As curas espirituais
Após o
aparecimento do Espiritismo, o tratamento das doenças espirituais tiveram um
avanço considerável, embora se reconheça que nem todas as doenças possam ser
curadas. A verdade é que a Doutrina posicionou a questão de forma simples e
esclarecedora, oferecendo conhecimentos até então ignorados, o que
possibilitou a qualquer pessoa utilizar-se dos métodos por ela preconizados e
obter resultados positivos.
A maioria absoluta
dos tratamentos espirituais está relacionada com aquilo que nós convencionamos
chamar de "a chave do Espiritismo". O passe, puro e simples, os
tratamentos mais complexos e até mesmo aqueles que passam pelo uso de
instrumentos cirúrgicos, popularizados com Arigó, no Brasil, todos têm como
elementos básicos o pensamento, os fluidos e os espíritos.
Assim como a
medicina moderna reconhece na base das doenças factores de ordem psíquica, o
Espiritismo explica que os males têm relacionamento com o espírito encarnado,
ora apontando para deficiências perispirituais, ora esclarecendo que o indivíduo
só pode obter resultados definitivos quando reconhece em si mesmo a base dos
problemas, contribui com suas acções para a melhoria do seu estado, coloca a
vontade como elemento poderoso e alia a isto os elementos intermediários,
aqueles que servem de ponte entre os espíritos, os fluidos e o doente.
O passe é o método
de tratamento espiritual mais popularizado. Embora não seja uma criação do
Espiritismo, pois seu uso vem de épocas remotas, sendo conhecido por civilizações
antigas - inclusive com o Cristo, que impunha as mãos sobre o doente, para curá-lo
- com a Doutrina ele ganhou um impulso exactamente pelo conhecimento que o
Espiritismo oferece a seu respeito.
Como veremos mais
para frente, sobre a forma de aplicar o passe muita coisa já foi dita e as
discussões não pararam porque existem, de um lado, indivíduos que entendem não
importar o método e sim os resultados, e de outro aqueles que dão importância
à forma e defendem, portanto, uma aplicação dentro da simplicidade, sem
nenhuma encenação que ultrapasse a imposição de mãos.
É de se ver que,
fundamentalmente, os resultados do passe não dependem especificamente da forma
como ele é aplicado e sim daquele que o está aplicando e da participação,
muitas vezes, dos espíritos.
Apesar disso, não
se pode deixar de apreciar o fato da Doutrina atribuir à sua prática o carácter
de simplicidade. A padronização do passe, iniciada na Federação Espírita do
Estado de São Paulo por Edgard Armond, e que tanta celeuma tem causado no
movimento espírita - celeuma até maior do que merece - traz consigo um perigo
muito grande: o de mecanizar os passistas, desviando deles a importância da
concentração e da sua própria participação na aplicação em si.
Mas não é só.
Na verdade, se o passista não possuir uma consciência clara do assunto, ele
poderá se transformar num robô, num autómato, dando a entender para os que não
possuem conhecimento espírita, que a Doutrina está condicionada a determinados
rituais, quando na verdade ela é contra toda e qualquer atitude que possa
embotar a mente.
Quanto aos
resultados em si, ninguém , em sã consciência, poderá afirmar que o passe
padronizado não tem efeito nenhum, porque, se o fizer, será desmentido pelos
resultados obtidos ao longos dos anos pela Federação e pelas centenas de
centros no País e fora dele que adoptam o modelo daquela instituição.
A questão,
portanto, não está na forma mas no conteúdo, embora a "forma não seja
de desprezar", como garantiu Allan Kardec um dia. Aqueles que entendem que
o passe deva ser aplicado de forma simples, entre os quais nos incluímos,
precisam estar atentos exactamente para este aspecto da manutenção dos
postulados doutrinários como eles nos foram legados pelo Codificador. Tudo o
mais que passar disso será exagero. Aqueles que entendem diferente e não
encontram razões maiores para evitar a padronização devem estar conscientes
dessa sua postura e assumi-la claramente, procurando o equilíbrio em suas acções,
para evitar que as discussões criem condições negativas no momento de atender
aos necessitados.
O passe, como
todos sabem, é uma transfusão de energias - ou fluidos - realizado pelo
pensamento do passista e dos espíritos que atuam junto com ele. Kardec afirma
que "a cura se opera pela substituição de uma molécula sã a uma molécula
mal sã". Não importa que o passista seja médium ou não. O fato de não
ser médium não traz nenhum prejuízo, desde que haja por parte daquele que
aplica o passe o desejo de o fazer da melhor forma possível. Com isso, ele
estará criando um relacionamento com os espíritos, o que se dará
fundamentalmente através do pensamento.
