme as necessidades do momento, os projectos futuros que o próprio Sr.
Allan Kardec se propunha a realizar.
Enquanto seguirmos a sua via e todas as boas vontades se unirem num esforço
comum, para o progresso e a regeneração intelectual e moral da Humanidade, o
Espírito do grande filósofo estará connosco e nos ajudará com sua poderosa
influência. Possa ele suprir a nossa insuficiência e possamos tornar-nos
dignos de seu concurso, consagrando-nos à obra com o mesmo devotamento e
sinceridade, se não com tanta ciência e inteligência!
Em sua bandeira ele havia inscrito estas palavras: trabalho, solidariedade,
tolerância. Como ele, sejamos infatigáveis; conforme seus desejos, sejamos
tolerantes e solidários e não temamos seguir o seu exemplo, pondo vinte
vezes sobre a mesa os princípios ainda em discussão. Apelamos ao concurso e
às luzes de todos. Tentaremos avançar com mais certeza do que velocidade e
nossos esforços não serão infrutíferos se, como estamos persuadidos - e de
que seremos os primeiros a dar exemplo - cada um tratar de cumprir o seu
dever, pondo de lado qualquer questão pessoal, a fim de contribuir para o
bem geral.
Não poderíamos entrar sob melhores auspícios na nova fase que se abre para o
Espiritismo, do que dando a conhecer aos nossos leitores, em rápido esboço,
o que foi toda a sua vida, o homem íntegro e honrado, o sábio inteligente e
fecundo, cuja memória se transmitirá aos séculos futuros, cercada da auréola
dos benfeitores da Humanidade.
Nascido em Lyon, a 3 de outubro de 1804, de uma antiga família que se
distinguia na magistratura e na tribuna jurídica, o Sr. Allan Kardec (Léon
Hippolithe Denizart Rivail) não seguiu esta carreira. Desde a primeira
juventude sentia-se atraído para o estudo das Ciências e da Filosofia.
Educado na Escola de Pestalozzi, em Iverdun, Suíça, tornou-se um dos mais
eminentes discípulos do célebre professor e um dos propagadores zelosos de
seu sistema de educação, que exerceu uma grande influência sobre a reforma
dos estudos na Alemanha e na França.
Dotado de uma inteligência notável e atraído para o ensino por seu carácter
e suas aptidões especiais, desde a idade de quatorze anos ensinava o que
sabia aos seus discípulos que tinham aprendido menos que ele. Nesta escola
se desenvolveram as ideias que, mais tarde, deveriam colocá-lo na classe dos
homens avançados e dos livre pensadores.
Nascido na religião católica, mas educado em país protestante, os actos de
intolerância que a propósito teve de sofrer, desde cedo o fizeram conceber a
ideia de uma reforma religiosa, na qual trabalhou em silêncio durante longos
anos, com o pensamento de chegar a uma unificação de crenças; mas lhe
faltava o elemento indispensável à solução deste grande problema.
Mais tarde o Espiritismo lhe veio fornecer esse elemento e imprimir uma
direcção especial aos seus trabalhos.
Terminados os estudos, voltou para a França. Dominando a fundo a língua
alemã, traduziu para a Alemanha diversas obras de educação e de moral e, o
que é característico, as obras de Fénelon, que o haviam seduzido
particularmente.
Era membro de várias sociedades científicas, entre outras, da Academia Real
de Arras que, em seu concurso de 1831, o laureou por uma memória notável
sobre esta questão: "Qual o sistema de estudos mais em harmonia com as
necessidades da época?"
De 1835 a 1840, em seu domicílio, à rua de Sèvres, fundou cursos gratuitos
de Química, Física, Anatomia comparada, Astronomia etc; empreendimento digno
de elogios em todos os tempos, mas sobretudo numa época em que um
pequeníssimo número de inteligências se aventurava a entrar por esse
caminho.
Constantemente preocupado em tornar atraentes e interessantes os sistemas de
educação, inventou, ao mesmo tempo, um método engenhoso para ensinar a
contar e um quadro mnemónico da História da França, tendo por objectivo
fixar na memória as datas dos acontecimentos notáveis e das grandes
descobertas que ilustraram cada reinado.
