Nascido a 19 de Abril de 1862, na Ilha
Terceira, Arquipélago dos Açores, Freguesia da Sé de Angra do Heroísmo
(Portugal), e desencarnado no Rio de Janeiro a 18 de Fevereiro de 1943.
Em plena juventude, emigrou para o Brasil, sem alimentar
ideia de enriquecimento, mas buscando um ideal que sua intuição afirmava
poder encontrar em sua segunda pátria.
Sem qualquer protecção ou amparo, desembarcou no Rio de
Janeiro, sozinho e com irrisória quantia no bolso. Entretanto, já era um
jovem de carácter sério e de grandes dotes morais.
Inácio Bittencourt foi um desses abnegados, que só se
alegravam com a alegria do seu semelhante. Por isso foi aquinhoado com a
mediunidade natural, que geralmente depende da evolução espiritual do
indivíduo. Ela surgiu espontaneamente, sem qualquer esforço de planeamento,
como um imperativo da essência de sua alma boa e sempre disposta à prática
do bem.
Aos vinte anos de idade inteirou-se da verdade espírita.
Bastante enfermo e desesperançado, foi levado à presença de um médium
chamado Cordeiro, residente na Rua da Misericórdia, no Rio de Janeiro, e,
graças ao auxílio espiritual recebido, teve a sua saúde completamente
restabelecida. Inconformado com a rapidez da cura, voltou e indagou do
médium: "Não sendo o senhor médico, não indagando quais eram os meus
padecimentos e não me tendo auscultado ou apalpado qualquer um dos órgãos,
como pôde curar-me?"
E a resposta veio incontinenti: "Leia "O Evangelho Segundo o
Espiritismo" e "O Livro dos Espíritos". Medite bastante e neles encontrará a
resposta para a sua indagação".
Bittencourt seguiu o conselho e, desde logo, com grande
surpresa e naturalidade, se apresentaram nele algumas faculdades mediúnicas.
Descortinando novos horizontes, rompido o véu que impedia que conhecesse
novas verdades, integrou-se resolutamente na tarefa de divulgação evangélica
e de assistência espiritual aos mais necessitados.
Bem cedo, com trinta anos de idade, sua personalidade
alcançou grande destaque nos meios espíritas e mesmo fora deles. Poderia ter
alcançado culminância na política, desde que aceitasse a indicação de seu
nome para uma chapa de deputado, uma vez que era apoiado por vários
senadores da República. Sua vitória na eleição não sofreria dúvida. Porém,
sempre humilde, fugindo aos movimentos alheios à caridade, preferiu viver no
seu mundo, no qual reinava a figura exponencial e amorosa de Jesus Cristo.
Fundou a 1.o. de Maio de 1912, e dirigiu-o durante mais de
trinta anos, o semanário "Aurora", que se tornou conhecido e apreciado
veículo de divulgação doutrinária. Sob sua presidência foi fundado cm 1919 o
"Abrigo Tereza de Jesus", tradicional obra assistencial até hoje em pleno
funcionamento, com larga soma de benefícios a crianças desamparadas, de
ambos os sexos.
Fundou o Centro Caritas, juntamente com Samuel Caldas e Viana
dc Carvalho, presidindo-o até a data da sua desencarnação. Tomou parte
activa na fundação da "União Espírita Suburbana" e do "Asilo Legião do Bem",
que acolhe vovozinhas desamparadas. Durante alguns anos exerceu também a
Vice Presidência da Federação Espírita Brasileira, presidiu o "Centro
Humildade e Fé", onde nasceu a "Tribuna Espírita", por ele dirigida durante
alguns anos.
A mediunidade receitista e curadora de Inácio Bittencourt
mereceu diversas opiniões. Algumas vezes chegou a ser processado "por
exercício ilegal da medicina", mas sempre foi absolvido. Em 1923 houve um
acórdão importante do Supremo Tribunal Federal, a respeito.
Certa vez, no Centro Cáritas, ao ensejo de uma prece,
ouviram-se na sala, de forma bastante nítida, acordes de um violino. O
artista invisível executava estranha e belíssima melodia, envolvendo a todos
em profunda emoção.
Bittencourt, então, salientou que aquela audição representava
magnânima manifestação da graça de Jesus Cristo, permitindo que chegasse ao
grupo o de que mais ele necessitava, para compreender a ressonância de uma
prece sincera no plano divino.
Manifestações dessa natureza não eram raras no Centro Cáritas,
possibilitando sempre vibrações amorosas dos encarnados, protegidas pelos
Mentores Espirituais, de maneira que essas forças ali chegavam para as
sensibilizantes demonstrações de afecto e carinho.
Não foi somente como médium receitista e curador que Inácio
Bittencourt granjeou a notoriedade, a estima e a admiração de todos, mas
igualmente como médium apto a receber do Alto maravilhosa inspiração que,
durante larga fase do seu mediunato, se manifestou notória e admirável,
sempre que ele assomava às tribunas doutrinárias, principalmente à da
Federação Espírita Brasileira, a cujas sessões de estudos comparecia com
bastante assiduidade.
Embora não fosse dotado de cultura académica, escrevia
artigos doutrinários de forma surpreendente, e fazia uso da palavra em
auditórios espíritas de forma bastante eloquente. O simples fato de dirigir
um jornal de grande penetração como o foi "Aurora", demonstra a fibra e o
valor desse seareiro incomparável e incansável.
Com 80 anos de idade, retornou à patria espiritual, após
lenta agonia. Dias antes da sua desencarnação, com a coragem e a serenidade
de um justo, ditara para os seus familiares os termos do convite para os
seus funerais: "A família Inácio Bittencourt comunica o seu falecimento. A
pedido do morto, dispensam-se flores". Dona Rosa, sua bondosa companheira,
ponderou: "Você amontoou flores na vida terrena, e essas flores virão agora
engalanar a sua vida espiritual". O velho seareiro, dando, mais uma vez,
prova admirável da capacidade de transigência do seu Espírito altamente
evoluído, aquiesceu: "Está bem. Concordo com você e aceito as flores. Elas
significarão a simpatia e o afecto de bondosos amigos para com o meu
Espírito. Mas desejo que se transformem na derradeira homenagem que presto a
você, nesta encarnação, ofertando-lhas logo após recebê-las. Nosso filho
Israel se encarregará de proceder à oferenda".
Inácio Bittencourt foi um exemplo vivo de virtudes
santificantes. A todos os golpes de malquerença e a todos os gestos de
ofensa, sempre replicava com sorriso e perdão. Soube sempre ser tolerante e
compreensivo para com aqueles que o criticavam. Levou sempre a assistência
material e espiritual a todos aqueles que dela necessitavam, fazendo com que
sua acção fecunda e benfazeja se baseasse sempre nos lídimos preceitos
evangélicos, pois, como poucos, ele soube viver e praticar os ensinamentos
do Meigo Rabi da Galiléia.
Falando com clareza e simplicidade, esforçou-se sempre em
desvendar, para os seus semelhantes, o véu que oculta as verdades eternas
que os homens chamam de mistérios divinos. Caminhou sempre sem protestos ou
lamentações. Que a vida bem vivida desse grande propagador do Espiritismo
possa nos servir de bússola a fim de nos orientar nos momentos de vacilações
e de tribulações.
As curas operadas através da mediunidade de Inácio
Bittencourt foram das mais marcantes. Inúmeros casos, que eram considerados
perdidos pela medicina oficial, foram resolvidos pela sua interferência,
tornando- se assim um ponto de convergência para os sofredores de todos os
matizes.