Em sendo médium,
o passista ganhará apenas nas facilidades que poderá oferecer para que os espíritos
o utilizem para alcançar os fins desejados. Mas, ainda assim, como médium ele
não está isento do esforço no comportamento, na forma de pensar, nem mesmo da
participação que terá no ato em si, de seus fluidos, a energia carreada para
o necessitado.
Outro detalhe até
aqui muito discutido diz respeito ao conhecimento do passista. Muita discussão
se fez a respeito da necessidade ou não do passista conhecer um pouco de
anatomia humana, isto é, da distribuição dos órgãos e aparelhos do corpo
humano. Entre as alegações a favor e contra a necessidade desse conhecimento,
muitas discussões foram feitas. O fato mais interessante e que parece acabar
com essa polémica é o seguinte: o conhecimento é importante em qualquer área
de actuação humana e o Espiritismo o valoriza de tal modo que chega a exaltá-lo
da seguinte forma: "Espíritas, amai-vos, eis o primeiro mandamento;
instrui-vos, eis o segundo".
Obedecendo a esse
critério, o amor é a primeira condição básica para uma boa actividade na
aplicação do passe. Existindo amor sincero, não há dúvida de que um grande
passo estará sendo dado no sentido de se alcançar bons resultados. Com isso,
pessoas simples, de poucos recursos intelectuais, poderão obter excelentes
resultados em qualquer centro espírita, por mais humilde que este seja.
Porém, se os
indivíduos puderem adquirir conhecimentos outros que possam ser utilizados na
prática, ninguém poderá dizer que isto não trará benefícios. O
conhecimento de anatomia poderá ser de grande utilidade, principalmente para os
passistas que trabalham com seus próprios recursos, sem um contacto mais íntimo
com os espíritos.
O que não será
aceitável é o indivíduo se opor ao conhecimento porque não gosta ou não tem
interesse em adquiri-lo. Neste caso, a questão é outra. Não é o conhecimento
que é dispensável, mas o indivíduo é que não deseja alcançá-lo.
Antes de falar dos
diversos métodos de cura utilizados no Espiritismo, seria bom, caro leitor,
esclarecer alguns pontos do nosso interesse, a fim de que ambos possamos chegar
ao final com alguma concordância e, principalmente, sem nenhuma decepção de
sua parte. O que falarei aqui não constituirá nenhuma novidade, por uma
simples razão: penso que vivemos uma época em que precisamos mais do que nunca
trocar ideias acerca do Espiritismo prático, não daquele Espiritismo apenas
mediúnico, onde se senta em torno de uma mesa para contactos com os espíritos,
nem daquele em que se fica dando voltas em torno da indefectível "reforma
íntima". Absolutamente, quando falo em Espiritismo prático refiro-me ao
entendimento da teoria com tal clareza que ela se incorpora facilmente à nossa
existência e passa a fazer parte do nosso dia-a-dia. Esse tipo de Espiritismo,
que considero o mais importante, é simples e ao mesmo tempo todo complexo.
Simples, porque todos nós podemos alcançá-lo, desde que o desejemos: ele é
óbvio, está à nossa frente, faz parte da vida. Para alcançá-lo é preciso
apenas enxergar o óbvio. Mas ele se torna complexo na medida em que colocamos
dificuldades em nosso pensamento, de tal forma que não conseguiremos enxergá-lo.
De qualquer
maneira, se pretendemos entender esse Espiritismo óbvio e simples, precisamos
perseguir o caminho da praticidade em nossos pensamentos e textos. Essa é a razão
porque nesse estudo nada apresentaremos de novo; apenas reviveremos os conceitos
e conhecimentos que já possuímos, a fim de melhor fortalecer o nosso estudo.
Sempre que você
desejar tratar de um assunto espírita, deverá cuidar para não esquecer de três
itens importantes: o pensamento, a energia e o espírito. Talvez você não
tenha percebido ainda, mas esta é a chave do Espiritismo, capaz de abrir a
porta do entendimento de qualquer assunto. Sem ela, com toda certeza, você
ficará tacteando sem encontrar a maneira certa de compreender por inteiro a
Doutrina.
Não há assunto
doutrinário no qual estes três elementos - pensamento, energia e espírito - não
tenham seu lugar. Em determinados momentos, eles ocupam papel fundamental; em
outros, eles desempenham função secundária, mas em nenhum momento eles podem
ser postos de lado.
Façamos um esforço
mental para verificar se isto é verdade ou não passa de uma suposição.