Entre as suas numerosas obras de educação, citaremos as seguintes: Plano
proposto para o melhoramento da instrução pública (1828); Curso prático e
teórico de Aritmética, segundo o método de Pestalozzi, para uso dos
professores e mães de família (1829); Gramática Francesa Clássica (1831);
Manual dos exames para o título de capacidade; Soluções raciocinadas das
questões e problemas de Aritmética e de Geometria (1846); Catecismo
gramatical da Língua Francesa (1848); Programa dos cursos de Química,
Física, Astronomia, Fisiologia, que professava no Liceu Polimático; Ditados
normais dos exames da Prefeitura e da Sorbonne, acompanhados de Ditados
especiais sobre as dificuldades ortográficas (1849), obra muito estimada na
época de seu aparecimento e da qual ainda recentemente ele tirava novas
edições.
Antes que o Espiritismo viesse popularizar o pseudónimo Allan Kardec, tinha
ele, como se vê, sabido ilustrar-se por trabalhos de natureza completamente
diversa, mas tendo como objectivo esclarecer as massas e ligá-las cada vez
mais à família e ao país.
Em 1850, desde que se tratou das manifestações dos Espíritos, o Sr. Allan
Kardec entregou-se a observações perseverantes sobre esses fenómenos e
empenhou-se principalmente em lhes deduzir as consequências filosóficas.
Entreviu desde logo o princípio de novas leis naturais: as que regem as
relações entre o mundo visível e o mundo invisível; reconheceu na acção
deste último uma das forças da Natureza, cujo conhecimento deveria lançar
luz sobre uma porção de problemas reputados insolúveis, e compreendeu o seu
alcance do ponto de vista religioso.
Suas principais obras sobre esta matéria são: O Livro dos Espíritos, para a
parte filosófica, e cuja primeira edição apareceu a 18 de abril de 1857; O
Livro dos Médiuns, para a parte experimental e científica (janeiro de 1861);
O Evangelho Segundo o Espiritismo, para a parte moral (abril de 1864); O Céu
e o Inferno, ou a justiça de Deus segundo o Espiritismo (agosto de 1865); A
Gênese, Os Milagres e as Predições (janeiro de 1868); a Revista Espírita,
jornal de estudos psicológicos, colecção mensal começada a 1º de janeiro de
1858.
Fundou em Paris, a 1º de abril de 1858, a primeira Sociedade Espírita
regularmente constituída, sob o nome de Sociedade Parisiense de Estudos
Espíritas, cujo fim exclusivo é o estudo de tudo o que possa contribuir para
o progresso desta nova Ciência. A justo título o Sr. Allan Kardec se defende
de haver algo escrito sob a influência de ideias preconcebidas ou
sistemáticas: homem de um carácter frio e calmo, observou os fatos e de suas
observações deduziu as leis que os regem; foi o primeiro a elaborar a sua
teoria e a dispô-los num corpo metódico e regular.
Demonstrando que os fatos falsamente qualificados de sobrenaturais estão
submetidos a leis, fá-los entrar na ordem dos fenómenos da Natureza e assim
destrói o último refúgio do maravilhoso, um dos elementos da superstição.
Durante os primeiros anos em que se cogitava dos fenómenos espíritas, essas
manifestações eram antes objecto de curiosidade do que assunto para sérias
meditações. O Livro dos Espíritos colocou o assunto sob um aspecto
completamente novo. Abandonaram-se então as mesas girantes, que apenas
haviam sido um prelúdio, voltando-se o interesse para um corpo de doutrina
que abarcava todas as questões ligadas à Humanidade. Do aparecimento de O
Livro dos Espíritos data a verdadeira fundação do Espiritismo, que até então
se constituía apenas de elementos esparsos, sem coordenação, e cujo alcance
não havia sido compreendido suficientemente; também a partir desse momento a
doutrina chamou a atenção de homens sérios e tomou rápido desenvolvimento.
Em poucos anos essas ideias encontraram numerosos aderentes em todas as
camadas da sociedade e em todos os países. Este sucesso sem precedentes se
deve sem dúvida às simpatias que essas ideias encontraram, mas é devido em
grande parte à clareza, que é uma das características distintivas dos
escritos de Allan Kardec.