Tomemos alguns
assuntos definidos como princípios fundamentais da Doutrina Espírita e
verifiquemos se realmente nós vamos precisar daqueles três elementos. Por
exemplo, reencarnação: aqui é indiscutível a presença dos três. Antes de
efectuar o ato reencarnatório, o espírito está envolvido no fluido cósmico:
seu corpo, que o Espiritismo chama de perispírito, é composto de energias
invisíveis aos olhos humanos, mas mesmo assim capazes de possuir uma certa
densidade. Na reencarnação, o espírito é o elemento central, pois é ele
quem reencarna. Como o pensamento é atributo do espírito, fica clara a presença
dos três elementos aí.
Alguém poderá
alegar que a reencarnação tem o seu lado filosófico e que talvez aí não
precisemos contar com os três ou um dos três elementos. Impossível. Mesmo em
se tratando de estudo filosófico, não poderemos dispensar a participação dos
três elementos, uma vez que sendo o espírito um dos elementos fundamentais do
estudo da reencarnação, em qualquer aspecto, logo estarão presentes com ele o
pensamento e a energia. Isso é facilmente explicável: o espírito é o ser
inteligente, imortal, que pensa. Ao pensar, ele está agindo sobre a energia e
dando-lhe um destino e uma qualidade. Espírito, pensamento e energia andam
juntos, invariavelmente.
Desta forma, para
encontrar um tema doutrinário onde aqueles três elementos não estejam
presentes, temos de procurar aqueles onde o espírito não participe. Será que
existem? Vamos ver. De cara, descartamos todos os princípios onde a mediunidade
participe: curas, passes, receituário mediúnico, incorporação, psicografia,
efeitos físicos etc... Isto porque, onde há mediunidade, há espírito.
Pensemos,
portanto, em outros. A Lei de Causa e Efeito. Não serve. Ela é uma lei da
natureza, relacionada intimamente com o espírito. Portanto, deve ser
descartada. A Lei Moral! Ela se reporta directamente ao espírito e às consequências
de suas acções, logo diz respeito ao pensamento e à energia. A vida em outros
mundos? Também não serve, elas se destinam ao espírito, logo... Pensemos em
temas objecto de estudo científico e também nada encontraremos, porque onde
bate a ciência, dá de cara com os fenómenos oriundos da relação dos homens
com os espíritos, o que mata definitivamente qualquer tentativa aí. E quando
houver questão onde os espíritos não ajam directamente, ainda assim haverá a
presença do ser encarnado, o homem, que não deixa de ser um espírito, apenas
que vivendo com um corpo de carne. Portanto, precisa ser descartado.
Tarefa inglória
esta, já se vê. O mais inteligente aqui será deixar de lado esta tentativa de
estudar o Espiritismo sem levar em consideração o pensamento, a energia e o
espírito, e concluir que, realmente, estes três elementos constituem a chave
da compreensão doutrinária, sem a qual as portas não se abrem. É preciso,
portanto, dar-lhe uma atenção especial, a fim de compreender bem a presença e
a participação deles na vida. Quando isto ocorrer, ou seja, quando dominarmos
bem os três elementos, facilmente entenderemos os demais aspectos do
Espiritismo.
Nestes tempos
bicudos, em que no movimento espírita se estabelece uma discussão entre
processos e formas de se conseguir uma cura espiritual, perde-se muito tempo com
questões secundárias e não se volta a atenção para coisas essenciais. Por
exemplo, a acção do pensamento no fenómeno da cura. De nada adianta estarmos
preocupados com o fato do passista ter ou não comido carne, fumado um cigarro
etc..., se ele, apesar de atender a tudo isto, chegar ao centro espírita
carregada de pensamentos negativos, se estiver dispersivo em vista de seus
problemas pessoais, se o rancor e a amargura estiverem ocupando os seus momentos
e coisas do género. Antes de mais nada, o passista é um elemento activo, que
participa efectivamente do processo.
Ele não está ali
apenas como um autómato qualquer, mas como co agente da cura. Então, da mesma
forma que ele deve cuidar da alimentação, da higiene pessoal e tantos outros
detalhes, ele precisa ter consciência de que o seu pensamento vai estar
presente no processo, vai interferir e essa interferência tanto poderá ser
positiva, a favor do ato, quanto negativa, em prejuízo dele.
Em qualquer tipo
de cura, isto ocorre. Kardec dava tanta importância ao ato de pensar que um dia
escreveu no livro "A Gênese": "O pensamento produz uma espécie
de efeito físico que reage sobre o moral: é isso unicamente o que o
Espiritismo poderia fazer compreender".