Abstendo-se das fórmulas abstractas da Metafísica, o autor soube fazer-se
ler sem fadiga, condição essencial para a vulgarização de uma ideia. Sobre
todos os pontos da controvérsia, sua argumentação, de uma lógica cerrada,
oferece pouca margem à refutação e predispõe à convicção. As provas
materiais que o Espiritismo oferece da existência da alma e da vida futura
tendem à destruição das ideias materialistas e panteístas. Um dos mais
fecundos princípios desta doutrina, que decorre do precedente, é o da
pluralidade das existências, já entrevisto por uma porção de filósofos
antigos e modernos e, nestes últimos tempos, por Jean Reynaud, Charles
Fourier, Eugéne Sue e outros, mas permanecendo apenas em estado de hipótese
e de sistema, ao passo que o Espiritismo demonstra a sua realidade e prova
que é um dos atributos essenciais da Humanidade. Deste princípio decorre a
solução de todas as anomalias aparentes da vida humana, de todas as
desigualdades intelectuais, morais e sociais. Assim, o homem sabe de onde
vem, para onde vai, para o que está na Terra e porque sofre.
As ideias inatas se explicam pelos conhecimentos adquiridos em vidas
anteriores; a marcha dos povos e da Humanidade, pela volta dos homens dos
tempos passados, que revivem depois de haverem progredido; as simpatias e as
antipatias, pela natureza das relações anteriores; essas relações, que ligam
a grande família humana de todas as épocas, oferecem as próprias leis da
Natureza, e não mais uma teoria, como base dos grandes princípios de
fraternidade, de igualdade, de liberdade e de solidariedade universal.
Em vez do princípio: "fora da Igreja não há salvação", que alimenta a
divisão e a animosidade entre as diversas seitas, e que tem feito correr
tanto sangue, o Espiritismo tem por máxima: "fora da caridade não há
salvação", isto é, a igualdade entre os homens perante Deus, a tolerância, a
liberdade de consciência e a mútua benevolência.
Em vez da fé cega, que aniquila a liberdade de pensar, diz ele: "Não há fé
inabalável senão aquela que pode olhar a razão face a face em todas as
épocas da Humanidade. A fé necessita de uma base e esta base é a
inteligência perfeita daquilo que se deve crer; para crer não basta ver, é
necessário sobretudo compreender. A fé cega não é mais deste século; ora, é
precisamente o dogma da fé cega que hoje faz o maior número de incrédulos,
porque ela quer impor-se e exige a abdicação de uma das mais preciosas
faculdades do homem: o raciocínio e o livre arbítrio". (O Evangelho Segundo
o Espiritismo).
Trabalhador infatigável, sempre o primeiro e o último a postos, Allan Kardec
sucumbiu a 31 de março de 1869, em meio aos preparativos de mudança de
local, exigida pela extensão considerável de suas múltiplas ocupações.
Numerosas obras em via de conclusão, ou que aguardavam o tempo oportuno para
aparecerem, virão um dia provar, ainda mais, a extensão e o poder de suas
concepções.
Morreu como viveu: trabalhando. Há longos anos sofria de uma moléstia do
coração, que só podia ser combatida pelo repouso intelectual e alguma
actividade material. Mas, inteiramente dedicado ao seu trabalho, recusava-se
a tudo quanto pudesse tomar-lhe o tempo, em prejuízo de suas ocupações
predilectas. Nele, como em todas as almas fortemente temperadas, a lâmina
gastou a bainha.
O corpo tornava-se pesado e se recusava a servi-lo, mas o espírito, mais
vivo, mais enérgico, mais fecundo, alargava cada vez mais o seu círculo de
actividades.
Numa luta desigual, a matéria não podia resistir eternamente. Um dia foi
vencida: o aneurisma rompeu-se e Allan Kardec caiu fulminado. Um homem
deixava a Terra, mas um grande nome tomava lugar entre as ilustrações deste
século, um grande Espírito ia retemperar-se no infinito, onde todos os que
ele havia consolado e esclarecido impacientemente esperavam a sua chegada.
"A morte", dizia ele ainda recentemente, "a morte fere em golpes redobrados
nas camadas ilustres!... A quem virá ela agora libertar?"
Ele foi, após tantos outros, retemperar-se no Espaço, buscar novos elementos
para renovar o seu organismo gasto por uma vida de labores incessantes.