A concentração
do pensamento pelo passista no ato que está praticando é de fundamental importância
no processo de cura. Sabendo como sabemos que o pensamento cria, através de sua
interferência sobre a energia cósmica universal, fica mais fácil entendermos
porque o passista deve ter a atenção, mais do que tudo, voltada para o ato. O
passista dispersivo mentalmente será sempre um estorvo, alguém que atrapalha
ao invés de ajudar. Ele não conseguirá bons resultados, através dele
dificilmente as pessoas conseguirão um atendimento à altura de suas
necessidades.
É o pensamento
que dá qualidade curativas aos fluidos, que existem em estado natural ao nosso
redor.
É ele que
transforma o fluido inerte em energia capaz de recompor um tecido doente ou
reduzir os males de ordem espiritual que afectam os indivíduos. É o pensamento
também o fio que nos permite estabelecer um relacionamento positivo com os espíritos,
que participam das actividades curadoras. Mas, ao mesmo tempo em que nos permite
tudo isso, ele também poderá nos ligar a espíritos cuja presença será
prejudicial ao ato de curar. Toda moeda tem dois lados, as leis da natureza são
estradas de duas mãos.
Se a acção do
pensamento positivo sobre a energia faz com que ela se transforme em remédio
para diversos males, "os fluidos que emanam de uma fonte impura são como
substâncias médicas alteradas", afirma o Codificador.
A mente é fonte
de energia curativa ou de energia destruidora. É o pensamento dos seres vivos,
espíritos e homens, que produz os bons resultados, assim como os bons
ambientes. E os males também. A rigor, poderíamos dizer que muitas curas se
processam apenas com a participação do pensamento dos encarnados, sem nenhuma
interferência dos espíritos. Isso poderá parecer assustador para alguns, mas
é a pura verdade.
"Certas
pessoas têm verdadeiramente o dom de curar pelo simples toque, sem o emprego
dos passes magnéticos?" - perguntou Kardec aos espíritos. E eles
responderam: "Certamente, disso vocês não têm numerosos exemplos?".
Isso desmistifica
um pouco os ares criados por indivíduos pouco conhecedores da Doutrina, porque
põe abaixo a teoria ingénua de que em tudo os espíritos estão presentes. Na
verdade eles estão presentes em muita coisa, mas daí a dizer que em tudo vai
uma distância muito grande. O que há é falta de conhecimento doutrinário.
Um ambiente bem
formado, onde os indivíduos pensam na mesma faixa, se identificam com os mesmos
propósitos, desejam os mesmos resultados, poderá ser palco de coisas fantásticas,
mesmo sem a participação directa dos espíritos. Se há centros onde nada se
consegue em termos de cura, a causa com certeza estará na falta de preparação
dos responsáveis pelo centro ou em outros factores que possam estar bloqueando
o bom uso dos fluidos. Do contrário, os resultados apareceriam sem nenhuma dúvida.
A força do
pensamento, sua acção sobre a energia e as ligações espirituais que ele
estabelece precisam ser melhor e mais frequentemente estudadas por aqueles que
nos centros espíritas têm a responsabilidade de atender e consolar aos que
batem à porta.
Além do passe,
que é o mais conhecido, a cura pode ser obtida pelos seguintes meios: pela
prece, pelo receituário mediúnico, em reuniões de desobsessão, através de
operações sem instrumental cirúrgico, por meio de operações com uso de
instrumental cirúrgico, pelo tratamento a distância e - acrescentemos - por
outros meios espirituais desconhecidos ainda.
É bom ter em
mente que, apesar de seu avanço, o Espiritismo não é uma doutrina completa, a
ponto de informar sobre tudo, inclusive sobre todos os meios através dos quais
as curas se processam.
Basta dizer que às
vezes somos surpreendidos por acontecimentos que fogem completamente aos
conhecimentos que possuímos, doutrinariamente. Outras vezes, a forma, o local
etc..., onde as curas acontecem se constituem numa mostra importante de que
precisamos agir com cautela sempre que desejarmos classificar a cura.
A prece é um dos
meios pelos quais a cura de um mal pode ser alcançada. Mas é, também, um meio
dos mais difíceis, haja vista a pequena capacidade que grande parte dos seres
humanos tem para orar. Isto porque a oração não é um ato mecânico, que se
realiza pelos lábios.
Não. A prece é
algo que depende enormemente do pensamento e da vontade. Sem esses dois
requisitos, a prece se transforma em algo sem maior expressão. Quando os homens
aprendem verdadeiramente a orar, sem dúvida que conseguem sucesso em muitas
coisas, inclusive na solução de seus problemas de saúde.
A confirmação de
que se pode obter cura através da prece pode advir do conhecimento (que vimos
atrás) da acção do pensamento sobre os fluidos, que nos esclarece como a
coisa acontece. Mas pode advir também da informação do "Livro dos Espíritos":
- "Podemos obter curas só pela prece?" indaga Kardec, ao que os espíritos
respondem: "Sim, às vezes Deus nos permite; mas talvez o bem do doente
seja o de sofrer ainda e então vocês pensam que a prece não foi ouvida".
Esta resposta
enseja, além da confirmação do poder da prece na cura, uma reflexão sobre o
fato de nem todo doente poder ser curado. Isto está explícito na resposta dos
espíritos, que afirmam ser a doença, muitas vezes, "o bem do
doente". Todos sabemos que isto acontece em vários níveis, ou seja,
sempre que o doente é possuidor de compromissos denominados cármicos, que
devem se prolongar para além do momento em que está recebendo o tratamento, a
cura deixa de acontecer. Um indivíduo de grande força de vontade e orando com
sinceridade, pode ainda assim não alcançar o que deseja se isto for o melhor
para ele.
Aliás, André
Luiz nos mostra um exemplo que ilustra bem esse fato: havendo desencarnado, a mãe
de um jovem prossegue no mundo espiritual sofrendo com a doença do seu filho
encarnado, preso ao leito. De tanto implorar aos espíritos mais esclarecidos o
alívio das dores do seu filho, ela recebe a informação de que será atendida.
Tão logo os espíritos realizam a cura, o jovem retoma uma vida perdulária,
acabando por voltar ao vício do alcoolismo, que havia motivado a sua doença.
Com isto, também retorna a doença e o jovem volta ao leito. A mãe, embora com
muito sofrimento, acaba por compreender que a dor é "o bem do
doente".
Como a questão da
cura total é extremamente complexa, uma vez que os resultados variam de caso
para caso, é bom estar prevenido. Pode o indivíduo não estar em condições
de obter a cura total, seja porque o seu estado físico está comprometido
irremediavelmente, seja porque o seu processo cármico o recomenda. Mas entre a
cura total e a cura parcial muita coisa pode ocorrer, ou seja, há pessoas que,
após determinado tratamento, alcançam resultados parciais, que diminuem em
parte o seu sofrimento, sem extingui-lo definitivamente. Quando isto acontece,
de duas uma: ou a pessoa compreende e assume sua situação, ou ela não aceita
o pequeno resultado, e continua descrente de tudo.
Isto pode ocorrer
com dirigentes mal preparados. Estes poderão entrar em um processo de descrença
ante a doutrina pelo simples fato de não conseguir resultados positivos para
todos aqueles que os procuram. A maneira de enfrentar essa situação, que será
inevitável nas casas espíritas dedicadas à prática da cura espiritual, é
fortalecer o conhecimento, a fim de compreender que na maioria das vezes a cura
total ou parcial não depende exclusivamente dele, mas de um conjunto de
factores nos quais entram o pensamento, os fluidos, os intermediários, os espíritos
e o próprio paciente.
Retornemos à
prece. Apesar do estágio em que nos encontramos actualmente, somos ainda muito
deficientes na hora de realizarmos uma oração. Esta deficiência é que nos
impede de obter bons resultados em nossos propósitos. A prece deveria se
constituir em matéria de constante estudo nos centros espíritas, mas estudo
verdadeiro e não se tornar objecto de considerações puramente místicas, que
impedem alcançar a sua essência. O Cristo mostrou bem o seu poder. Resta-nos
entendê-la em profundidade, a fim de aprendermos a utilizar essa ferramenta
poderosa, pela qual muitos resultados positivos poderemos alcançar.
A prece, não
tenho dúvida, pode ser objecto de estudo teórico e prático, repetidamente, em
nossos centros espíritas, principalmente porque temos a presença permanente de
um público rotativo, ou seja, pessoas que não se fixam, são apenas
passageiros do momento.
A mediunidade
receitista foi tratada por Kardec de maneira objectiva. Diz ele em "O Livro
dos Médiuns" que a especialidade dos médiuns receitistas "é a de
servir mais facilmente de intérpretes aos espíritos para prescrições médicas.
Não devemos confundi-los com os médiuns curadores, porque eles não fazem
absolutamente mais do que transmitir o pensamento do espírito e não têm, por
si próprios, nenhuma influência".
Com a popularização
do Espiritismo, este tipo de mediunidade foi tomada de muitas preocupações,
criando-se em torno dos médiuns receitistas uma aura de medo. Espalhou-se a
preocupação de que as receitas espirituais pudessem, pelo menos no Brasil,
contrariar as leis e trazer para a Doutrina alguns prejuízos. Surgiu então a
orientação de que as receitas dadas por médiuns deveriam passar pelo crivo
dos médicos, passando estes a responsabilizarem-se por elas.