Partiu com aqueles que serão os faróis da nova geração, para voltar em breve
com eles a fim de continuar e concluir a obra deixada entre mãos devotadas.
O homem não existe mais; a alma, porém, ficará entre nós. É um protector
seguro, uma luz a mais, um trabalhador infatigável que aumentou as Falanges
do Espaço. Como na Terra, sem ferir a ninguém, a cada um saberá fazer ouvir
os conselhos convenientes; dosará o zelo prematuro dos ardentes, ajudará os
sinceros e os desinteressados e estimulará os mornos. Hoje ele vê e sabe
tudo quanto previa ainda há pouco! Não mais está sujeito às incertezas, nem
aos desfalecimentos. E nos fará partilhar da sua convicção, obrigando-nos a
tocar a verdade com o dedo, indicando-nos o caminho, naquela linguagem
clara, precisa, que o fez um padrão nos anais literários.
O homem não existe mais - repetimo-lo. Mas Allan Kardec é imortal e sua
lembrança, seus trabalhos, seu Espírito estarão sempre com os que
sustentarem, alto e firme, a bandeira que ele sempre soube fazer respeitar.
Uma individualidade poderosa construiu a obra; era o guia e a luz de todos.
Na Terra, a obra tomará o lugar do indivíduo. Não nos uniremos em torno de
Allan Kardec; estaremos unidos em torno do Espiritismo, tal qual ele o
constituiu, e, por seus conselhos, sob sua influência, avançaremos a passos
certos para as fases prometidas à Humanidade regenerada - (Transcrito da
Revista Espírita, Maio, 1869).
A Codificação Espírita
O LIVRO DOS ESPÍRITOS (1857)
Com este livro, a 18 de Abril de 1857, raiou para o mundo a era espírita.
Nele se cumpria a promessa evangélica do Consolador, do Paracleto ou
Espírito de Verdade. Dizer isso equivale a afirmar que "O Livro dos
Espíritos" é o código de uma nova fase da evolução humana. E é exactamente
essa a sua posição na história do pensamento. Este não é um livro comum, que
se pode ler de um dia para o outro e depois esquecer num canto da estante.
Nosso dever é estudá-lo e meditá-lo, lendo-o e relendo-o constantemente.
Sobre este livro se ergue todo um edifício: o da doutrina espírita. Ela é a
pedra fundamental do Espiritismo, o seu marco inicial. O Espiritismo surgiu
com ele e com ele se propagou, com ele se impôs e consolidou no mundo. Antes
deste livro não havia Espiritismo e nem mesmo esta palavra existia.
Falava-se em Espiritualismo e Neo Espiritualismo, de maneira geral, vaga e
nebulosa. Os fatos espíritas, que sempre existiram, eram interpretados das
mais diversas maneiras. Mas, depois que Kardec o lançou à publicidade,
"contendo os princípios da doutrina espírita", uma nova luz brilhou nos
horizontes mentais do mundo.
Há uma sequência histórica que não podemos esquecer ao tomar este livro nas
mãos. Quando o mundo se preparava para sair do caos das civilizações
primitivas, apareceu Moisés, como o condutor de um povo destinado a traçar
as linhas de um novo mundo e de suas mãos surgiu a Bíblia. Não foi Moisés
quem a escreveu, mas foi ele o motivo central dessa primeira codificação do
novo ciclo de revelações: o cristão. Mais tarde, quando a influência bíblica
já havia modelado um povo, e quando este povo já se dispersava por todo o
mundo gentio, espalhando a nova lei, apareceu Jesus: e das suas palavras,
recolhidas pelos discípulos, surgiu o Evangelho.
A Bíblia é a codificação da primeira revelação cristã, o código hebraico em
que se fundiram os princípios sagrados e as grandes lendas religiosas dos
povos antigos. A grande síntese dos esforços da antiguidade em direcção ao
espírito. Não é de admirar que se apresente muitas vezes assustadora e
contraditória, para o homem moderno. O Evangelho é a codificação da segunda
revelação cristã, a que brilha no centro da tríade dessas revelações, tendo
na figura do Cristo o sol que ilumina as duas outras, que lança a sua luz
sobre o passado e o futuro, estabelecendo entre ambos a conexão necessária.