Se em algum
momento esta preocupação teve sua razão de ser - principalmente porque houve
épocas em que o Espiritismo foi perseguido intensamente e qualquer coisa que
pudesse servir de pretexto aos adversários acabaria por dificultar a sua difusão
- a verdade é que a presença do médico ao lado do médium receitista passou a
ser encarada em muitos centros espíritas como uma necessidade inadiável, a
ponto de inibir o trabalho mediúnico.
Ainda hoje, certas
instituições de peso no movimento espírita divulgam a necessidade da presença
desse médico de plantão e se não fosse o bom senso de muitos deles, nós não
veríamos chegar às mãos dos pacientes as receitas. Simplesmente porque muitas
delas, como um dia avisou Herculano Pires, contrariam as orientações dos médicos
encarnados. Isso sem falar dos centros espíritas que, tomados de verdadeiro pânico,
deixaram de abrigar em seu recinto o médium receitista, chegando alguns a
proibir a sua presença. Era preciso não contrariar as orientações vindas de
cima.
O que serviu para
um certo momento já não tem mais valor hoje. Ao invés de divulgar esse tipo
de orientação absurda, precisamos na verdade é valorizar o trabalho dos médiuns
receitistas, dando-lhes apoio, sem perder de vista, é claro, o controle que
todo e qualquer tipo de mediunidade deve ter, para não se transformar em arma
contra a Doutrina e os homens.
Já está mais do
que na hora de incrementar uma campanha para que as leis do país sejam
protectoras da medicina alternativa e não inibidoras de sua acção. Não
precisamos temer as leis, mas modificá-las e torná-las modernas. O medo da
punição foi o que levou Pedro a negar o Cristo três vezes. Este mesmo medo é
que faz alguns espíritas preferirem prejudicar a Doutrina a lutar contra tudo
aquilo que ainda dificulta ou entrava a sua prática.
A mediunidade
receitista é, no processo de cura, muito importante e às vezes complementar do
tratamento espiritual. Os espíritos que atuam neste sector, normalmente ex médicos
encarnados, se utilizam de conhecimentos adquiridos em vidas passadas e
aprimorados na Espiritualidade. Suas receitas chocam muitas vezes os
profissionais da medicina, uma vez que a combinação de remédios nem sempre
segue o comportamento tradicional. Há espíritos que combinam diversos tipos de
remédios, misturando alopatia e homeopatia, enquanto outros seguem uma dessas
linhas apenas.
Alguns médicos
espirituais se utilizam unicamente de ervas em suas receitas, enquanto que
outros, demonstrando perfeito acompanhamento da evolução da ciência humana,
costumam receitar remédios que acabaram de ser postos à venda ou -
surpreendentemente - estão ainda em fase de experimentação pelos
pesquisadores.
Os resultados do
receituário mediúnico via de regra seguem o mesmo padrão dos demais tipos de
tratamento espiritual, ou seja, a cura total, parcial ou nenhum resultado
efectivo ficam na dependência do encarnado e dos seus compromissos cármicos.
Como os médiuns receitistas, segundo Kardec, não exercem nenhuma influência
no receituário, é de se crer que a acção de seu pensamento não tenha influência
no resultado da cura, ao contrário do passe onde a influência é quase total.
De qualquer maneira, os médiuns estão sempre submetidos aos interesses dos espíritos,
isto é, são os espíritos que determinam o que receitar.
Curiosamente, há
médiuns que aparentemente se especializam em determinado tipo de medicina.
Alguns só receitam homeopatia, outros apenas alopatia e assim por diante, mesmo
que os espíritos que por eles receitam não sejam os mesmos. Isso, de certa
forma, facilita o trabalho do médium, que pode assim melhorar o seu próprio
conhecimento acerca do assunto, facilitando ainda mais a acção dos espíritos.
De qualquer maneira, essa especialização parece ter por causa muito mais a
determinação dos espíritos quanto ao tipo de receituário do que propriamente
o interesse do médium.
A cura através do
que se convencionou chamar operações espirituais parece ser recente,
especialmente aquelas em que os médiuns utilizam instrumental cirúrgico. Não
há registros de fatos dessa natureza do século passado. Allan Kardec não as
menciona, embora, na "Revista Espírita" ele se refira à mediunidade
nos médicos, chegando inclusive a apontá-la como de grande interesse para o
futuro.
As operações
espirituais, que se popularizaram entre nós com o aparecimento do "médium
da faca enferrujada" - José Arigó - forma objecto de muita discussão no
movimento espírita, havendo aqueles que não as aceitam e outros que chegam até
a combatê-las. Ao tempo de Arigó, as discussões se tornaram intensas, a ponto
daquela mediunidade escandalizar conhecidos trabalhadores do movimento espírita,
que temeram pelo futuro. Após sua morte, o clima serenou, voltando a ficar
tenso com o aparecimento do agora médico Edson Queiroz*.
Eis aí uma
mediunidade que poderíamos chamar de "risco", uma vez que exige muita
determinação por parte do médium e coragem do paciente em se submeter à
cirurgia. O "risco" é menor quando a operação é realizada sem
instrumentos cirúrgicos, como acontece com determinados médiuns, que se
utilizam apenas das mãos. Mas quando os espíritos solicitam o bisturi a coisa
muda de figura e deixa muita gente aparvalhada, já que a maioria absoluta das
cirurgias neste caso é feita em condições precárias sob o ponto de vista médico,
normalmente sem o uso de anestesia e assepsia, com a agravante do espírito
operador fazer uso de recursos como sujar propositadamente o local da incisão,
chegando até a mandar cuspir na operação.
É aí talvez que
o escândalo aumenta. Muitos médicos e alguns deles bons espíritas não
conseguem ver sentido nesse ato, acabando por se opor a esse tipo de tratamento.
Com Arigó o escândalo chegou até ao receituário mediúnico que ele às vezes
fornecia aos pacientes, contendo todas as evidências de uma verdadeira contradição.
No entanto, até o presente momento, não há registro de pacientes que tenham
se utilizado daquelas receitas e agravado a situação.
Pelo contrário,
centenas de casos estudados demonstraram, quando pouco, uma acentuada melhoria
do estado geral do paciente.
A mediunidade, de
modo geral, traz em si mesma o perigo da má aplicação. A cura através das
operações espirituais se presta muito ao charlatanismo e ao enriquecimento ilícito.
Mas esse tipo de coisa existe na sociedade como um todo, de modo que não
podemos condenar o processo apenas por existirem pessoas de comportamento condenável.
Isto é uma outra questão.
Tivemos a
felicidade de acompanhar de perto os dois tipos de mediunidade de cura; através
do uso de instrumental e sem o uso dele. Conhecemos alguns médiuns que se
utilizam apenas das mãos para realizar a intervenção e cujos resultados
demonstraram um grande número de acertos. O curioso de um destes médiuns é
que, após a cirurgia, que se dava sem nenhum tipo de corte, o local da incisão
era protegido por gases e esparadrapos como se o corte tivesse sido feito.
Exames posteriores, através do raio X, apontavam no local da incisão um corte
interno, próprio de uma cirurgia. O paciente, após o ato operatório, era
aconselhado a seguir um procedimento típico de uma cirurgia pelos processos
conhecidos.
Em casos dessa
natureza, em que o paciente não apresenta nenhum sinal exterior, a intervenção
dos espíritos é a única maneira de explicar a cirurgia. De qualquer modo, a
participação do médium aparece como importante, caso contrário a cirurgia
teria sido feita de maneira diferente. Se concluirmos que o médium tem uma
participação importante em casos como este, deveremos concluir que também o
seu comportamento mental tem implicações positivas no caso - talvez possamos
dizer mais, que os fluidos manipulados pelos espíritos operadores contem com a
participação do médium. É importante estudar o caso, porque quase nunca nos
lembramos da participação do intermediário, que é o médium.
As cirurgias
feitas através de instrumental cirúrgico ficaram populares entre nós, após
Arigó, e mais recentemente por Edson Queiroz. Em nosso livreto "Médicos médiuns"
tivemos ocasião de analisar o fato. Edson seria a repetição em género e grau
de Arigó, não fossem duas únicas questões: Edson é médico e vem de berço
espírita. Ademais, no presente instante estamos como que impossibilitados de
analisar o seu como sendo um caso da actualidade espírita, uma vez que ele se
enquadra em pelo menos duas classificações dadas por Kardec em "O Livro
dos Médiuns": "Médiuns mercenários - os que exploram a sua
faculdade". "Médiuns ambiciosos - os que, sem porem preços em sua
faculdade, esperam tirar alguma vantagem dela". Porém, ao tempo em que ele
merecia do movimento espírita o apoio e a atenção, sua faculdade foi
comprovadamente verdadeira. Acompanhamo-lo em diversas actividades, tanto em São
Paulo, como em Recife, em Montevidéu e Salvador, enfim, um sem número de vezes
em que nos foi possível observar o fenómeno sob vários aspectos: o do uso de
bisturi e demais instrumentos, o uso constante de agulhas, a ausência completa
de anestesia e assepsia, os variados tipos de operações, que iam desde a
retirada de um simples pterígio até uma incisão mais profunda no seio, para a
retirada de um caroço qualquer.