Mas assim como, na Bíblia, já se anunciava o Evangelho, também neste
aparecia a predição de um novo código, o do Espírito de Verdade, como se vê
em João, XIV. E o novo código surgiu pelas mãos de Allan Kardec, sob a
orientação do Espírito de Verdade, no momento exacto em que o mundo se
preparava para entrar numa fase superior do seu desenvolvimento.
Hegel, em suas lições de estética, mostra-nos as criações monstruosas da
arte oriental, - figuras gigantescas, de duas cabeças e muitos braços e
pernas, e outras formas diversas, - como a primeira tentativa do Belo para
dominar a matéria e conseguir exprimir-se através dela. A matéria grosseira
resiste à força do ideal, desfigurando-o nas suas representações. Mas acaba
sendo dominada, e então aparecem no mundo as formas equilibradas e
harmoniosas da arte clássica. Atingido, porém, o máximo de equilíbrio
possível, o Belo mesmo rompe esse equilíbrio, nas formas românticas e
modernas da arte, procurando superar o seu instrumento material, para melhor
e mais livremente se exprimir. Essa grandiosa teoria hegeliana nos parece
perfeitamente aplicável ao processo das revelações cristãs: das formas
incongruentes a aterradoras da Bíblia, passamos ao equilíbrio clássico do
Evangelho e, deste, à libertação espiritual de "O Livro dos Espíritos".
Cada fase da evolução humana se encerra com uma síntese conceptual de todas
as suas realizações. A Bíblia é a síntese da antiguidade, como o Evangelho é
a síntese do mundo greco-romano-judaico, e "O Livro dos Espíritos" a do
mundo moderno. Mas cada síntese não traz em si tão somente os resultados da
evolução realizada, porque encerra também os germes do futuro. E na síntese
evangélica temos de considerar, sobretudo, a presença do Messias, como uma
intervenção directa do Alto para a reorientação do pensamento terreno. É
graças a essa intervenção que os princípios evangélicos passam directamente,
sem necessidade de readaptações ou modificações, em sua pureza primitiva,
para as páginas deste livro, como as vigas mestras da edificação da nova era
- (José Herculano Pires, na introdução de O Livro dos Espíritos, edições
Lake).
O LIVRO DOS MÉDIUNS (1861)
Assim como O Livro dos Espíritos teve uma edição inicial de contacto,
ampliada definitivamente na segunda edição, também O Livro dos Médiuns foi
precedido de um pequeno volume intitulado Instruções Práticas Sobre as
Manifestações Espíritas. Publicado em 1858 esse pequeno volume foi
substituído, em janeiro de 1861, pela primeira edição de O Livro dos
Médiuns. A presente tradução foi feita da segunda edição, lançada por Didier
& Cia. em 1862, sob revisão pessoal de Kardec: "com o concurso dos Espíritos
e acrescida de grande número de novas instruções", como se lê no original
francês. Foi essa a edição definitiva.
Com a preparação deste livro, Kardec considerou o Instruções Práticas
superado. Seu desejo era que os espíritas estudassem mais a fundo o problema
mediúnico, não ficando apenas nas informações iniciais daquele pequeno
volume. Entretanto, 65 anos mais tarde, em 1923, Jean Meyer, que então
presidia a Casa dos Espíritas, em Paris, achou conveniente lançar nova
edição do Instruções Práticas. Essa edição despertou, no Brasil, o interesse
de Cairbar Schutel, que depois dos necessários entendimentos com Meyer
lançou entre nós, pela sua modesta e heróica editora de Matão, Estado de São
Paulo, a primeira tradução brasileira da obra. Nova edição foi lançada em
1968 pela Casa Editora O Clarim, a mesma de Schutel, como parte das
comemorações do primeiro centenário do nascimento de seu fundador.
Instruções Práticas se impôs novamente ao meio espírita como um livro
necessário, em virtude do seu carácter de síntese.