Os inúmeros casos
acompanhados por Nazareno Tourinho, no primeiro e melhor livro que se escreveu
sobre Edson, constantes ainda da primeira fase de sua mediunidade, onde nenhuma
denúncia de pagamento monetário havia sido feita, mostra a magnitude do fenómeno
e sua utilidade. Estamos convictos de que a principal finalidade da mediunidade
de cirurgia é mesmo a de chocar as criaturas humanas, o que esta mediunidade
faz muito bem ao não utilizar de modo visível a anestesia e assepsia - fato
este que jamais resultou em danos para os pacientes - além da maneira como os
Espíritos operadores agem, com palavras e atitudes que realmente escandalizam
as pessoas mais sensíveis.
Enquanto vai
chocando as pessoas, vai também realizando uma acção curativa para muita
gente, que se vê assim beneficiada pelos médiuns operadores.
Este processo de
cura, embora bastante conhecido mas ainda pouco explorado, consiste em reunir,
em data, horário e local previamente estabelecidos, de maneira disciplinada e
permanente, um certo número de pessoas de boa vontade, para, em recolhimento e
prece, destinarem energias (fluidos) para as pessoas necessitadas. Em vista do
que falamos no início sobre o poder do pensamento e sua acção sobre os
fluidos, ficam claros para nós as possibilidade deste tipo de reunião.
É evidente que ao
dirigirmos nosso pensamento de modo colectivo em direcção a pessoas
necessitadas, as energias que emanamos tenderão a alcançar o seu objectivo, não
só estabelecendo resultados positivos sobre problemas físicos e espirituais,
como também sobre questões de ordem moral. Em nosso livro "Você e os espíritos
(ainda por editar), tratamos desta questão e apresentamos diversos exemplos da
actuação do pensamento.
Quando o grupo
dispõe de médiuns de comprovada capacidade de doação fluídica, os
resultados podem ser ainda mais promissores. Actualmente, há uma tendência em
certos meios espíritas, de utilizar as energias de médiuns bem dotados,
carreando-as para fins terapêuticos, ao invés de fenómenos de materialização.
A observação tem demonstrado que em muitos núcleos os resultados são às
vezes surpreendentes nestes casos.
O Espiritismo
encara a obsessão em seus variados graus como uma doença cujo portador deve
ser tratado convenientemente. A acção de um espírito sobre um encarnado,
levando-o a cometer actos tidos como anormais por nossa sociedade, é que tem não
poucas vezes enchido os nossos institutos psiquiátricos. Daí, pois, a importância
de uma doutrina como a espírita, capaz de dar à doença e ao doente uma visão
nova e diferente, com condições de ir ao fundo da questão e obter resultados
realmente satisfatórios. E mais, uma doutrina que é capaz de avançar no diagnóstico
e indicar quando a doença é causada por espíritos e quando ela, na verdade,
foi criada pela própria mente da criatura enferma, oferecendo, a partir daí, o
remédio capaz de levar à cura - quando menos, de aliviar os sofrimentos.
Como a Desobsessão
será desdobrada neste encontro em uma reunião específica, deixo de abordá-la
aqui, remetendo o leitor para o capítulo que trata deste tipo de cura oferecida
pela Doutrina Espírita.
Este nosso breve
estudo procurou demonstrar, de modo rápido, que a actividade de cura, no centro
espírita, se constitui em importante trabalho, que não deve ser relegado a
segundo plano nem ser tratado sob o estigma dos preconceitos. O Espiritismo é
das poucas doutrinas que têm condições de desenvolver métodos e actividades
de tratamento que alcançam resultados verdadeiramente importantes. Seja se
utilizando da presença de médiuns, seja educando pessoas de boa vontade, seja,
enfim, desenvolvendo em cada ser humano que participa de actividades espíritas
a consciência de que cada um de nós é verdadeiramente um "deus" e
pode agir como activo participante da obra divina.
A maior
necessidade dos espíritas atuais talvez seja conhecer, compreender e saber
utilizar a Doutrina Espírita na prática. Neste sentido é que os centros espíritas
deveriam dirigir suas atenções. O mundo de coisas a serem feitas pelos espíritas
é grandioso, mas, com toda a certeza, estamos fazendo apenas uma pequenina
parte do que nos cabe por desconhecermos as nossas próprias potencialidades. É
preciso descobri-las.
* O médium Edson
Queiroz veio a desencarnar no dia 5 de outubro de 1991, assassinado.
Wilson
Garcia
Fonte: Portal do Espirito