Apresentado por Kardec como continuação de O Livro dos Espíritos, este livro
foi também considerado por ele como em grande parte obra deles, o que se
pode verificar na Introdução. Os Espíritos o reviram, modificaram,
acrescentando-lhe um número muito grande de observações e instruções do mais
alto interesse. É o segundo volume da Codificação do Espiritismo e, como
assinala Kardec, desenvolve a parte prática da doutrina. Por isso mesmo é o
livro básico da Ciência Espírita, um tratado de mediunidade indispensável a
todos os que se interessam pela boa realização de trabalhos mediúnicos e
pelo desenvolvimento das pesquisas espíritas.
A tese fundamental deste livro é a existência do perispírito ou corpo
energético dos Espíritos, elemento de ligação do espírito ao corpo material.
Essa ligação, de tipo energético ou vibratório, é o princípio da mediunidade.
Assim como o nosso espírito anima o nosso corpo através do perispírito,
constituído em vida o que chamamos alma, os demais Espíritos, de mortos ou
de vivos, podem influenciá-lo. Em sintonia com o nosso espírito podem mesmo
utilizar-se de nosso corpo para as suas manifestações. Dessa maneira, a
mediunidade é uma condição natural do homem, uma faculdade geral da espécie
humana, que se revela em dois campos paralelos de fenómenos: os anímicos,
decorrentes das actividades do nosso próprio espírito fora do
condicionamento orgânico; e os espíritas, decorrentes das relações naturais
do nosso espírito com outros Espíritos - (José Herculano Pires, na
introdução de O Livro dos Médiuns, edições Lake).
O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO (1864)
Este livro foi publicado, inicialmente, com o título de Imitação do
Evangelho. Kardec explica o seguinte: "Mais tarde, por força das observações
reiteradas do Sr. Didier e de outras pessoas, mudei-o para Evangelho Segundo
o Espiritismo". Trata-se do desenvolvimento dos tópicos religiosos de O
Livro dos Espíritos, e representa um manual de aplicação moral do
Espiritismo.
A 9 de agosto de 1863, Kardec recebeu uma comunicação dos seus Guias, sobre
a elaboração deste livro. A comunicação assinalava o seguinte: "Esse livro
de doutrina terá influência considerável, porque explana questões de
interesse capital... Não somente o mundo religioso encontrará nele as
máximas de que necessita, como as nações em sua vida prática, dele haurirão
instruções excelentes. Fizeste bem ao enfrentar as questões de elevada moral
prática, do ponto de vista dos interesses gerais, dos interesses sociais e
dos interesses religiosos".
Em comunicação posterior, a 14 de setembro de 1863, declaravam os Guias de
Kardec: "Nossa acção, principalmente a do Espírito de Verdade, é constante
ao teu redor, e de tal maneira, que não a podes negar. Assim, não entrarei
em detalhes desnecessários sobre o plano da tua obra que, segundo os meus
conselhos ocultos, modificaste tão ampla e completamente. E logo adiante
acentuavam: "Com esta obra, o edifício começa a libertar-se dos andaimes e
já podemos ver-lhe a cúpula a desenhar-se no horizonte".
Estas comunicações, cuja leitura completa pode ser feita em Obras Póstumas,
revelam-nos a importância fundamental de O Evangelho Segundo o Espiritismo
na Codificação Kardequiana. Enquanto O Livro dos Espíritos nos apresenta a
filosofia Espírita em sua inteireza e O Livro do Médiuns a Ciência Espírita
em seu desenvolvimento, este livro nos oferece a base e o roteiro da
Religião Espírita.
Livro de cabeceira, de leitura diária obrigatória, de leitura preparatória
de reuniões doutrinárias, deve ser encarado também como livro de estudo,
para melhor compreensão da Doutrina. A comunicação do Espírito de Verdade,
colocada como prefácio, deve ser lida atentamente pelos estudiosos, pois
cada uma de suas frases tem um sentido mais profundo do que parece à
primeira leitura.
A Introdução e o Capítulo I constituem verdadeiro estudo sobre a natureza, o
sentido e a finalidade do Espiritismo. Devem ser estudados atenciosamente, e
não apenas lidos. Formam uma peça de grande valor para a verdadeira
compreensão de Doutrina - (José Herculano Pires, na introdução de O
Evangelho Segundo o Espiritismo, edições Lake).
O CÉU E O INFERNO (1865)
Lendo-se este livro com atenção vê-se que a sua estrutura corresponde a um
verdadeiro processo de julgamento. Na primeira parte temos a exposição dos
fatos que o motivaram e a apreciação judiciosa, sempre serena, dos seus
vários aspectos, com a devida acentuação dos casos de infracção da lei. Na
segunda parte o depoimento das testemunhas. Cada uma delas caracteriza-se
por sua posição no contexto processual. E diante dos confrontos necessários
o juiz pronuncia a sua sentença definitiva, ao mesmo tempo enérgica e tocada
de misericórdia. Estamos ante um tribunal divino. Os homens e suas
instituições são acusados e pagam pelo que devem, mas agravantes e
atenuantes são levados em consideração à luz de um critério superior.
A 30 de Setembro de 1863, como se pode ver em Obras Póstumas, Kardec recebeu
dos Espíritos Superiores este aviso: "Chegou a hora de a Igreja prestar
contas do depósito que lhe foi confiado, da maneira como praticou os
ensinamentos do Cristo, do uso que fez de sua autoridade, enfim, do estado
de incredulidade a que conduziu os espíritos". Esse julgamento começava com
a preliminar constituída pelo Evangelho Segundo o Espiritismo e devia
continuar com O Céu e o Inferno. Dentro de dois anos, em seu número de
Setembro de 1865, a Revista Espírita publicaria em sua secção bibliográfica
a notícia do lançamento do quarto livro de Codificação Espírita: O Céu e o
Inferno. Faltava apenas A Gênese para completar a obra da Codificação da III
Revelação.
Dois capítulos de O Céu e o Inferno foram publicados antecipadamente na
Revista: o capítulo intitulado Da apreensão da morte, vigorosa peça de
acusação, no número de Janeiro de 1865, e o capítulo Onde é o Céu, no número
de Março do mesmo ano. Apareceram ambos como se fossem simples artigos para
a Revista, mas o último trazia uma nota final anunciando que ambos
pertenciam a uma "nova obra que o Sr. Allan Kardec publicará proximamente".
Em Setembro a obra já aparece anunciada como à venda. Kardec declara que,
não podendo elogiá-la nem criticá-la, a Revista se limitava a publicar um
resumo do seu prefácio, revelando o seu conteúdo. Os capítulos
antecipadamente publicados aparecem, o primeiro com o mesmo título com que
saíra e o segundo com o título reduzido para O Céu.
Estava dado o golpe de misericórdia nos dogmas fundamentais da teologia do
cristianismo formalista, tipo inegável de secretismo religioso com que o
Cristianismo verdadeiro, essencial e não formal conseguira penetrar na massa
impura do mundo e levedá-la à custa de enormes sacrifícios. Kardec reafirma
o carácter científico do Espiritismo. Como ciência de observação a nova
doutrina enfrenta o problema das penas e recompensas futuras à luz da
História, estabelecendo comparações entre as idealizações do céu e do
inferno nas religiões anteriores e nas religiões cristãs, revelando as
raízes históricas, antropológicas, sociológicas e psicológicas dessas
idealizações na formulação dos dogmas cristãos.
A comparação do inferno pagão com o inferno cristão é um dos mais eficazes
trabalhos de mitologia comparada que se conhece. A mitologia cristã se
revela mais grosseira e cruel que a pagã. Bastaria isso para justificar o
Renascimento. O mergulho da humanidade no sorvedouro medieval levou a
natureza humana a um retrocesso histórico só comparável ao do nazi fascismo
em nosso tempo. Os intelectuais materialistas assustaram-se com o retrocesso
do homem nos anos 40 do nosso século e puseram em dúvida a teoria da
evolução. Se houvessem lido este livro de Kardec, saberiam que a evolução
não se processa em linha recta; mas em ascensão espiralada.
Vemos assim que este livro de Kardec tem muito para ensinar, não só aos
espíritas, mas também aos luminares da inteligência néo pagã que perdem o
seu tempo combatendo e Espiritismo, como gregos e romanos combateram
inutilmente o Cristianismo. O processo espírita se desenvolve na linha de
sequência do processo cristão. A conversão do mundo ainda não se completou.
Cabe ao Espiritismo dar-lhe a última demão, como desenvolvimento natural,
histórico e profético do Cristianismo em nosso tempo.
A leitura e o estudo sistemático deste livro se impõem a espíritas e não
espíritas, a todos os que realmente desejam compreender o sentido da vida
humana na Terra.
Mesmo entre os espíritas este livro é quase desconhecido. A maioria dos que
o conhecem nunca se inteirou do seu verdadeiro significado. Kardec nos dá
nas suas páginas o balanço da evolução moral e espiritual da humanidade
terrena até os nossos dias. Mas ao mesmo tempo estabelece as coordenadas da
evolução futura. As penas e recompensas de após a morte saem do plano
obscuro das superstições e do misticismo dogmático para a luz viva da
análise racional e da pesquisa científica. É evidente que essa pesquisa não
pode seguir o método das ciências de mensuração, pois o seu objectivo não é
material, mas segue rigorosamente as exigências do espírito científico
moderno e contemporâneo. O grave problema da continuidade da vida após a
morte despe-se dos aparatos mitológicos para mostrar-se com a nudez da
verdade à luz da razão esclarecida - (José Herculano Pires, na introdução de
O Céu e o Inferno, edições Lake).
A GÊNESE (1868)
A primeira edição foi publicada em janeiro de 1868. Esta nova obra constitui
um passo à frente, nas consequências e aplicações do Espiritismo. Conforme
indica o seu título, ela tem por objecto o estudo de pontos até hoje
interpretados de modos divergentes: A Gênese, os milagres e as predições, em
suas relações com as novas leis que decorrem da observação dos fenómenos
espíritas.
Dois elementos ou, se o preferem, duas forças regem o universo: o elemento
espiritual e o elemento material; da acção simultânea desses dois princípios
nascem fenómenos especiais que são naturalmente inexplicáveis, se fizermos
abstracção de um dos dois, da mesma forma que a formação da água seria
impossível se fossem abstraídos um de seus dois elementos constitutivos: o
oxigénio e o hidrogénio.
O Espiritismo, demonstrando a existência do mundo espiritual e suas relações
com o mundo material, nos dá a chave de uma multidão de fenómenos
incompreendidos e considerados, por isso mesmo, inadmissíveis por uma certa
classe de pensadores. Esses fatos são abundantes nas Escrituras e é pela
falta de conhecimento das leis que os regem, que os comentadores dos dois
campos opostos, movendo-se sem cessar no mesmo ciclo de ideias, uns fazendo
abstracção dos dados positivos da Ciência, os outros, do princípio
espiritual, não puderam atingir uma solução racional. Esta solução está na
acção recíproca do espírito e da matéria. Ela tira, é verdade, à maior parte
desses fatos, seu carácter sobrenatural; mas, o que será melhor: admiti-los
como derivados das leis da Natureza ou rejeitá-los completamente? Sua
rejeição absoluta arrasta a da própria base do edifício, ao passo que a sua
admissão a tal título, não suprimindo senão os acessórios, deixa a base
intacta. Eis porque o Espiritismo atrai tantas pessoas à crença de verdades
até então consideradas utopias. Esta obra é, portanto, conforme temos dito,
um complemento das aplicações do Espiritismo, segundo um ponto de vista
especial. Seu material estava pronto ou pelo menos elaborado há muito tempo;
mas o momento de publicá-la não tinha chegado ainda. Era necessário, antes
de mais nada, que as ideias constitutivas de sua base tivessem chegado à
maturidade e, de outro lado, atentar para a oportunidade das circunstâncias.
O Espiritismo não tem mistérios nem teorias secretas; tudo nele é revelado
com clareza, para que cada um possa julgá-lo com conhecimento de causa; mas,
cada coisa deve vir a seu tempo para vir com segurança. Uma solução dada
superficialmente, antes da elucidação completa da interrogação, seria uma
causa de retardamento, ao invés de realizar o progresso - (Introdução de A
Gênese, edições Lake).
Bibliografia:
O Livro dos Espíritos (Allan Kardec)
O Livro dos Médiuns (Allan Kardec)
O Evangelho Segundo o Espiritismo (Allan Kardec)
O Céu e o Inferno (Allan Kardec)
A Gênese (Allan Kardec)
Nota: Este estudo é distribuído impresso em apostilas,
pelo Grupo Espírita Bezerra de Menezes,
São José do Rio Preto, SP, Brasil